O Estado de São Paulo, n. 45546, 30/06/2018. Economia, p. B4
Sem imposto, arrecadação das centrais cai até 90%
Cleide Silva
30/06/2018
CUT, Força Sindical e UGT perderam R$ 100 milhões em receita entre 2017 e este ano por causa da nova legislação trabalhista
As três maiores centrais sindicais do País – CUT, Força Sindical e UGT – deixaram de arrecadar, neste ano, cerca de R$ 100 milhões em contribuição sindical com o fim da obrigatoriedade de recolhimento do imposto incluído na reforma trabalhista que entrou em vigor em novembro.
As centrais ficavam com 10% do valor arrecadado pelos sindicatos relativos a um dia de salário de cada trabalhador. A queda da arrecadação para algumas centrais chegou a 90% em relação ao ano passado.
A decisão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF), de manter o fim da cobrança compulsória, praticamente elimina a tentativa das entidades sindicais de suspender a medida, com alegação de que era inconstitucional. Agora, sindicatos, federações, confederações e centrais – que dividiam parte da arrecadação do imposto –, terão de buscar outras alternativas para manter seus custos.
Em 2017, a Força Sindical recebeu R$ 43,7 milhões nos meses de abril e maio, quando ocorria o desconto anual do imposto sindical. Neste ano, no mesmo período, foram R$ 3,55 milhões, queda de 92%, segundo informa João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da entidade, que reúne cerca de 1,7 mil sindicatos em todo o País.
Na União Geral dos Trabalhadores (UGT), a queda foi de 90%, de R$ 45 milhões para R$ 4,5 milhões. Já a Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior central sindical do País, calcula que deixará de arrecadar cerca de R$ 20 milhões, o equivalente a 40% dos R$ 50 milhões que recebia anualmente.
Além do imposto sindical, a CUT também recolhe parte do que os sindicatos recebem em mensalidades dos associados e em contribuição assistencial. Alguns sindicatos filiados à central, como o dos Metalúrgicos do ABC, já adotavam a prática de devolver aos trabalhadores a parte que lhe cabia da arrecadação, de 60%.
A entidade também credita a queda menor em relação as outras centrais ao fato de ter elevado índice de sindicalização em seus sindicatos, e de que muitos trabalhadores aceitaram fazer a contribuição voluntariamente.
Ações. Desde a entrada em vigor da reforma trabalhista, sindicatos e confederações moveram 15.551 ações pedindo a inconstitucionalidade do fim da cobrança obrigatória, segundo Domingos Fortunato, sócio do escritório Mattos Filho Advogados. Em sua opinião, a decisão do STF levará os sindicatos a buscar maior profissionalização e resultados para atrair associados que bancarão as atividades sindicais por meio das mensalidades.
Juruna acho o oposto. “A decisão prejudica os trabalhadores e a organização sindical num momento em que o negociado vai prevalecer sobre o legislado, o que exige maior mobilização e organização das categorias”. Segundo ele, sindicatos ligados à Força estão demitindo funcionários, fechando subsedes e colônias de férias para conter custos.
O mesmo ocorre na bases dos sindicato da UCT, informa Ricardo Patah, presidente da entidade e do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de São Paulo, que também foi à Justiça contra o fim da cobrança.
O presidente do Sindicato dos Comerciários de Feira de Santana, na Bahia, Antonio Tadeu Soares Cedraz, diz que projetos de ampliação de programas assistenciais, como quadra de esportes, e abertura de uma colônia de férias foram suspensos. A entidade tinha obtido quatro liminares obrigando cerca de 40 empresas a promoverem o desconto da contribuição. “Tivemos de criar novas taxas para custear as atividades do sindicato, que tem médios e dentistas para atender os trabalhadores que não conseguem pagar planos de saúde”, diz.
A sócia da área trabalhista do Machado Meyer, Andrea Rossi, avalia que a decisão de ontem não vai influenciar os próximos julgamentos envolvendo trabalho intermitente, trabalho de gestante em local insalubre e pagamento de honorários advocatícios pelo trabalhador que perde a ação. “O caso avaliado pelo STF é específico”, diz. No entanto, os ministros que votaram pela manutenção da regra afirmaram que todo o processo de votação da reforma trabalhista no Congresso foi constitucional.
- Reflexo
“A decisão prejudica os trabalhadores e a organização sindical num momento em que o negociado vai prevalecer sobre o legislado.”
João Carlos Gonçalves
SECRETÁRIO-GERAL DA FORÇA
SINDICAL
“Tivemos de criar novas taxas para custear as atividades do sindicato.”
Antonio Tadeu Soares Cedraz, PRESIDENTE DO SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS DE FEIRA DE SANTANA
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Relator do caso foi acompanhado só por dois ministros
Amanda Pupo
30/06/2018
Votos favoráveis ao fim da contribuição sindical obrigatória destacaram que há outras formas de arrecadação de receitas
Relator do processo sobre o fim da cobrança da contribuição sindical obrigatória, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin foi acompanhado apenas por Dias Toffoli e Rosa Weber em seu parecer, favorável ao retorno a obrigatoriedade.
Votaram por manter a inovação da reforma trabalhista, que entrou em vigor em novembro do ano passado, seis ministros: Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia. Celso de Mello e Ricardo Lewandowski não estavam presentes na sessão e não votaram no caso.
O voto de Fachin era previsto. Em despacho de maio, o ministro indicou ser contrário ao fim da obrigatoriedade. Para ele, a decisão do Congresso Nacional fragilizou o sistema sindical brasileiro.
Os ministros que consideraram constitucional a mudança determinada pela reforma destacaram em seus votos que a legislação prevê outras possibilidades de arrecadação pelos sindicatos, como taxas assistenciais, mensalidade ou contribuição associativa. “Eventual desastre no sistema sindical é afirmação que ignora outras formas de custeio”, afirmou Fux ontem.
A ministra Rosa Weber concordou que a Constituição de 1988 definiu um sistema baseado no tripé de contribuição compulsória, unicidade sindical e representação obrigatória. “Nós temos esse sistema. Enquanto não for alterado como um todo, como nós iremos enfraquecê-lo?”, disse. Para Toffoli, o fim da obrigatoriedade foi feito “do dia para noite”, sem preparações para substituição do financiamento dos sindicatos.
A maioria dos ministros, no entanto, entendeu que a mudança está de acordo com o sistema de liberdade definido pela Constituição. Barroso afirmou que o modelo que vigorou até a reforma – com desconto obrigatório de um dia de trabalho de todos os empregados para seu respectivo sindicato – beneficiou os sindicalistas e não os trabalhadores.
“Tenho um pouco do sindicalismo a mesma visão que tenho do capitalismo brasileiro: em lugar de conquistar clientes e consumidores, o que se quer é conquistar o Estado para se obter subsídios, vantagens e desonerações”, afirmou Barroso.
Moraes destacou a questão da representatividade. “Há cerca de 16 mil sindicatos e aproximadamente 20% dos trabalhadores sindicalizados. Há algo de errado com o que o constituinte pretendeu. Não há representatividade”, afirmou.
- Crítica
“Há 16 mil sindicatos e 20% dos trabalhadores sindicalizados. Não há representatividade.”
Alexandre de Moraes​, MINISTRO DO STF