O globo, n. 30977, 30/05/2018. País, p. 3

 

No STF o oprimido condenado

Carolina Brígido

30/05/2018

 

 

Por unanimidade, 2ª Turma sentencia Meurer por corrupção passiva e lavagem de dinheiro

-BRASÍLIA- A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou ontem por corrupção passiva e lavagem de dinheiro o deputado Nelson Meurer (PP-PR), o primeiro réu da Lava-Jato julgado pela Corte. A decisão foi unânime. O parlamentar será punido pelo recebimento de propina em troca do apoio à nomeação e à permanência de Paulo Roberto Costa na Diretoria de Abastecimento da Petrobras.

No julgamento, Meurer foi absolvido de uma parte do crime de corrupção: o recebimento de R$ 500 mil em doação eleitoral. Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), a doação era propina disfarçada. Mas três dos cinco ministros entenderam que, no caso de Meurer, uma doação declarada à Justiça Eleitoral não pode ser considerada propina. Para eles, não havia prova de que o deputado fez um favor específico em troca do dinheiro. Esse entendimento deve orientar a análise de outras ações da Lava-Jato.

Os ministros definiram a pena de 13 anos, nove meses e dez dias de prisão, em regime inicialmente fechado. O parlamentar terá de pagar multa no valor de R$ 322 mil, corrigidos desde 2014. Ele também perderá os bens que foram alvo de lavagem de dinheiro, em valores não divulgados pelo tribunal. Meurer ainda ficará impedido de exercer cargo ou função pública. As penas não são de efeito imediato: começam a ser cumpridas somente depois de julgados os recursos aos quais os réus têm direito.

Meurer não perderá o mandato de deputado automaticamente. Embora não seja possível exercer a atividade parlamentar em regime prisional fechado, o STF determinou que a Câmara dos Deputados dê a última palavra sobre o assunto. A Casa decidirá depois dos recursos.

Os dois filhos do deputado também foram condenados por corrupção passiva, mas absolvidos da acusação de lavagem de dinheiro. Eles teriam recebido parte do dinheiro da corrupção em nome do pai. Nelson Meurer Junior foi condenado a quatro anos, nove meses e 18 dias de prisão, em regime semiaberto. Ele terá de pagar multa no valor de R$ 56 mil, corrigidos desde 2014. Cristiano Meurer foi condenado a três anos e quatro meses de prisão. No entanto, houve extinção da punibilidade e ele não será preso.

No processo, a Petrobras pediu que os réus fossem condenados a pagar pelo menos R$ 34,2 milhões à estatal. Esse foi o valor supostamente desviado da empresa que foi para os bolsos do parlamentar e sua família. A Segunda Turma determinou a indenização de R$ 5 milhões à Petrobras.

O relator do processo, ministro Edson Fachin, defendeu que os réus pagassem outros R$ 5 milhões aos cofres públicos a título de dano moral coletivo. Mas a maioria foi contra a medida. Para os ministros, esse valor só poderia ser apurado em uma ação civil, e não criminal.

 

GLEISI, AÉCIO, COLLOR E JUCÁ NA FILA DO SUPREMO

Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), Meurer recebeu, periodicamente, propina da ordem de R$ 29,7 milhões. Também teria recebido R$ 4 milhões não contabilizados, em espécie, para financiar campanha eleitoral. E, por fim, R$ 500 mil da Queiroz Galvão a título de doação, mas em valores declarados à Justiça Eleitoral.

Os ministros concordaram que parte dos R$ 29,7 milhões supostamente pagos a Meurer foram comprovados. Foram considerados crimes apenas o dinheiro rastreado em quebras de sigilo bancário, que mostraram os depósitos em datas compatíveis com as ditas pelos delatores. No entanto, segundo os ministros, a PGR não conseguiu comprovar o recebimento de uma parte desses recursos pagos em espécie. A Segunda Turma também declarou que não há prova de que Meurer recebeu R$ 4 milhões em espécie.

De acordo com a defesa, os R$ 500 mil não podem ser considerados corrupção porque foram registrados na Justiça Eleitoral como doação de campanha. Para Edson Fachin e Celso de Mello, o revisor do processo, a declaração do valor não isenta o réu do crime de corrupção.

Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski discordaram. Eles ponderaram que a doação foi declarada à Justiça Eleitoral pela empresa doadora e também por Meurer. Segundo eles, não há prova de que o dinheiro era proveniente de atividade ilícita, já que a Queiroz Galvão tinha faturamento também proveniente de serviços prestados de forma legítima.

Toffoli e Gilmar até admitiram que, em tese, a corrupção possa ser escondida em doação. No entanto, eles argumentarem que, no caso de Meurer, não ficou comprovado que ele teria feito algo em troca da contribuição da Queiroz Galvão.

O STF ainda vai se debruçar sobre outros réus políticos envolvidos na Lava-Jato. A presidente do PT, Senadora Gleisi Hoffmann (PR) é ré por corrupção e lavagem de dinheiro da da Petrobras. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) também é réu. Ele responde por corrupção passiva e obstrução da Justiça no caso dos R$ 2 milhões pedidos ao empresário Joesley Batista. O ex-presidente e senador Fernando Collor (PTC-AL) é acusado de crimes como lavagem de dinheiro e organização criminosa por supostas propinas da BR Distribuidora. Presidente do PMDB, o senador Romero Jucá (RO), por sua vez, foi o primeiro político denunciado como consequência da delação da Odebrecht. Ele é acusado de receber propina para favorecer a construtora no Congresso.