O Estado de São Paulo, n. 45530, 14/06/2018. Metrópole, p. A17

 

Justiça federal limita a 5,72% teto de reajuste de palno de saúde individual

Lígia Formenri

14/06/2018

 

 

Convênios. Em resposta a ação civil pública proposta por entidade de defesa do consumidor, juiz disse haver falta de clareza na metodologia da ANS para definir porcentual; agência e operadoras vão recorrer, e especialistas veem risco de ampliar judicialização

Liminar concedida pelo juiz da 22.ª Vara Cível Federal de São Paulo, José Henrique Prescendo, fixou um teto de 5,72% para o reajuste de planos de saúde individuais no período 2018-2019. A decisão foi dada em resposta à ação civil pública proposta pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e ocorre às vésperas de a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) divulgar o aumento. A ANS e as empresas contestam e especialistas veem precedente para ampliar a judicialização.

A expectativa era de que o aumento concedido ficasse em torno de 10%. Atualmente, cerca de 9,1 milhões de pessoas têm contratos individuais.

Na decisão, o juiz afirmou haver falta de clareza na metodologia usada pela ANS para determinar os porcentuais de reajuste e considerou ser indispensável um equilíbrio entre o índice autorizado e o aumento salarial. Enquanto uma metodologia não é acertada, o juiz fixou na liminar o reajuste com base na variação do IPCA do Setor de Saúde e Cuidados Pessoais no período entre maio de 2017 e abril deste ano. No mesmo período, o IPCA foi de 2,76%.

Para a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), o IPCA não é referência em relação à variação das despesas do setor e ao subsequente reajuste dos serviços. “A cesta do IBGE ‘setor de Saúde e Cuidados Pessoais’ é composta por itens não relacionados aos serviços ofertados pelos planos de saúde, como higiene pessoal e limpeza.”

“Todo produto quando é extremamente regulado, como é o caso dos planos de saúde e o seu controle de reajuste, tende a se tornar estritamente seletivo ou até mesmo a desaparecer. Essa é uma lição da economia mundial”, afirmou Reinaldo Scheibe, presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).

A ANS vai recorrer. Em nota, afirmou repudiar “ações desprovidas de fundamentação técnica, que acabam causando comoção social e viés pró-judicialização de temas sob responsabilidade do órgão regulador.”

Para o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e conselheiro do Instituto de Defesa do Consumidor, Mário Scheffer, a liminar pode significar um precedente importante. “Certamente isso trará luz para a discussão não apenas dos planos individuais, mas, numa outra etapa, de coletivos.” Hoje, 38,3 milhões de pessoas têm planos coletivos.

Questionamento. O advogado Pedro Robba avalia que, com a decisão, a atividade regulatória da ANS é questionada. “Ao que parece a agência está enfraquecida. Já havia o aumento da judicialização, pessoas contestando na Justiça os valores das mensalidades. Depois, veio o relatório do TCU e, agora, essa liminar.” Assim como Scheffer, ele acredita que a liminar abre caminho para a discussão de planos coletivos.

Proposta em maio, a ação do Idec solicitava a suspensão total do reajuste e citava como base um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU). Este aponta que a metodologia usada pela ANS para definir reajustes contém falhas, falta de transparências e de mecanismos para conter abusos.

Uma das principais críticas é o uso de um fator moderador. Esse valor é aplicado na média de reajuste de planos coletivos. A prática teve início em 2009, sob a justificativa de que reduziria o impacto de operadoras de planos na incorporação de tecnologias.

Para o TCU, no entanto, essa metodologia representa uma dupla cobrança. Isso porque no cálculo das mensalidade de planos coletivos o impacto da incorporação de novas tecnologias já está embutido. Além do fator moderador, o TCU questiona o fato de as informações prestadas pelas operadoras não serem checadas.

 

No Brasil

Hoje, 9,1 milhões têm contratos individuais

 

Sentença

“A situação não pode subsistir, já que lesiona todos os consumidores de planos individuais, que, inclusive, frequentemente ingressam com ações judiciais para discutir valores (...). Há de se encontrar uma solução.”

José Henrique Prescendo,​ NA JUSTIFICATIVA DA DECISÃO