Correio braziliense, n. 20142, 15/07/2018. Política, p. 2

 

Mata-mata no campo eleitoral

Deborah Fortuna

15/07/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Com alianças ainda abertas, pré-candidatos iniciam torneio eliminatório para ganhar apoios e isolar adversários. A principal dificuldade das agremiações está nos políticos do mesmo time ideológico, capazes de atrapalhar jogos ainda no início

Longe dos campos de futebol, os pré-candidatos à Presidência da República começam as eliminatórias para apresentar as estratégias das eleições 2018. A partida final é em outubro, mas o mata-mata começa nesta semana. É a partir de 20 de julho que os partidos definem as escalações e selecionam os jogadores para as urnas. Os campeonatos estaduais, no entanto, podem mudar as táticas e interferir nas candidaturas nacionais.

Hoje, o fim da Copa do Mundo marca o início de uma outra disputa no Brasil: a pelo mais alto cargo do Executivo. A dificuldade, neste momento, é a divisão de partidos entre os grupos ideológicos. A guerra entre PT e PDT em busca da aliança com o PSB é tão ou mais explosiva do que as alianças do campo de centro-direita, que abrange Henrique Meirelles (MDB), Álvaro Dias (Podemos) e Geraldo Alckmin (PSDB). Enquanto isso, Marina Silva (Rede) e Jair Bolsonaro (PSL) correm por fora e tentam voos solo.

Com o cenário polarizado, os palanques estaduais ganham protagonismo nas eleições. O problema é que as alianças locais podem interferir no cenário nacional. “A construção das alianças ainda não está muito bem evidente. O Alckmin, por exemplo, tenta costurar vários partidos. Mas, no Nordeste, o PSDB tem maior dificuldade de formar alianças do que o PT. Ciro, por sua vez, tenta trazer para ele os partidos de esquerda, mas, a depender de quem Lula indicará (para o vice na chapa, que deve o substituir no futuro), o PT volta a ter mais força de coligações”, comentou o cientista político Rodrigo Prando.

Embora tenha avançado nas alianças nacionais, Alckmin tem um longo caminho até fechar todos os acordos nacionais de que necessita para disputar o pleito com mais tranquilidade. O PV, por exemplo, prometeu apoio no âmbito presidencial. Nos estados, entretanto, a conversa é outra. Segundo representantes do PV, os palanques em São Paulo serão divididos com Márcio França (PSB), atual governador no estado.

Acordos

O problema dessas alianças é que, segundo Prando, é difícil encontrar partidos que tenham similaridade do campo ideológico e pragmático para que os acordos sejam feitos. “No quadro eleitoral de 2018, que tem essa característica de multiplicidade de candidatos à Presidência, é importante lembrar que quem luta pelos presidenciáveis são deputados, prefeitos, vereadores que estão nos estados. Por isso é tão importante a coligação dessas alianças”, explicou.

Sem o ministro Joaquim Barbosa para o Planalto, o PSB se tornou a maior incógnita das eleições. Disputada, a sigla tem dificuldades de fechar acordos nacionais por causa dos estados. O principal prejudicado é o pré-candidato Ciro Gomes, que tenta, a todo custo, conseguir apoio dos partidos de centro-esquerda e esquerda. Em Pernambuco, o candidato à reeleição ao governo Paulo Câmara (PSB) flerta com o PT, mesmo que a rival, Marília Arraes, seja petista. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), esteve com Câmara na última quinta-feira. A ideia é que o PT, mesmo sem Lula, continue com força no Nordeste para conseguir firmar coligações.

Outro impasse que Ciro enfrenta com o PSB é em São Paulo. Márcio França acena para Geraldo Alckmin (PSDB), com quem dividiu o governo do estado. Para o analista político Creomar Souza, “mesmo que haja uma aliança nacional do PSB com Ciro Gomes, essa aliança não vai se manifestar de uma maneira prática em São Paulo. França deixou claro, mais de uma vez, que Alckmin terá palanque no estado. Nacionalmente, PSB pode até estar com Ciro, mas, oficialmente, o candidato do governo será o tucano”, avaliou.

A partir da próxima sexta-feira, o calendário eleitoral permite a realização das convenções partidárias. As reuniões discutirão as coligações e vão escolher os candidatos das legendas, entre eles, os que disputarão a presidência e a vice-Presidência da República. Com o período de campanha encurtado pela metade, seria de se esperar que os partidos já estivessem certos sobre os nomes que disputarão todos os cargos, mas essa é outra particularidade das eleições deste ano. Até o momento, ainda não há definição sobre coligações ou vice-representantes e a maioria das legendas deve se reunir apenas no fim do prazo dado pela Justiça Eleitoral, de 5 de agosto.

Já para Creomar Souza, os problemas têm começado porque os pré-candidatos têm começado a enfrentar um “choque de realidade”. Com os custos das campanhas, é provável que os blocos, como Centrão, se unam a pré-candidatos com mais tempo de TV, ou com mais dinheiro do fundo partidário. “Nesse aspecto, o Alckmin é melhor do que Bolsonaro, já que ele tem uma estrutura partidária que irá, de fato, atrair alianças. O que os candidatos dos estados precisam? Precisam de candidatos fortes ao Planalto que deem visibilidade à corrida eleitoral”, comentou Creomar.

Bolsonaro enfrenta um problema sem o apoio de Magno Malta (PR). Com o recuo da aliança, a tendência é de que o ex-militar possa ficar sem apoio e ir sozinho para a disputa. Além disso, um correligionário contou ao Correio que Henrique Meirelles (MDB) cresce nos estados. Isso teria se confirmado com o aumento da adesão dele dentro da própria sigla. “Paraná, Pernambuco, Alagoas, Ceará e Sergipe ainda não estão fechados. Apenas Pernambuco que é realmente contra Meirelles, porque o deputado federal Jarbas Vasconcelos (MDB) quer uma aliança com o Alckmin”, comentou.

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A hora do funil

Luiz Carlos Azedo

15/07/2018

 

 

A 20 dias do final do prazo para registro de candidaturas, a realidade eleitoral se impõe aos pré-candidatos em todos os níveis. É um funil, do qual ninguém escapa, porque a campanha deixará de ser virtual para se tornar analógica a partir do horário eleitoral. A grande interrogação é o peso das redes sociais e da inércia da pré-campanha na disputa propriamente dita. É aí que veremos se a nossa democracia representativa é robusta o suficiente para impor a lógica dos partidos políticos, com suas coligações, ou será surpreendida, sobretudo nas eleições majoritárias, pela força dos movimentos que contestam o stablishment.

Os candidatos de mentirinha, como os outsider, estão saindo da disputa, como o dono das Lojas Riachuelo, Flávio Rocha (PRB). Antes deles, com mais sucesso nas pesquisas, despontaram e desistiram João Dória, Rodrigo Maia, Luciano Huck e Joaquim Barbosa. Ainda resistem Henrique Meirelles (PMDB), Afif Domingos (PSD) e Paulo Rabelo de Castro (PSC), mas também sofrem fortes pressões para que desistam. João Amoedo, do Novo, também não consegue emplacar. Os candidatos que estão na boca do funil são figuras carimbadas da política brasileira: Jair Bolsonaro (PSL), com, 19%; Marina Silva, com 15%; Ciro Gomes, com 12%; Geraldo Alckmin, com 7%; e Álvaro Dias, com 4% nas pesquisas de intenção de voto.

Entre esses nomes, será escolhido o novo presidente da República? Provavelmente, mas não se pode descartar o candidato do PT, que ainda está indefinido; o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso, aparece com 34% de intenções de voto nas pesquisas. Nove entre 10 petistas admitem que o candidato da legenda será o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, mas a candidatura de Lula está sendo mantida para ocupar espaços e favorecer os demais candidatos da legenda. Ninguém sabe qual será a sua real capacidade de transferência de votos da prisão, porém, até mesmo os adversários trabalham com a hipótese de enfrentar Haddad no segundo turno.

A tática petista merece contextualização: sustenta-se na dupla narrativa do “golpe” contra Dilma Rousseff, que foi afastada do poder com base na Constituição, e da vitimização de Lula, que está preso por receber vantagens indevidas na Presidência, mas é tratado pelos petistas como preso político. A manobra funcionou para tirar a militância petista da depressão moral e dotar o partido de um discurso contra a Operação Lava-Jato. Entretanto, ao apostar na desmoralização do Judiciário, essa tática tem um viés antidemocrático que remonta à velha dicotomia “justiça burguesa” versus “justiça popular”. Foi essa concepção “revolucionária” que justificou os processos de Moscou e o “paredón” da revolução cubana.

Voltemos ao funil: Bolsonaro e Marina Silva lideram a campanha porque estão no mano a mano com os demais candidatos nas redes sociais. Quando começar a campanha analógica, isto é, os programas e inserções na tevê aberta e no rádio, podem ser volatilizados, a não ser que consigam mais tempo de televisão por meio de coligações. Nesse aspecto, Bolsonaro leva certa vantagem em relação a Marina, porque há uma deriva conservadora em sua direção. Álvaro Dias (Podemos) está numa situação semelhante, com a desvantagem de não contar com a mesma força de inércia nas redes sociais. Restam Ciro Gomes e Alckmin, que disputam apoio dos partidos do chamado Centrão. O primeiro está levando vantagem na disputa pelo apoio do PSB e do DEM, porém, o ex-governador paulista já contaria com um quinto do tempo de televisão e de rádio graças à coligação do PSDB com outros partidos.

Balança

Haverá um duelo entre as redes sociais e as emissoras de tevê e rádio na campanha eleitoral, cujo resultado pode alterar completamente o cenário descrito acima com duas semanas de campanha eleitoral. Dificilmente teremos uma disputa entre Bolsonaro e Marina na reta final, a não ser que a ex-senadora saia do isolamento. O ex-capitão do Exército também não terá vida fácil. Tanto Alckmin como Ciro estão de olho nos seus votos e apostam na campanha analógica. Especialistas acreditam que haverá saturação de propaganda nas redes sociais, a começar pelo Facebook, que já está orientando os partidos sobre como proceder legalmente para “impulsionar” seus posts nas redes. Ou seja, propaganda paga.

Em tese, o cenário eleitoral é desfavorável aos políticos com mandato, que estão sendo responsabilizados nas redes sociais pela crise fiscal, a violência, a desagregação das famílias, a má qualidade dos serviços públicos etc. Os partidos estão com o filme queimado, mas a reforma política foi feita para fortalecê-los institucionalmente e salvar a elite política do ostracismo. Vamos ver quem vai passar pelo funil.