Título: De olho nos votos dela
Autor: Vicentin, Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 24/04/2012, Mundo, p. 16

Se há alguém com motivos de sobra para comemorar o resultado do primeiro turno das eleições francesas, esse alguém é Marine Le Pen. A líder da Frente Nacional (FN), de extrema direita, alcançou 17,9% dos votos — um índice que consolidou sua posição de fiel da balança para a definição do novo presidente, em 6 de maio. De olho no capital político de Marine, os dois primeiros colocados, o presidente Nicolas Sarkozy e o socialista François Hollande, já fizeram gracejos aos eleitores da FN, convocando-os para o segundo turno.

É improvável, porém, que Marine apoie qualquer um dos candidatos: a dama da direita pretende se distanciar do "sistema" e ganhar o posto de líder da oposição. A posição radical e o suporte que ela recebeu nas urnas alarmaram líderes europeus, que temem uma inclinação extremista em um dos países mais importantes para a Zona do Euro (Leia abaixo).

No primeiro dia da reta final da eleição, Hollande e Sarkozy tentaram estender a bandeira branca aos apoiadores de Marine. O socialista fez referência ao voto dos indignados, franceses de classes sociais mais baixas e desiludidos com a esquerda. "Há eleitores que escolheram esse voto por raiva. São esses que eu quero ouvir", disse Hollande. Sarkozy citou os insatisfeitos com a gestão da crise. "Temos de respeitar o voto, nosso dever é ouvir. Esse voto de crise dobrou de uma eleição para outra, e é para essas pessoas que devemos dar resposta", assinalou o presidente, que concorre pela direitista União por um Movimento Popular (UMP). Hollande venceu Sarkozy no primeiro turno, com uma pequena margem: 28,63% a 27,18%.

Foi o atual mandatário o mais prejudicado com o avanço de Marine, com quem disputou o voto dos mais conservadores. "Sarkozy vive, agora, um dilema eleitoral. Ele precisa mobilizar um número substancial de eleitores de Le Pen para ter alguma esperança de ganhar", disse ao Correio Jocelyn Evans, professor da Universidade de Salford (Reino Unido) e administrador de um observatório das eleições francesas. Para isso, Sarkozy terá que endurecer o discurso anti-imigração, uma estratégia que faria com que ele perdesse potenciais eleitores de Jean-Luc Mélenchon, da Frente de Esquerda, e de François Bayrou, do Movimento Democrático, quarto e quinto colocados, respectivamente.

A expectativa é que Sarkozy conquiste cerca de 40% dos eleitores da Frente Nacional, embora pesquisas otimistas deem a ele 60%. O candidato do Partido Socialista conseguiria algum apoio dos eleitores de Marine, principalmente dos operários e dos trabalhadores de "colarinho branco", mas nada decisivo para o resultado. Pesquisas de intenção de voto apontam a vitória de Hollande sobre Sarkozy, por uma diferença de até 10 pontos percentuais.

Ambição

Mesmo com as especulações sobre para onde os eleitores de Marine devem ir, é improvável que ela apoie algum dos dois candidatos. A líder da extrema-direita disse que falará sobre o assunto na próxima terça-feira, 1º de maio, um feriado bastante significativo para os franceses. A aposta é que ela convoque seus eleitores à abstenção e use seu bom desempenho mas urnas para impulsionar o partido a ganhar mais cadeiras nas eleições legislativas, em junho. "Ela poderia sinalizar na direção de Sarkozy, de forma a impedir uma vitória da esquerda. Mas, provavelmente, vai preferir esperar para ganhar influência no parlamento, particularmente, sobre os candidatos da UMP (partido de Sarkozy)" afirma Evans.

Em 2002, a FN teve um desempenho surpreendente, quando o pai de Marine, Jean-Marie Le Pen, chegou ao segundo turno. Ele foi derrotado pelo candidato da UMP, Jacques Chirac. Desta vez, as coisas são diferentes. Os membros do partido de Marine sabem que podem ter ganhos políticos. Alguns analistas creem que Marine já esteja procurando fortalecer sua imagem com vistas à eleição presidencial de 2017.