O Estado de São Paulo, n. 45544, 28/06/2018. Política, p. A10

 

Para Gilmar, STF volta ‘a ser Supremo’

Amanda Pupo e Rafael Moraes Moura

28/06/2018

 

 

Comentário de ministro se refere a sessão que marcou derrotas do relator da Lava Jato, Edson Fachin, para quem juízes não têm ‘ideologia’

Um dia após a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal impor novas derrotas ao ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato na Corte, o ministro Gilmar Mendes disse ontem que “o Supremo está voltando a ser Supremo”. Crítico dos métodos de investigação da Lava Jato, Gilmar negou que a Segunda Turma esteja rachada.

Os comentários foram feitos sobre a sessão extraordinária do colegiado, na manhã de anteontem, que marcou um clima tenso entre os ministros e quatro reveses de Fachin em processos da Lava Jato e desdobramentos. Fachin ficou vencido contra os votos alinhados de Gilmar, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.

Mapeamento feito pelo Estado nas votações cruciais da operação na Segunda Turma aponta que Fachin foi derrotado ao menos 17 vezes em 34 questões julgadas desde que assumiu a relatoria, em fevereiro do ano passado.

Questionado ontem sobre os reveses na Turma, Fachin disse que juízes não têm “vitórias nem derrotas”. Ele discordou de avaliações nos bastidores de que a liberdade do ex-ministro José Dirceu teria sido uma forma de retaliação por ter enviado ao plenário do STF, e não ao colegiado, recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com pedido para suspender a prisão. “Juízes não têm ideologia nem segmento para pender para um lado A ou lado B”, disse.

Nos bastidores, no entanto, integrantes da Segunda Turma entendem que a decisão de Fachin usurpou a competência do colegiado e foi uma manobra para evitar nova derrota. Outro ministro, no entanto, considera que o colega fez bem, já que tudo que é institucionalmente importante deve ser julgado pelo plenário.

Para Gilmar, a decisão que libertou Dirceu é “absolutamente normal” e a Corte tem tomado “boas decisões”, “voltando para um plano de maior institucionalidade”.

O ministro citou o julgamento do plenário que derrubou o uso da condução coercitiva para interrogatórios, e a sessão da Segunda Turma que absolveu a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), denunciada no âmbito da Lava Jato. “Tivemos uma discussão muito relevante no que diz respeito ao caso Gleisi-Paulo Bernardo, acho que também aqui o tribunal afirmou o que é o significado das delações. Acho que nós estamos caminhando bem, o Supremo voltando a ser Supremo.”

Lula. Questionado se a decisão sobre Dirceu pode ter impacto na análise do pedido da defesa de Lula, criando um precedente positivo para o ex-presidente, Gilmar disse que a questão “não está posta”. “Vamos aguardar.”

O ministro Marco Aurélio Mello, por sua vez, disse que o STF não estaria dividido se a presidente da Corte, Cármen Lúcia, tivesse pautado as ações que tratam da prisão após condenação em segunda instância. “Tempos estranhos. Estou aqui há 28 anos, e nunca vi manipulação da pauta como esta”, disse o ministro, relator de três ações sobre o assunto.

Procurada, a assessoria de Cármen Lúcia informou que a ministra não se pronunciaria.

 

Repercussão

“Estamos caminhando bem, o Supremo voltando a ser Supremo.”

Gilmar Mendes​, MINISTRO DO SUPREMO

 

“Juízes não têm ideologia nem segmento para pender para um lado A ou lado B.”

Edson Fachin​, RELATOR DA LAVA JATO NO SUPREMO

 

“Estou aqui há 28 anos, e nunca vi manipulação da pauta como esta.”

Marco Aurélio Mello​, MINISTRO DO SUPREMO

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Plenário dará palavra final sobre recisão de acordos da J&F

Breno Pires, Rafael Moraes Moura  e Amanda Pupo

28/06/2018

 

 

Decisão do ministro do STF Edson Fachin ocorre após Ministério Público Federal denunciar Joesley por corrupção

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu ontem que caberá ao plenário da Corte homologar ou não a rescisão dos acordos de colaboração premiada firmados pelos irmãos Joesley e Wesley Batista e pelos ex-executivos da J&F Ricardo Saud e Francisco de Assis e Silva, solicitada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

O encaminhamento foi dado após o Ministério Público Federal denunciar nesta semana Joesley e Francisco de Assis, além do ex-procurador da República Marcello Miller e a advogada Esther Flesch, por corrupção. Fachin, no entanto, ressaltou que a análise no Supremo é especificamente sobre o descumprimento de termos do acordo – no caso, a omissão de informações apontada pela Procuradoria-geral.

A rescisão das delações de Joesley e Ricardo Saud foi comunicada ao Supremo pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em setembro de 2017. Após se tornar de conhecimento público um diálogo gravado entre os executivos, Janot apontou que eles agiram de má fé ao omitirem suposto fato criminoso envolvendo o senador Ciro Nogueira (PP-PI) e a atuação do ex-procurador da República Marcello Miller – que teria atuado como advogado da J&F quando ainda estava vinculado ao MPF – no acordo.

A sucessora, Raquel Dodge, endossou o posicionamento e ainda estendeu a rescisão a Wesley e Francisco de Assis. Contudo, como Fachin observou, só uma decisão do Supremo poderá confirmar o encerramento do acordo. Depois de ouvir as razões da PGR para a rescisão e as dos colaboradores da J&F pela manutenção, Fachin destacou que é importante colher provas para garantir o amplo direito de defesa. As partes terão prazo de cinco dias.

Nos bastidores, advogados dos delatores consideraram positivo o ministro Fachin ter aberto uma instrução antes da decisão, apesar de a PGR ter pedido a homologação imediata. As defesas também comemoraram que o ministro tenha autorizado, em maio, o pagamento “por conta e risco” de cada delator da primeira parcela da multa prevista no acordo de colaboração – a despeito da alegação da PGR que isso não deveria ser feito, uma vez que o acordo já tinha rescindido.

Por outro lado, Fachin indicou ver como “graves” as afirmações encaminhadas pela PGR. “As graves circunstâncias narradas devem ser apreciadas e definidas por este Tribunal, impondo sem delongas as sanções e chancela das responsabilidades, se cabíveis”, disse.

Providências. Fachin também pediu que Raquel Dodge informe quais as providências que pretende tomar em relação a um termo da colaboração premiada da J&F que trata da suposta entrega de R$ 1 milhão em espécie no escritório do coronel João Baptista Lima, amigo pessoal de Temer. O repasse é narrado no termo complementar da delação premiada de Florisvaldo Caetano de Oliveira, um dos delatores da J&F. A assessoria da J&F informou que não se pronunciaria. A defesa do coronel Lima não foi localizada. A defesa de Temer informou que não se pronunciaria.

 

ACORDO SUSPENSO

11 de maio de 2017

Acordo da J&F é homologado pelo ministro Edson Fachin, do Supremo.

 

4 de setembro de 2017

Rodrigo Janot abre investigação sobre o acordo por suposta omissão da participação do ex-procurador Marcello Miller na colaboração.

 

10 de setembro

Joesley Batista é preso em São Paulo.

 

14 de setembro

Janot diz que decidiu rescindir as delações de Joesley e do executivo do grupo Ricardo Saud.

 

18 de setembro

Sucessora de Janot, Raquel Dodge reitera pedido para rescindir delação de Joesley. Rescisão depende de homologação do STF.

 

24 de junho de 2018

Joesley e o ex-procurador Marcello Miller são denunciados pela Procuradoria por corrupção.

 

27 de junho

Fachin abre diligências para apurar irregularidades no acordo da J&F. Caberá ao plenário decidir se homologa a rescisão.

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Moro vai decidir se Dirceu usará tornozeleira eletrônica, diz juíza

Teo Cury, Dida Sampaio e Thiago Faria

28/06/2018

 

 

Ex-ministro deixou o presídio da Papuda na madrugada de ontem após decisão da Segunda Turma do Supremo

A juíza Leila Cury, da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, determinou que o exministro José Dirceu, solto por ordem da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, se apresente à 13.ª Vara Federal do Paraná em cinco dias. Segundo a juíza, caberá à Justiça do Paraná, onde atua o juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, decidir sobre o uso de tornozeleira eletrônica.

Dirceu deixou o Complexo Penitenciário da Papuda na madrugada de ontem e voltou para casa, no Sudoeste, região nobre de Brasília, onde chegou por volta das 2 horas. O ex-ministro estava preso desde o fim de maio, após o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) confirmar a sua condenação na Lava Jato. Anteontem, a Segunda Turma do STF o libertou.

Ontem de manhã Dirceu compareceu à Vara de Execuções Penais na capital federal. “Ele deverá permanecer à disposição do Juízo da 13.ª Vara Federal da Seção Judiciária do Paraná, para dar continuidade ao cumprimento das medidas cautelares diversas da prisão preventiva anteriormente impostas, inclusive para instalação de nova tornozeleira eletrônica, se o caso”, escreveu a juíza. Ela lembrou que, ao ingressar no presídio, Dirceu estava sob monitoramento eletrônico.

Copa. Ao sair do prédio da Vara de Execuções Penais, o ex-ministro foi abordado pela imprensa, mas evitou falar. No entanto, ao ser questionado sobre o jogo entre Brasil e Sérvia, que ocorreria à tarde, disse: “Um a zero está bom”. “A liberdade do José Dirceu é apenas mais uma etapa de um longo e complexo processo”, afirmou seu defensor, advogado Roberto Podval.

Dirceu teve a pena aumentada pelo TRF-4 para 30 anos e 9 meses. Sua defesa, porém, recorreu ao Supremo com a alegação de que a Corte autoriza prisão em segundo grau, mas não a tornou obrigatória.