Título: Delta será declarada empresa inidônea
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 20/04/2012, Politica, p. 4

Uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região de 19 de março suspendeu a Certidão de Acervo Técnico (CAT) apresentada pela Delta Construções para atestar a capacidade de serviço de coleta de lixo da empresa. O acórdão será usado pelo GDF para justificar a abertura de um Processo Administrativo contra Fornecedores (PAF) que tem como objeto a declaração de inidoneidade da empresa. Quando isso ocorre, a firma fica impedida de contratar com a administração pública. Ou seja, em meio ao escândalo levantado pela Operação Monte Carlo da Polícia Federal, o governo do DF, amparado por um decisão judicial, adotará o procedimento para banir a Delta do mercado do lixo na capital federal.

O atestado apresentado pela Delta é objeto de uma disputa judicial que se arrasta desde 2009 e teve como origem contrato com a administração pública de Palmas. O documento emitido no município foi anulado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Tocantins (Crea-TO) por meio da portaria número 60 de 2009. A Delta, no entanto, conseguiu manter a validade da CAT por força de um mandado de segurança, que foi usado como base para a inserção da Delta no mercado de lixo do DF. O remédio jurídico utilizou o argumento de que, no processo de invalidação da CAT, faltou o cumprimento do rito de processual, como ouvir o contraditório.

Foi com a liminar que garantia a validade da CAT na administração de Tocantins que a Delta conseguiu no Tribunal de Justiça do DF a abertura dos envelopes na concorrência pública do governo local para a terceirização da coleta de lixo. Embora a comissão de licitação do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) tivesse desclassificado a empresa alegando falta de recursos técnicos em 2009, a Delta conquistou, também por meio de liminar, o direito à abertura do envelope de preço, que manteve a empresa na concorrência pública, vindo a assumir os lotes 1 e 3 da coleta de lixo em dezembro de 2010.

Menos de um mês depois que a Delta começou a atuar no mercado do lixo do DF, a Secretaria de Transparência e Controle do DF iniciou uma auditoria especial nos contratos do lixo, decisão oficializada no Diário Oficial do DF de 28 de janeiro de 2011. O resultado da investigação está no Relatório de Inspeção número 22 de 2011 (leia fac-símile ao lado) e aponta indícios de falhas na prestação do serviço pela Qualix, Valor Ambiental e pela Delta, embora a última tenha sido objeto de apuração oficial por menos tempo.

Riscos ao contratante Entre os pontos levantados pelos auditores, os técnicos da Secretaria de Transparência destacaram: "A empresa Delta Construções, que assinou o contrato em dezembro de 2010, também não apresentou até o presente momento os referidos planos dos lotes I e III. A ausência desse instrumento tem gerado problemas na condução do controle e fiscalização dos serviços executados, criando a necessidade de adotar métodos indiretos para quantificar o pagamento". E prosseguem os técnicos: "A empresa contratada disponibiliza a mão de obra e transfere para a contratante o ônus dos riscos de produção". A análise sugere que não havia controle sobre a produção da Delta.

Em outro ponto, o relatório de inspeção ainda constata problemas na planilha de custos unitários apresentada pela empresa. "Nela, podemos constatar a invalidade flagrante da proposta de preços, que não apresenta valores, ou seja, totalmente em branco. Apresentou somente o valor global", diz o relatório de inspeção. Ainda de acordo com o texto produzido por auditores da Secretaria de Transparência, o projeto básico de coleta de lixo previa dois tipos de serviço de varrição de vias. Uma manual e a outra mecanizada, prevista no contrato para ser feita nas ruas com meio-fio, asfaltadas, de grande movimentação de carros e em horários alternativos para não causar grande impacto sobre o tráfego.

Mas, com base no atesto mensal (um relatório produzido sobre os serviços prestados), os auditores constataram não haver pagamento para os serviços de varrição mecanizada, o que levou os mesmos a concluírem que o trabalho não estava sendo realizado pelas empresas contratadas. A informação foi confirmada em entrevista com os executores da coleta de lixo. O problema é que, embora o serviço não estivesse sendo prestado, a auditoria detectou pagamentos para a Delta referentes às varrições mecanizadas.

Descredenciamento Ocorre que as suspeitas de problemas na execução do contrato com a Delta foram detectadas ainda no primeiro semestre do ano passado, resumidas no relatório de inspeção de maio de 2011, bem antes da Operação Monte Carlo, que expôs supostos esquemas da empresa em parceria com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Mas só agora, depois que o escândalo veio a público, os indícios vão ajudar a embasar um PAF cujo resultado pode levar ao descredenciamento da Delta no DF, situação que, aliás, pode ter consequências nacionais, uma vez que empresa declarada inidônea fica impedida de prestar serviço em todas as esferas da administração pública.

O secretário de Transparência do DF, Carlos Higino, explica que, embora o governo tivesse indícios de problemas na execução do contrato de lixo, a Delta estava respaldada por decisão judicial a manter o negócio no DF. Ele cita que um dos argumentos que abriram as portas para a empresa no GDF foi o preço mais baixo em relação às concorrentes, mas ressalta que esses valores, como apontou a auditoria, podem ter mascarado serviços incompletos.

Parte das conversas captadas pela Polícia Federal mostra integrantes do esquema de Cachoeira negociando indicações para o Serviço de Limpeza Urbana (SLU) do DF. "As estratégias demonstram que a empresa tinha preço baixo e tentou se articular para indicar pessoas no SLU que ficassem responsáveis por afrouxar a fiscalização, o que não ocorreu", diz Higino. Com base na decisão que, em segunda instância, suspendeu a CAT da Delta, ele diz que a secretaria está amparada para abrir um processo de inidoneidade contra a empresa.