O globo, n. 30966, 19/05/2018. País, p. 4

 

Governadores do Nordeste criticam Temer

Sérgio roxo

19/05/2018

 

 

Encontro também teve discussões sobre frente de esquerda em torno da candidatura de Ciro Gomes

Reunidos em Recife, os governadores de seis estados do Nordeste (Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Bahia) e de Minas divulgaram ontem uma carta com duras críticas ao governo do presidente Michel Temer (MDB), em alinhamento com o discurso adotado por candidatos de oposição na disputa pelo Palácio do Planalto, como Ciro Gomes (PDT).

A pauta oficial do encontro era a privatização da Eletrobras e as questões federativas que atingem a região, mas as discussões políticas sobre o posicionamento de legendadas como PT e PSB, tanto na disputa presidencial como nas corridas estaduais, fizeram parte das conversas entre os governadores. Pelo menos três dos presentes já defenderam publicamente a necessidade de uma frente de esquerda na eleição para a Presidência da República.

O anfitrião Paulo Câmara (PSB) é favorável a que Ciro encabece a chapa. Nesta semana, o governador petista do Ceará, Camilo Santana, disse, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, não acreditar que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril em Curitiba, poderá ser candidato em outubro. Segundo ele, com esse cenário, o melhor caminho para o PT seria apoiar Ciro e indicar o vice.

 

PT E PSB NEGOCIAM EM PERNAMBUCO E MINAS

Após a divulgação da declaração de Camilo, a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), convocou uma reunião com os cinco governadores da legenda para a próxima semana em Brasília. Manifestações em defesa de um plano alternativo a Lula na disputa presidencial têm sido duramente atacadas por dirigentes petistas nas últimas semanas.

O partido vem reiterando que registrará a candidatura do ex-presidente no dia 15 de agosto, mesmo com a sua condenação em segunda instância no caso do tríplex do Guarujá, o que o enquadra na Lei da Ficha Limpa. No plano dos petistas, enquanto a Justiça Eleitoral julga a impugnação, o que duraria pelo menos um mês, Lula apareceria no horário eleitoral e seria apresentado ao país como candidato, mesmo que continue preso até lá.

Na véspera da reunião de ontem, Paulo Câmara convidou quatro governadores petistas para jantar. Além das discussões sobre a eleição presidencial, o pernambucano também tratou da disputa local. Ele tenta fazer com que o PT retire a pré-candidatura de Marília Arraes.

Um acordo em Pernambuco pode servir como contrapartida para que o ex-prefeito de Belo Horizonte Márcio Lacerda (PSB) também saia da disputa pelo governo de Minas, facilitando o caminho para o atual governador Fernando Pimentel (PT), um dos presentes ao jantar em Recife, na sua tentativa de se reeleger.

A cúpula do PT tenta vincular uma aliança com o PSB em Pernambuco a um apoio do partido à candidatura de Lula. Mas os socialistas descartam essa hipótese. No momento, trabalham para acertar as alianças estaduais e empurram a decisão sobre a disputa presidencial para o mês que vem.

Além de quatro governadores petistas, o encontro teve também dois representantes do PSB (Câmara e Ricardo Coutinho, da Paraíba) e um governador de um partido da base aliada do governo federal (Robinson Faria, do PSD).

O governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), chegou a ir a Recife para uma conversa prévia realizada pelos colegas, mas deixou o estado antes da reunião formal que aprovou a carta. Os representantes do Nordeste disseram que a região é que a mais tem sofrido com a crise.

Na texto divulgado ontem, os governadores chegaram a dizer que uma medida da gestão Temer tem “espírito antirrepublicano”. As mudanças na metodologia do governo para conceder crédito aos estados causou desconforto entre eles. “Esse fato — aliado à declaração do ministro da Secretaria de Governo de que a concessão dos financiamentos ficaria limitada, tão somente aos aliados do governo central — denota o espírito antirrepublicano e afronta o princípio do equilíbrio federativo", diz a carta de Recife.

Em outro ponto, os governadores atacam o desemprego: “O Nordeste concentra o maior contingente dos 13,7 milhões de desempregados brasileiros, aliando-se a isso, o severo corte em programas sociais — notadamente o Bolsa Família — o que fez aumentar a desigualdade”.

A gestão Temer também é acusada de não ter sensibilidade social ao realizar os ajustes. “Não podemos aceitar que a insensibilidade social leve a grande parcela dos mais pobres pagar a conta do necessário ajuste das contas públicas.”

A proposta de privatização da Eletrobras foi duramente atacada pelos governadores nordestinos. “Preocupa-nos, sobremodo, o projeto de privatização da Eletrobras e, em particular, o da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf ), que, em se concretizando, viria a submeter um ativo do povo da região aos interesses dos investidores".