Correio braziliense, n. 20103, 06/06/2018. Cidades, p. 19

 

Jovens são os que mais morrem na capital

Flávia Maia, Gabriela Vinhal e Luiz Calcagno

06/06/2018

 

 

SEGURANÇA PÚBLICA » Atlas da Violência aponta aumento na taxa de homicídios do DF por grupo de 100 mil habitantes, entre 2015 e 2016. Maioria das vítimas tinha entre 15 e 29 anos. Apesar do crescimento, índice de assassinatos é um dos menores do Brasil

O Atlas da Violência, divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostrou que as taxas de homicídios no Distrito Federal crescem em velocidade menor do que em outras unidades da Federação. Mesmo assim, entre 2015 e 2016, o índice aumentou 0,3% — a taxa é de 25,5 assassinatos a cada 100 mil habitantes. No Brasil, a variação foi de 5% no mesmo período, com 30,3 mortes violentas para cada 100 mil pessoas. Os homicídios praticados na capital do país, além dos crimes contra o patrimônio, reforçam a sensação de insegurança.

Quando a análise mira grupos vulneráveis, os assassinatos crescem no DF. Jovens entre 15 e 29 anos, mulheres e negras estão mais propícios a serem vítimas. Entre 2015 e 2016, a cada 100 mil jovens, 50,4 morreram assassinados no DF, principalmente, homens — um aumento de 6% entre 2015 e 2016. O estudo mostra que a região acompanha o fenômeno nacional. No Brasil, são 65,5 mortos intencionalmente a cada 100 mil jovens. O levantamento alerta que o agravamento desse quadro em 2016 dever ser uma preocupação para o Brasil.

Para os autores do Atlas da Violência, o assassinato de jovens é um problema que se prolonga por décadas, “mas que permanece sem a devida resposta”, e que faltam políticas públicas eficientes para enfrentar a questão. “A juventude negra, sobretudo do sexo masculino, é quem mais sofre com a violência. O Estado tem uma incapacidade de manter essa parcela da população na escola, de forma efetiva”, alerta Cristina Neme, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “É preciso pensar em políticas públicas que revertam essa situação. Ou vamos acompanhar o extermínio de uma geração”, complementa.

Dados nacionais mostram que, em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no país, o que representa uma taxa de 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras. Em 10 anos, observa-se um aumento de 6,4%. No Distrito Federal, foram 64 vítimas em 2016. A taxa é similar à nacional. Foram quatro mulheres assassinadas a cada 100 mil. São histórias como a da estudante de biologia Louise Ribeiro, atacada e morta dentro da Universidade de Brasília (UnB) aos 20 anos, em março de 2016. O assassino confesso é Vinícius Neres, à época com 19 anos. A causa do crime seria o fato de a vítima não mais querer namorá-lo.

Dois anos depois, os feminicídios continuam a assustar o DF. Neste ano, Jessyka Laynara Silva, 25, foi morta pelo ex-namorado com cinco tiros, em Ceilândia. O soldado da PM Ronan Menezes do Rego, 27 anos, não aceitava o fim do relacionamento. Quando a mulher é negra, a situação toma proporções mais graves: no Brasil, a taxa sobe 17% — são 5,3 assassinadas a cada 100 mil. O estudo defende que, para o enfrentamento da violência contra a mulher, além de dar visibilidade aos crimes, é fundamental a manutenção, a ampliação e o aprimoramento das redes de apoio previstos na Lei Maria da Penha.

Viva Brasília

Embora os índices de violência continuem crescendo no DF entre 2015 e 2016, o DF foi apontado como uma das unidades da Federação mais combativas em relação aos homicídios. Cristina Neme explica que o futuro não será promissor se os estados não promoverem políticas públicas e consistentes para o enfrentamento da violência. Entre as unidades federativas que colocaram em prática esses projetos, a especialista cita o Distrito Federal, com o programa Viva Brasília. “Não é a única solução, mas é uma forte medida. Os estados que chegaram a implementar, mas não deram continuidade, sofreram com um grande aumento de violência entre a população”, justificou.

Para o pesquisador em segurança pública Nelson Gonçalves, ainda existe uma sensação de insegurança em Brasília por causa da ausência do Estado, que investe mais em policiamento do que em políticas públicas, como saúde e educação. Ele destaca, ainda, a falta de efetividade da lei. “O que nós temos é uma legislação leniente em relação ao crime, que oferece uma série de saídas e, por vezes, acaba oferecendo proteção ao indivíduo em detrimento à proteção da sociedade”.

Proprietária de uma padaria na QR 125 de Samambaia, Terezinha Batista, 62 anos, trabalha atrás das grades. “Perdi as contas de quantas vezes fui assaltada”, queixa-se. A última vez foi há cerca de três meses. “Levaram dinheiro e cigarro. Trabalho com a porta fechada. Só abro para quem eu conheço”, completa. A Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social não respondeu às questões levantadas pelo Correio.

Sob risco

Índices de violência no DF por grupo de 100 mil habitantes

 

Taxa de homicídio Alta de 0,3%

Taxa de homicídios entre jovens de 15 a 29 anos Alta de 6%

Taxa de homicídios de mulheres Alta de 8,3%

Taxa de homicídios de mulheres negras Alta de 11,4%

Taxa de homicídios de mulheres não negras Queda de 10,8%

Taxa de homicídios por arma de fogo Alta de 3,3%

 

Fonte: Atlas da Violência 2018 (comparação entre 2015 e 2016)

____________________________________________________________________________________________________________________________________________

Aplicativo contra a criminalidade

06/06/2018

 

 

Redes sociais como o WhatsApp têm ajudado no combate à criminalidade. Alvo de criminosos, rodoviários de Samambaia se organizaram e criaram um grupo com o batalhão local da Polícia Militar. Eles usam o espaço virtual, chamado de SOS 11º Batalhão, para informar sobre a presença de suspeitos em ônibus. Na última sexta-feira, com a ajuda do aplicativo, militares prenderam três adolescentes armados com facas que tentavam subir em um coletivo.

Samambaia é a cidade com maior índice de roubo a ônibus do DF. Segundo balanço do programa do GDF Viva Brasília, até fevereiro, houve 108 casos, mais de um por dia. Em 2017, a média diária foi de mais de dois assaltos por dia. O motorista Dimas Fernandes, 31 anos, sente-se mais seguro com o grupo de WhatsApp. “Pode ajudar. Fui assaltado cinco vezes. A última, há dois meses. A gente fica com medo. Eles apontam uma arma pra você e mandam não olhar. Há colegas, que, em outras viagens, depois do roubo, até reconheceram o assaltante no ônibus novamente”, relata.

“Com o WhatsApp, se há um suspeito, vamos avisando e passando as características. Às vezes, outro colega que está no grupo até liga para a polícia para reforçar a denúncia”, comenta o cobrador Manuel de Oliveira Gonçalves, 42. Ele sofreu duas tentativas de assalto e dois roubos. “Sabendo que existe o grupo, os assaltantes até podem pensar duas vezes antes de fazer um assalto. Alguém pode denunciá-los. Entendi que o importante é estarmos conectados com o batalhão”, afirma.

Formal ou informalmente, diversos batalhões da PM adotaram a prática de se corresponder por WhatsApp com a população. Quem conta é o porta-voz da corporação, major Michello Bueno. Segundo ele, normalmente, há um policial destacado para filtrar as mensagens e direcionar equipes. Com essa orientação, as rondas ficam mais eficientes. Segundo ele, a estratégia é usada com moradores do Lago Sul, Lago Norte, Taquari e área rural de Brazlândia.

Eficiência

Assessora especial da Secretaria de Segurança Pública, Nélia Vieira explica que, para a gestão comunitária de segurança acontecer, é preciso fortalecer os conselhos comunitários. O plano do GDF é incluir essas organizações no Portal do Voluntariado. Dessa forma, os presidentes desses grupos terão acesso a um e-mail institucional, e todos os moradores de uma região administrativa poderão acompanhar as datas dos encontros, as pautas e as sugestões de cada localidade. “Uma área rural não tem as mesmas necessidades de uma região urbana. Esse planejamento é mais eficiente com a comunidade”, destaca Nélia.

O subsecretário de Gestão de Informação da Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social, Marcelo Durante, destaca que a gestão comunitária é sinônimo de economia e eficiência. “A ação policial é limitada. Se você usa a estatística criminal e coloca o policial em uma localidade, o criminoso vai migrar para outra. Mas, quando a sociedade atua, é diferente. Nesses casos, os moradores passam a ter controle sobre o próprio ambiente”, detalha Marcelo. (LC)