Título: Cala-te!
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 25/04/2012, Opinião, p. 14

No mesmo dia em que a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) divulgou na Espanha relatório criticando a Justiça por causa da morte de jornalistas no Brasil, um profissional foi assassinado no Maranhão. A vítima, Décio Sá, trabalhava em um jornal e tinha um blog em que postava opiniões que nem sempre agradavam a todos. É assim mesmo: quando atrapalhar, tire de circulação, como aconteceu com outros cinco repórteres mortos nos últimos seis meses no país. A maior parte dos casos ocorreu em rincões, onde a liberdade de expressão ainda não existe e quem insiste em exercê-la corre grandes riscos.

Segundo a Campanha Emblema de Imprensa, organização que monitorou os riscos para os jornalistas e produziu um relatório no início de abril, o Brasil hoje figura entre os países onde esse tipo de profissional ainda corre perigo, dependendo do que divulgar. Mas não deveria ser assim. Ficamos, por exemplo, abaixo de nações em que o perigo é iminente, como a Síria, onde nove repórteres foram mortos. A diferença é que lá existe uma guerra civil. No Brasil, felizmente, não.

A liberdade de expressão é um direito que os brasileiros reconquistaram depois de muito tempo calados por regimes autoritários. É preciso falar com responsabilidade, mas é preciso falar, além de tudo. E, para isso, é preciso que as instituições, principalmente a Justiça, garantam esse direito. No relatório da SIP, por exemplo, há críticas ao país, que aparece com Cuba, México, Haiti, Venezuela, Equador, Argentina, Bolívia e Nicarágua como as nações onde ainda há restrições à imprensa. Em alguns casos, que não é o nosso, o problema são os governos, que restringem de alguma forma o trabalho dos profissionais ou mesmo dos veículos de comunicação.

No Brasil, o problema é a pistolagem, que ainda reina em algumas regiões, e serve aos coronéis que dominam a política local. Nos cinco casos ocorridos no país recentemente, ou a vítima falava mal de políticos ou denunciava bandidos. Nenhum jornalista foi assassinado por falar bem de alguém. Nos rincões, infelizmente, ainda existe o bordão do cala-te ou eu te calo. Infelizmente.