O globo, n. 30978, 31/05/2018. Artigos, p. 15

 

Concorrência leal

Gesner Oliveira

31/05/2018

 

 

É notável que o custo de capital ainda seja alto para empresas nacionais

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima crescimento de 3,7% ao ano no consumo de energia elétrica até 2026 no Brasil. Para fazer frente a tal expansão, é crucial promover uma agenda com mais concorrência e menos concentração de mercado no setor.

Em primeiro lugar, é fundamental que os processos concorrenciais ocorram em condições isonômicas. As regras das licitações e dos leilões no setor elétrico devem deixar os competidores nacionais e estrangeiros em condições de igualdade, por exemplo, no que diz respeito às garantias de contratos e seguros. Nessa linha, a existência de mecanismos que evitem uma concorrência desleal por conta de subsídios de governos a empresas estatais estrangeiras é primordial, uma vez que este subsídio fere as normas básicas do regime da Organização Mundial do Comércio.

Em segundo lugar, é notável que o custo de capital ainda seja alto para empresas nacionais. Como o risco Brasil está elevado, e é determinante para o risco de crédito da empresa, as companhias nacionais partem na competição em clara desvantagem quando precisam tomar empréstimos em bancos no país ou em emissões a mercado.

Com o diferencial entre juros locais e os praticados nos EUA, Europa e Ásia, verificou-se um expressivo aumento na participação de empresas estrangeiras no setor. Desde 2016, tanto em geração quanto em transmissão, as empresas estrangeiras ficaram com cerca de 50% dos valores negociados nos leilões. No mesmo período, foram realizadas mais de 15 fusões e aquisições, sendo que, em 95% dos casos, considerando o valor das empresas, o comprador era de origem estrangeira.

Uma agenda para a redução do custo de capital exige a promoção de um ambiente macroeconômico e regulatório estável. Com isso, os concorrentes nacionais poderão ser mais competitivos nas futuras disputas, beneficiando o consumidor.

Em terceiro lugar, existe uma tendência de concentração do setor elétrico. As quatro maiores empresas (C4) respondem por aproximadamente 85% do mercado na transmissão, 55% na distribuição e 45% na geração. Neste contexto, chama a atenção o leilão de venda da distribuidora Eletropaulo, programado pela B3 para segunda-feira, e que promete alterar ainda mais o cenário de concentração do setor. Com o leilão, o C4 da distribuição deve aumentar para 65%.

Os efeitos maléficos da concentração são conhecidos: com maior poder de mercado, as empresas podem estrangular fornecedores, reduzir a competição no mercado e diminuir a disputa em novas licitações. É necessário que se avalie, caso a caso, os impactos dos aumentos da conceração para preservar a concorrência.

Por fim, é importante aprimorar o ambiente de negócios, de modo a garantir que não ocorra uma concorrência desleal e que se evite uma concentração demasiada de mercado. Os resultados dessas medidas, finalmente, contribuem para aprimorar o nível da prestação de serviços de energia elétrica e aumentar a eficiência global das empresas.

Gesner Oliveira é professor da FGV-SP e foi presidente da Sabesp e do Cade