Correio braziliense, n. 20138, 11/07/2018. Opinião, p. 11

 

Supremo digital

Joaquim Falcão

11/07/2018

 

 

Três boas iniciativas nesses últimos dias sobre a disposição do Judiciário em acelerar o uso da tecnologia para acelerar sua eficiência decisória. Uma foi do Superior Tribunal de Justiça (STJ) com a implantação, desde agora, do Projeto C927, que visa agrupar precedentes em função do artigo da Constituição ou lei a que se referem, e duas, do Supremo. A análise externa por entidade independente de seu sistema de distribuição de processos, e o desenvolvimento de um projeto denominado Victor para dar eficácia à sumula vinculante, que foi criada pela Emenda Constitucional 45, em 2004, mas até agora pouco ou quase nenhum efeito teve na redução e agilização dos milhares de processos que continuam a chegar ao Supremo — aos borbotões.

Quando morreu tragicamente Teori Zavascki, o país parou, aguardando a distribuição dos processos da Lava-Jato para um novo relator. Parou olhando, mas não vendo, como a distribuição eletrônica escolheria o novo relator. Respirou-se, aliviadamente, com a escolha de Edson Fachin. Existia um receio nacional de que a distribuição eletrônica pudesse de algum modo ser parcial, algoritmos operam com base em critérios e os resultados podem não ser os esperados. Podia haver um comum, mas decisivo, erro de aplicação. Pior: como não se conhece o código-fonte, o software que determina a distribuição dos processos poderia estar sendo manipulado.

Ao contratar uma instituição acadêmica acreditada para fazer uma fiscalização do sistema de distribuição, o Supremo dá um passo para diminuir essa ameaça de erro ou manipulação. Não tranquiliza por completo, pois só a abertura do código-fonte faz a sociedade realmente participante e fiscal e construtor da independência do Supremo. Brasil 100% tranquilo. Aliás, desde setembro de 2017, passeia pelo Congresso o Projeto nº 8.503/2017, que obriga as instituições judiciárias, inclusive o Supremo, a abrir seus códigos-fonte, o que ocorrerá mais dia menos dia, pois a transparência e o controle digital pela sociedade da governança do setor público é uma ideia cujo seu tempo chegou. Poderosa.

Atualmente, com a politização do Supremo e a judicialização da política, a distribuição de um processo — se vai para este ou aquele ministro — é quase um determinante da decisão. A segunda inciativa digital do Supremo foi criar o programa Victor, a ser desenvolvido pela Universidade de Brasília (UnB), instituição que tem toda a seriedade e expertise para tanto. Seu objetivo é criar softwares que ajudem a implantar de vez a súmula vinculante, identificando os milhares de processos que, ao chegarem ao Supremo, teriam seu juízo de admissibilidade logo identificado e, portanto, aceitos ou não para julgamento. Conforme se enquadrem ou não nas súmulas vinculantes já estabelecidas.

Separa-se, de imediato, o joio do trigo. Esse projeto vai demorar. Necessário seria implementar desde logo a proposta de Luiz Roberto Barroso de alteração do regimento para agilizar a súmula. No início do ano, o Supremo tinha 298 processos para julgar com efeitos vinculantes. Ou seja, há uma fila de processos que só para ser julgada levaria oito anos. E o Supremo continua aumentando essa lista.

Barroso propõe que não se ofereça como súmula vinculante provável mais de 20 processos por semestre. Preanunciados, incluídos na pauta com antecedência de pelo menos um semestre, os ministros poderiam bem estudá-los, e nada de pedido de vista. Sem essa mudança regimental, todo o esforço que vier a ser desenvolvido por este novo projeto Victor será inútil. Os dois são complementares. Sem o do Barroso, o Victor não funcionará. O Supremo revela uma nova disposição. Bem-vinda.