Correio braziliense, n. 20104, 07/06/2018. Política, p. 13

 

"Uma bagunça fiscal digna de sentar e chorar"

Paulo Rabello de Castro

07/06/2018

 

 

Pré-candidato ao Palácio do Planalto pelo PSC, Paulo Rabello leva consigo duas palavras-chave: eficiência e simplificação. O economista e ex-presidente do BNDES promete estratégias incisivas para diminuir a tributação da classe média; reverter o desperdício de dinheiro público em programas obsoletos; mudar a Previdência, cuja reforma está parada na Câmara desde a aprovação da intervenção militar no Rio de Janeiro; e novas medidas para a política de preço dos combustíveis da Petrobras. No caso das aposentadorias, ele defende uma mudança muito mais radical do que a que foi proposta pelo atual governo: quer um sistema de capitalização aberto a todos os brasileiros.

Ex-presidente do IBGE, uma das principais preocupação de Rabello é o alto índice de desemprego, que assombra o brasileiro. Apesar do crescimento econômico ter sido retomado, mais de 27 milhões de pessoas estão fora do mercado de trabalho, incluindo a mão de obra subutilizada. Como solução, defende a democratização do capital à população. “Sei onde o dinheiro está, sei o porquê de estar lá e sei como farei a modificação”, garante.

Quanto à educação pública, o pré-candidato do PSC quer investir em modernização do ensino por meio da internet. Com a ajuda de uma banda larga eficiente, pretende levar às crianças de todo o país um ensino de qualidade. Confira os principais trechos da entrevista:

 

O senhor defende a privatização?

Tudo tem o seu momento e circunstância. Getúlio Vargas não poderia ter feito outro arranjo, senão de montar a Petrobras. Talvez tivesse sido mais interessante reformulá-la antes de alienar para alguém, mas havia pressa. Nosso caso agora é reestruturação de gestão pública, porque há desperdício de dinheiro. O governo não sabe gerir. Eu tentaria otimizar esse preço em uma conversão das estatais, para democratizar o capital. Há décadas, venho insistindo para que olhem para o lado passivo do país. O governo deve à Previdência Social, que é um saco sem fundo. Por isso, utilizaria esse capital para compor o fundo do regime geral da Previdência Social. Já existe, mas a lei não é adequadamente observada e não cumpre seu papel.

 

Um dos calcanhares de aquiles do Brasil é a desigualdade social. No seu projeto, como o senhor visa combatê-la?

Combatê-la de manhã, de tarde, de noite e de madrugada. Não atribuo um caráter meramente assistencialista nesse combate. Essa fase ocorreu durante o primeiro mandato do ex-presidente Lula, quando se incorporou o Bolsa Família. Reconheço a importância. No entanto, deve ser revisto, porque há dinheiro desperdiçado. O primeiro direito social que é negado ao brasileiro é o direito de estar empregado, sem ter preocupação de que talvez passe um ano ou dois sem estar no mercado. Essa massa de desalentados é uma violência contra um país que tem um nível de potencial econômico como o nosso. O segundo aspecto é o da desigualdade no acesso ao capital. A população só poupa dinheiro de modo forçado. Tem uma poupança forçada via FGTS, que não sabe direito se o governo a administra bem ou não. Tem também a Previdência Social, uma poupança que não poupa, porque o sistema é de repartição. Minha proposta é passar da fase assistencialista pura para darmos capital ao povo. Eu sei onde o dinheiro está, sei o porquê de estar lá, e sei como farei essa modificação. Será o milagre da geração de valor pela criatividade que é muito maior que qualquer Bolsa Família.

 

Em 2016, a Receita estimou que, no ano seguinte, o impacto das desonerações sobre as contas da Previdência seria de R$ 63 bilhões. Como defender que deve ser feito uma reforma sem antes acabar com as distorções na arrecadação do sistema, como as desonerações da folha, que retiram receita? Como defender a reforma se o Estado é incapaz de cobrar os defensores confessos da Previdência?

O governo se equivocou. Agora está cometendo um erro ainda maior: o de reonerar a folha de pagamento. Precisamos tornar a relação de trabalho simples, objetiva, direta, sem ônus nenhum, que seja a parte do próprio empregado para seu próprio pecúlio. A outra parte, que já estava lá sendo tributada ao faturamento, deveria ser feita junta, com Pis-Cofins, IPI, Cide e contribuição previdenciária do empregador. Isso se somaria ao ICMS e teríamos a reforma tributária na circulação das mercadorias e serviços. Seria a maneira mais fácil de reformular o sistema fiscal e previdenciário. Essa Previdência, mesmo com reequilíbrio financeiro, não para em pé, porque no século 21 precisaremos de Previdência com algum tipo de capitalização através de contas individuais. Bateu na trave a reforma da Previdência do governo, porque aquilo era um remendo na Previdência velha.

 

Tem como detalhar como seria a sua reforma da Previdência? Seria possível que o governo fizesse essa proposta neste período?

Eu dava meus pitacos. O governo não reunia a tal equipe econômica, porque é basicamente constituída por um ministro da Fazenda e seus assessores. Razão pela qual, na minha gestão, repensarei o Ministério da Fazenda, porque se assume a responsabilidade de dirigir um país inteiro — ter a visão do planejamento e do desenvolvimento nacional —, mas não pensa nada e não diz nada em relação a isso. O assunto dele é só tributar, mas, para isto, tem a Secretaria do Tesouro Nacional e a Receita Federal do Brasil. Eu disse para introduzir a capitalização no produto previdenciário. O país está à beira de um ataque de nervos, razão pela qual houve uma manifestação social por meio de uma classe, que foi o protesto dos caminhoneiros. Se essa mudança for implementada, em 10 anos, teremos a adesão de 26 milhões de jovens que atualmente não utilizam a Previdência Social.

 

Sobre Pedro Parente (ex-presidente da Petrobras), qual seria a sua política para os combustíveis? Qual o papel que o BNDES teria na gestão? Continuaria financiando porto em Cuba e aeroporto em Moçambique?

A empresa valeria muito mais se fossem três Petrobras repartidas e disputando entre si. Com três sistemas de petróleo, a soma do patrimônio líquido seria mais do que o patrimônio de uma única empresa. Pedro Parente diminuiu a produção do diesel nos últimos anos e deu espaço para os exportadores, típico cenário da venda de café. A situação diminui a quantidade, eleva o preço e a frequência diária de reajuste não tem respeito nenhum com o cliente. A solução não pode ser um congelamento de preços, porque estaremos comprando uma crise nova daqui a 60 dias. Mas uma proposta de leilões de suprimento de óleo, porque só conseguimos controlar o tomate na feira, se houver mais tomates sendo oferecidos. Quanto ao BNDES, ele só financia obras de qualquer natureza quando notas fiscais chegam ao banco. Elas só podem ser referidas a máquinas, engrenagens e equipamentos produzidos no Brasil ou serviço de engenharia nacional. Só financia a parte brasileira que foi vendida nessas obras. A parte estrangeira, o Brasil não financia.

 

 

Diante das incertezas eleitorais, as empresas têm medo de investir no Brasil. Depois desse susto da greve, é preciso ter alternativas ao transporte rodoviário. Como transformar o Brasil menos dependente do diesel, da gasolina e das rodovias do país?  Como fugir desse medo generalizado?

Temos uma bagunça fiscal digna para sentar e chorar, mas que tem jeito. Momentos de virada são essenciais para tomar senso e fazer essa renovação. Os investidores estrangeiros estão esperando essa virada e depois vai ter que fazer fila. É um risco político grande, porque eu, tirando meu chapéu de pré-candidato, não vejo propostas para colocar de pé o eixo fiscal do país. Vinte anos para fazer ajuste é quase avisar para o distinto público que dá para desconfiar que não vai dar certo. Tem que ser feito durante o mandato do sujeito que propôs. Temer deveria ter feito a reforma tributária com a reforma dos gastos, sem mexer na Constituição.

 

Os jovens concluem o nono ano como analfabetos formais. Em seu plano de 20 metas, o que prevê para a educação? Para melhorar efetivamente a educação brasileira?

Web educação. Vamos usar as armas do século 21 para levar a educação de melhor qualidade para aquela criança. Onde estiver vai exigir um processo de banda larga. Já temos um satélite estacionário, que já é uma oportunidade ótima e vamos utilizá-lo. Precisamos dar possibilidade, dentro desse sistema web, a qualquer aluno de oportunizar os melhores professores do Brasil, que também vão se capacitar nessa mesma rede. Um problema da educação é que o governo federal faz avaliações muito tardias sobre o que ocorre com o aluno. Só no ensino médio é que começamos a descobrir que ele está sem base. A parte federal da educação tem que ser a fiscalização e estar no comando dessa aeronave educacional. A educação precisa ter uma verba adicional para os professores e alunos estarem em tempo integral. Até 2022, estamos calculando em como transformar essa educação web em tempo integral e aproveitar melhor o tempo: eficiência é a palavra-chave.

 

A gente tem uma preocupação com a desigualdade tributária. Até 1995, os lucros distribuídos aos sócios acionistas eram tributados em uma alíquota de 15%. Passou-se então a uma isenção da tributação. Nos demais países, a tributação é, não apenas da pessoa jurídica, mas também nas pessoas físicas. Só no Brasil e na Eslovênia, o lucro distribuído é isento. O que o senhor, se eleito, pretende fazer para acabar com essa distorção?

O que proponho é passar o país a limpo, simplificar, não dar isenções nem privilégio pra ninguém. Contrato de trabalho simples, Imposto de Renda simplificado, alíquotas que não vão discriminar se a origem do rendimento é do trabalho ou do capital. Portanto, eles vão a partir de uma progressividade a tamanho do rendimento, e não da origem. Mas não vamos deixar os empresários na mão. É preciso ter isonomia. Como a classe média paga mais impostos, eu já andei fazendo as contas: em 2 de janeiro, o trabalhador que ganha menos de R$ 5 mil estará isento de pagar o IR, porque já basta o que paga no supermercado. É uma mudança forte e radical, mas a regra geral é que todos os brasileiros e brasileiras são iguais perante a lei.

Frase

"O governo se equivocou. Agora está cometendo um erro ainda maior: o de reonerar a folha de pagamento"

 

Perfil

Paulo Rabello de Castro (PSC)

»  Formado em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e em direito

pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Atua como economista

»  Nascido em 4 de janeiro de 1949, no Rio de Janeiro (RJ)

 

Histórico político

»  Presidente do BNDES (2017-2018)

»  Presidente do IBGE (2016-2017)