Correio braziliense, n. 20111, 14/06/2018. Política, p. 2

 

4 a 2 a favor da condução coercitiva (e contando)

Deborah Fortuna

14/06/2018

 

 

JUSTIÇA » Ministros do STF retomam hoje o julgamento sobre a legalidade de levar suspeitos para depor a investigadores. Na Lava-Jato, recurso chegou a ser utilizado mais de 200 vezes. Ainda faltam os votos de cinco integrantes do Supremo

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir hoje sobre a legalidade das conduções coercitivas contra investigados. O julgamento começou há duas semanas, mas, ontem, a decisão avançou no sentido de que a medida continue sendo aplicada. Durante o julgamento, quatro ministros votaram pela constitucionalidade da prática, e dois votaram pela proibição. Ainda faltam cinco magistrados.

O resultado de hoje pode interferir diretamente na Operação Lava-Jato e em outras investigações. Apesar desse recurso ser utilizado há quase 30 anos, as controvérsias sobre o tema só começaram durante as ações no âmbito da Lava-Jato, que atingiu integrantes da cúpula do poder Executivo e Legislativo. Apenas nessa operação, a condução foi utilizada mais de 200 vezes. Desde então, a medida já atingiu casos emblemáticos, por exemplo, o então presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Jorge Picciani (MDB), e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi conduzido a depor em março de 2016.

O debate chegou ao Supremo por duas Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs), propostas pelo PT e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O partido afirma que o “preceito fundamental violado é a liberdade individual, assegurada aos indivíduos para que não sejam compelidos, de qualquer forma e por qualquer meio, a produzirem provas contra si mesmo em processos criminais”. O pedido foi feito em abril de 2016.

No ano passado, o relator do caso no Supremo, ministro Gilmar Mendes, proibiu provisoriamente a condução coercitiva. Após essa decisão, foi verificada que as prisões temporárias cumpridas pela Polícia Federal cresceram. Na época, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu da decisão e pediu o restabelecimento das coercitivas. Agora, cabe ao plenário da Corte decidir se a medida continua suspensa ou não.

Julgamento

Para se formar maioria na Corte, é necessário que pelo menos seis ministros concordem com a decisão. Na semana passada, o ministro-relator Gilmar Mendes já tinha votado contra a condução coercitiva, por entender que ela viola os direitos do investigado. Ontem, o julgamento foi retomado com o voto do ministro Alexandre de Moraes, que abriu uma divergência parcial. Ele votou para manter a condução, mas com ressalvas. Segundo Moraes, a medida “representa expressiva privação da liberdade de ir e vir”, e só pode ser adotada se o investigado não atender a intimação prévia para o interrogatório. “Os órgãos estatais não podem ser impedidos de exercer o seu ato previsto na legislação. Entre eles, a determinação compulsória perante autoridade competente para realização de interrogatório. Mas, desde que o investigado não tenha atendido à intimação, injustificadamente”, opinou.

Em seguida, o ministro Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no STF, abriu total divergência de Gilmar Mendes e abriu um terceiro entendimento dentro da Suprema Corte. Segundo o magistrado, a condução pode ser decretada caso o investigado não atenda à intimação, ou em substituição a medidas mais graves, por exemplo, a prisão preventiva ou temporária. Durante o voto, Fachin falou sobre as desigualdades entre o tratamento daqueles que têm dinheiro e poder em comparação àqueles que não têm.

A condução coercitiva está prevista no artigo 260 do Código de Processo Penal. O texto explica que a medida deve ser tomada “se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à presença”.

Durante o julgamento, a ministra Rosa Weber acompanhou o relator Gilmar Mendes. Do outro lado, Fachin foi acompanhado por Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. “A condução coercitiva é constitucional com força nas medidas cautelares que são autorizadas pelo magistrado, assegurada a presença do advogado, assegurado o direito ao silêncio, assegurada a integridade física do investigado e, evidentemente, que qualquer abuso, qualquer erro, deve ser coibido”, afirmou Fux.

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Sob ordens de Marisa

14/06/2018

 

 

Ex-segurança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Itamar de Oliveira afirmou que cumpria ordens da ex-primeira-dama Marisa Letícia em “serviços” relacionados ao sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP). Ele foi ouvido ontem como testemunha de defesa do ex-assessor de Lula, Rogério Aurélio Pimentel. Marisa Letícia morreu em fevereiro de 2017, vítima de um AVC.

Itamar diz ter trabalhado durante seis anos, desde 2005, inicialmente como segurança e, depois, como assistente de ordem. Ele alega ter ido “três ou quatro vezes ou mais” por semana ao sítio Santa Bárbara. O ex-segurança afirma que, ao lado de Aurélio, se deslocava entre o apartamento em São Bernardo do Campo e o sítio. “Dona Marisa determinava o que era para ele fazer, passava para mim, e eu ia fazer o serviço”.

O caso envolvendo o sítio representa a terceira denúncia contra Lula no âmbito da Operação Lava-Jato. Segundo a acusação, a Odebrecht, a OAS e também a empreiteira Schahin, com o pecuarista José Carlos Bumlai, gastaram R$ 1,02 milhão em obras de melhorias no sítio em troca de contratos com a Petrobras. A denúncia inclui ao todo 13 acusados, entre eles executivos da empreiteira e aliados do ex-presidente, até seu compadre, o advogado Roberto Teixeira.

O imóvel foi comprado no final de 2010, quando Lula deixava a Presidência, e está registrado em nome de dois sócios dos filhos do ex-presidente, Fernando Bittar — filho do amigo e ex-prefeito petista de Campinas Jacó Bittar — e Jonas Suassuna. A Lava-Jato sustenta que o sítio é de Lula, que nega.