Valor econômico, v. 18, n. 4477, 06/04/2018. Brasil, p. A2.

 

Febre amarela mata 328 pessoas desde julho de 2017

Ligia Guimarães

06/04/2018

 

 

De julho do ano passado até o dia 3 de abril, 328 pessoas morreram por febre amarela no Brasil. Comparado ao mesmo período entre 2016 e 2017, o número representa um crescimento de 49% em relação às mortes causadas pela doença, de acordo com dados divulgados pelo Ministério da Saúde. Aumentou também a quantidade de casos confirmados: foram 1.127 no período, ante 691 casos no mesmo período de 2016/2017.

O período analisado considera a sazonalidade da doença, cuja incidência é maior no verão. Por isso, o ministério organiza os informes sobre febre amarela comparando os períodos com início em 1º de julho e encerrados em 30 de junho do ano seguinte.

Outra medida que mostra piora nos indicadores em relação ao período passado é a abrangência da circulação da doença: o vírus da febre amarela hoje circula em regiões metropolitanas, atingindo 35,9 milhões de pessoas; na "temporada" da doença no ano passado, o surto atingiu uma população de 10 milhões de pessoas.

Para o pesquisador Expedito Luna, do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP), os dados indicam que não é correto afirmar que a doença continua restrita à zona rural, já que, embora sejam casos de febre amarela silvestre, aparecem também nas periferias das grandes metrópoles, próximas a regiões de mata ou litoral.

"Esses dados [sobre a abrangência da doença] são incoerentes com a colocação do ministério de que continua a ser um problema das zonas rurais", afirmou o pesquisador. "Continua a ser a febre silvestre, mas que ocorre também na periferia das grandes cidades."

No Brasil, todos os casos de febre amarela registrados desde 1942 são silvestres, inclusive os atuais. O que significa que a doença foi transmitida por vetores que existem em ambientes de mata (mosquitos haemagogus e sabethes). Além disso, o que caracteriza a transmissão silvestre é que os mosquitos que transmitem o vírus também se infectam a partir de um hospedeiro silvestre, o macaco.

Em Minas Gerais, Estado mais afetado pela febre amarela, 150 pessoas já morreram em razão da doença entre julho do ano passado e 3 de abril, nos cálculos do governo estadual. Informe epidemiológico divulgado pela Secretaria de Saúde aponta que, desde julho de 2017, quando o Estado começou o segundo período de monitoramento da doença, foram registrados 446 casos de febre amarela; desses, 50 pacientes morreram e outros 567 casos continuam em investigação.

De acordo com a secretaria, a cobertura vacinal acumulada de febre amarela em Minas Gerais atualmente está em torno de 91,91%. A estimativa é que 1,6 milhão de pessoas ainda não tenham sido vacinadas, especialmente na faixa etária entre 15 e 59 anos de idade.

Luna, pesquisador da USP, diz que chama a atenção a aparente desaceleração da corrida em busca da vacina. No início do ano, a procura pela vacina gerou muitas filas em postos de saúde. "No começo de janeiro e em fevereiro, as pessoas estavam invadindo as unidades de saúde para se vacinarem. E agora que a vacina está disponível, sem restrição, a procura caiu", diz.

O pesquisador atribui o desinteresse, entre outros fatores, à divulgação de notícias falsas que se espalharam pelas redes sociais a respeito dos supostos efeitos adversos da vacina ou da baixa eficácia da vacina fracionada, boatos desmentidos pelo epidemiologista, que foi diretor do Departamento de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde entre 2003 e 2007. "Já foi mais que provado que a vacina é segura", afirma.

De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), o fracionamento de doses da vacina contra a febre amarela é recomendado em casos de emergência, como foi o caso do Brasil em 2017 e 2018. Não deve ser adotada por países como estratégia de imunização no longo prazo.

De acordo com as entidades, uma dose completa de vacina contra febre amarela protege uma pessoa para toda a vida; a mesma dose fracionada serve para proteger até cinco pessoas por um período determinado.

No boletim epidemiológico desta semana, o Ministério da Saúde destaca que as mortes e casos registrados de febre amarela caíram, ao menos, em relação ao boletim divulgado anteriormente pela pasta, no dia 19 de abril. Na ocasião, eram 1.131 casos confirmados, e 338 óbitos.

De acordo com a pasta, a redução se deve à reclassificação dos casos que são, semanalmente, incorporados à base de dados, conforme complementação dos dados pelas secretarias estaduais de Saúde. "Pode ser resposta à vacinação ou pode ser que estamos nos aproximando do fim da sazonalidade", diz o professor.

De acordo com o Ministério da Saúde, todo o território brasileiro se tornará área de recomendação para vacina contra a febre amarela, que tem vacinação permanente, independentemente do calendário de campanhas. A medida será feita de forma gradual, começando neste ano e concluída até abril de 2019, de acordo com a pasta.

Para Luna, o baixo interesse pelas vacinas também reflete a falta de investimento do Ministério da Saúde na divulgação das campanhas de vacinação. "Não há uma publicidade, um espaço comprado pelo ministério nos meios de comunicação informando sobre o local das vacinas. Isso tem sido feito só pelos meios de comunicação, que seguem a pauta do jornalismo", diz. "Esperar que a população responda sem haver estímulo é problemático".