Correio braziliense, n. 20104, 07/06/2018. Política, p. 8

 

"Sobra Estado onde ele não deveria existir"

Flávio Rocha

07/06/2018

 

 

Pré-candidato pelo PRB, o empresário Flávio Rocha afirmou que não deixou o comando da rede varejista Riachuelo para ser coadjuvante na disputa pelo Palácio do Planalto. Apontado como sonho de consumo para a posição de vice na chapa de outros pré-candidatos, ele disse que trabalhará pelos milhões de brasileiros que estão órfãos politicamente. “Gosto muito da analogia da carruagem. A força e tração são os trabalhadores. Eles pagam a farra da Corte, que está sentada em cima”, comparou.

Rocha destacou que atingiu o sucesso empresarial porque sempre esteve preocupado com a “dona Maria”. “Ela é a pessoa mais importante e, se está feliz, tudo dá certo. Vamos decidir tendo em vista o que as donas Marias querem para a saúde, a educação e a segurança.”

O pré-candidato afirmou que é favorável à privatização de estatais, entre elas, Petrobras, Caixa Econômica  e Correios. “Temos Estado demais. Essa carruagem, que consome 50% do esforço de produção do Brasil, diz respeito à imensa fatia do Estado que não deveria existir”, frisou. Ele defende a redução dos ministérios para, no máximo, 10. A segurança pública seria vinculada à Defesa.

Ex-deputado federal por dois mandatos, Rocha disse que trabalha em busca de um Estado mínimo, mas preservará as carreiras nobres do funcionalismo, sobretudo as que têm atuado para coibir e investigar a corrupção. Confira trechos da entrevista:

 

O senhor figura em todas as listas como o vice dos sonhos de Henrique Meirelles, de Geraldo Alckmin, de Ciro Gomes. O senhor é candidato ou será o eterno vice?

Eu não saí da minha zona de conforto para ser coadjuvante. Saí pela ausência de ter em quem votar. Eu olhava o ambiente político,  via 35 partidos, dezenas de projetos e um imenso vazio. Falta a mentalidade empresarial na vida pública. O que existe de comum entre a extrema-esquerda e a extrema-direita é o fato de se reportarem a várias corporações. E esse imenso gigante que acabou de despertar, que é o cidadão brasileiro, está órfão politicamente. A lógica da nova política é ouvir, é escutar a imensa maioria de 98% da população brasileira que trabalha e gera riquezas.

 

Eu gosto muito da analogia da carruagem. Ela reflete o país. Tem a força de tração, que são os trabalhadores e empreendedores, que pagam a conta da gigantesca farra estatal. E uma pequena aristocracia, de 2% da população, que se apropriou da corte.  O Estado foi apropriado e serve a benefícios.

Acho que tenho um papel a desempenhar, da mesma forma que na nossa empresa. A empresa bem-sucedida é aquela focada na “dona Maria”, um apelido carinhoso. Se a dona Maria estiver feliz, tudo acontece. No Estado não é assim, porque ganha-se eleição atendendo corporação A, B ou C, e partindo do pressuposto de que o gigante é uma massa inerte de manobra. Então, essa é a novidade da política, é uma guinada de 180 graus.

 

Como o senhor vai combater as corporações que hoje são o principal entrave para a reforma da Previdência, tida quase consensualmente como necessária?

Com o gigante ao meu lado. O gigante despertou, e essa é a novidade. Problemas que desanimam os políticos tradicionais quando olham para a força das corporações são perfeitamente resolvidos quando você pergunta: Que decisão deveríamos tomar sobre a lógica do serviço público?  Vamos redesenhar o Estado a partir de uma folha em branco. Com a força de 98% da população.

 

 

No Judiciário, servidores ganham mais de R$ 18 mil de aposentadoria. Como combater isso? A “dona Maria” não é da área empresarial e não tem tanta força para impor a sua vontade.

Tarefas típicas de Estado devem ser tratadas como tal. Faz sentido a estabilidade no emprego, ter um tratamento diferenciado. Mas a imensa maioria do corpo do Estado tem que ser reprojetado, inclusive o Judiciário. Há um regime de castas entre os dois regimes previdenciários. Não só por uma questão de caixa, mas de justiça social, isso tem que ser revisto.

 

Em determinados discursos, principalmente do lado dos empresários, crucifica-se muito o político. Mas o empresário brasileiro também vive do Estado, com os subsídios. A corrupção não se completa sem o empresário. O que vai mudar em relação à política com o senhor?

O empresário que ajuda a puxar a carruagem é o empresário de mercado. Esse que acorda de manhã e pergunta: O que faço para deixar a “dona Maria” feliz? Mas tem o empresário que está em cima da carruagem. Esse não quer saber da dona Maria, ele pergunta para quem deve entregar o cheque da propina para conseguir um contrato vantajoso com o Estado. O inchaço do Estado traz esse desdobramento extremamente pernicioso. O empresário de conchavo é uma metástase do câncer estatal. Então, mais um motivo para o Estado ser pequeno.

 

O senhor se coloca como um candidato de centro. Mas já disse que não dá para negociar com determinados campos na política. Como vai fazer para governar?

Pelas perspectivas positivas da nossa candidatura, seremos um elo de uma ampla coligação e teremos o respaldo de 60 milhões de votos. Hoje, os dois partidos realmente relevantes que vão determinar a eleição são o dos que puxam a carruagem e o dos que preservam os privilégios dos que estão em cima. Essa é a grande questão. Não é o nós contra eles. Não vai ser capital contra trabalho, nem Nordeste contra Sudeste, não é o conflito fundiário. O conflito é entre os que produzem e os que se apoderaram do seu naco do Estado.

 

O senhor é a favor da privatização de Petrobras, Banco do Brasil, Caixa, Eletrobras?

Sou a favor, temos Estado demais. Mas há uma grande ausência de Estado onde ele deveria existir porque é insubstituível e necessário. O episódio dos caminhoneiros mostrou mais uma perversa forma de tributação, que são os monopólios estatais em setores fundamentais da economia, como de óleo e gás, que são mais uma perversa forma de tributação. Então, vamos realmente ter um plano agressivo de privatização de R$ 600 a R$ 700 bilhões.

Teremos orçamento base zero, mais uma prática empresarial que eu acho necessária neste momento. A estatal do trem-bala, que tem 10 anos e ainda está aí, não resistiria ao primeiro redesenho do orçamento. O componente inercial do inchaço dos gastos públicos será dramaticamente enxugado. E haverá o redesenho do Estado, além da reforma previdenciária, absolutamente necessária.

 

O senhor disse recentemente que uma reforma tributária só entraria em vigor em 2026, porque os políticos não vão votá-la. Como fazer uma reforma, com as injustiças e os danos que a falta dessa mesma reforma vem impondo à sociedade?

Foi um equívoco. Eu estava presente quando o presidente (do PRB) Marcos Pereira mostrou a preocupação de que uma reforma política, que deve será votada pelos que se elegeram por esse sistema, talvez só tivesse efeitos em 2026. Mas a reforma tributaria é absolutamente imprescindível. É a de maior impacto sobre a competitividade. O Brasil, 153º país no ranking de competitividade, pode, com quatro reformas, ir rapidamente para o pelotão dos países menos hostis.

 

Qual a sua relação com o Movimento Brasil Livre (MBL)?

Quando comecei a me expor politicamente, disseram que eu era o candidato dos empresários, depois que era candidato do Nordeste, depois, da minha igreja, depois, do MBL. Todas essas forças nos dão muito conforto e mostram pluralidade da nossa candidatura. No fim de 2015, dei uma entrevista que teve grande destaque. Fui o primeiro empresário que se pronunciou a favor do impeachment. O MBL me ligou e me cumprimentou pela entrevista e eu passei a conhecer aqueles meninos. A maturidade intelectual deles me fascinou. Esse foi o meu relacionamento com o MBL.

 

Além da defesa da ampliação da circulação de armas, o senhor se vê mais próximo em alguma outra questão ou defesa do candidato Bolsonaro?

No campo econômico, nossas posições são totalmente distintas. Acredito que, neste momento, vai haver uma predominância dos valores. Os liberais, como eu, ficam monotematicamente circunscritos ao debate econômico, ininteligível à grande maioria da população, falando de privatizações, de eficiência do Estado. Isso está longe de tocar o coração do eleitor. O inimigo está longe de ser Karl Marx. O que está vivo é o marxismo intelectual. É o de ataque aos valores. É o de bagunçar para conquistar, de erodir as instituições, os alicerces da sociedade, a família, a polícia, a Justiça. É essa a tática. Aí vem o risco de um retrocesso ideológico. E o fenômeno Bolsonaro realmente atende a esse espaço não preenchido, muito embora carregando nas cores, radicalizando demais e gerando muita rejeição, mas é o único que vem tocando claramente nesse campo dos valores.

 

O Estado mínimo que o senhor prega é aquele da década de 1990? Que fez com que os aparelhos de Estado fossem fragilizados e não tivessem a condição, que têm hoje, de enfrentar a corrupção e a sonegação,?

Absolutamente, não é esse meu Estado mínimo. Meu diagnóstico é de que sobra Estado onde não deve existir e falta onde deve existir. O Estado não deve ser mínimo nas tarefas típicas de Estado. O orçamento do Lava-Jato é R$ 1,5 bilhão. Está estrangulado. Isso é uma tentativa de fechar a torneira para desaparelhar uma coisa absolutamente fundamental. O Estado mínimo não chegará às tarefas típicas, necessárias, mas o Estado não terá postos de gasolina, nem terá empresas de entrega de encomenda.

 

Qual seria o tamanho da sua Esplanada? Hoje temos quase 30 ministérios.

São 10 ministérios, uma convergência, estamos em uma fase muito preliminar.

 

O senhor não vai conseguir agradar a todos os políticos, como vai distribuir cargos em troca de apoio político no Congresso?

A lógica não vai ser essa, vai ser de baixo para cima. Eu vou ser os 60 milhões de votos, os 98% de donas Marias e de seus Joãos para fazer a grande coligação que vai transformar o Brasil.

 

Perfil

Flávio Gurgel Rocha.

» Empresário e político brasileiro

» Nasceu em 14 de fevereiro de 1958, em Recife (PE)

» Formado em Administração pela Fundação     Getúlio Vargas

Histórico

» Foi presidente das Lojas Riachuelo, terceira maior rede de moda do país.

» Foi eleito por dois mandatos como deputado federal, passando pelo PFL (atual DEM), PL e PRN