O globo, n. 30975, 25/05/2018. País, p. 3

 

Sinal verde para delação

Bela Megale e Aguirre Talento

28/05/2018

 

 

Empresário Léo Pinheiro, da OAS, tem aval da PGR, e colaboração atinge 14 políticos

Mais de dois anos após começar a negociar seu acordo de delação premiada com a Lava-Jato, o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, preso em Curitiba desde setembro de 2016, finalmente obteve o aval da Procuradoria-Geral da República e está fechando os últimos detalhes da sua proposta. Após o sinal verde da procuradora-geral, Raquel Dodge, os temas e as minúcias jurídicas do acordo estão sendo acertados com a equipe da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba. Até o momento, a delação inclui uma lista de aproximadamente 60 anexos à qual O GLOBO teve acesso. Os documentos envolvem ao menos 14 políticos do MDB, PSDB, PT, PP e DEM, pagamentos de propina em obras feitas pela empreiteira em 11 estados brasileiros e operações ilícitas em cinco países da América Latina, além de repasses de caixa dois para campanhas eleitorais.

Entre os delatados por Pinheiro está um dos principais pré-candidatos ao governo do Rio de Janeiro, o ex-prefeito Eduardo Paes, que deverá concorrer ao cargo pelo DEM. O empreiteiro conta que Paes recebeu repasses via caixa dois para sua campanha à prefeitura em 2012. A empresa tinha a expectativa de ser favorecida em obras na capital fluminense. Pinheiro também relatou o pagamento de propina ao ex-secretário de Obras de Paes, Alexandre Pinto, preso desde janeiro pela Lava-Jato no Rio, e a integrantes do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Segundo o executivo, tanto o exsecretário municipal quanto integrantes do TCE cobravam um percentual sobre contratos de obras. Entre elas, estão o corredor de ônibus BRT Transcarioca e do programa Asfalto Liso, executado pela Odebrecht e OAS e que previa a recuperação de 700 quilômetros de vias da cidade. A obra do governo do estado do teleférico do Morro da Providência, hoje parado, também foi citada. Pinheiro relata que todas as construções executadas pela OAS no Rio de Janeiro estiveram vinculadas a pagamentos de propina ou caixa dois.

 

OPERAÇÃO COM BANCO BVA

Procurado pelo GLOBO, Paes disse que as contas de sua campanha foram devidamente declaradas na Justiça Eleitoral e destacou que “jamais favoreceu ou exigiu contrapartida, de qualquer natureza, de quem quer que seja, conforme evidenciam os diversos depoimentos já prestados por colaboradores, nas mais diversas delações premiadas feitas por inúmeros executivos das maiores empreiteiras brasileiras, inclusive da própria OAS”. Enfatizou ainda que executivos de diversas empresas, inclusive da OAS, “foram categóricos em afirmar que Eduardo Paes jamais negociou contrapartidas ou fez parte de qualquer esquema de corrupção” em depoimentos anteriores ao MPF.

Desde que as denúncias da operação LavaJato fluminense vieram a público, Pinto e os integrantes do TCE também têm negado relação com o recebimento de propinas. Expresidente do tribunal, Jonas Lopes de Carvalho, no entanto, tornou-se delator e confirmou os esquemas dentro da corte relacionados às obras públicas no estado.

Os comprovantes e detalhes dos repasses para autoridades do Rio foram contados pelos integrantes da área que fazia os pagamentos de propina e caixa dois da OAS. Oito ex-funcionários da empresa que trabalhavam no setor já assinaram acordos de delação com a PGR, que aguardam homologação do relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Edson Fachin. Esse grupo entregou documentos e registros da área que mostram pagamentos de caixa dois e propina de 2010 a novembro de 2014, quando Pinheiro foi preso pela primeira vez. Ele está detido, pela segunda vez, desde setembro de 2016, e já foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.

Há ainda um tópico na delação dos executivos da OAS focado em uma operação realizada com o banco BVA para mascarar o pagamento de propina a políticos do MDB do Rio de Janeiro. O banco já havia sido citado na 41ª fase da Operação Lava-Jato, em maio do ano passado, quando José Augusto Ferreira dos Santos, fundador e ex-controlador da instituição, foi preso.

Os relatos e documentos dos delatores da área de propina da empresa corroboraram a delação de Pinheiro. O escopo dos assuntos que farão parte do acordo, porém, ainda não foi totalmente fechado. Um dos temas que ainda está na mesa, mas para o qual ainda não foi batido o martelo, segundo integrantes da negociação, são acusações envolvendo ministros de tribunais superiores.

Nos últimos meses, o principal entrave para que Léo Pinheiro finalmente assinasse o seu acordo foi a tentativa de incluir os irmãos Cesar Mata Pires Filho e Antônio Carlos Mata Pires, acionistas majoritários da OAS, como delatores. A PGR e a força-tarefa, porém, não aceitaram, e as tratativas evoluíram apenas com Pinheiro. Atualmente, o empreiteiro e sua família vivem de uma espécie de mesada paga pelos irmãos Mata Pires que gira em torno de R$ 500 mil mensais.

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Propina e caixa dois para erguer Belo Monte e sede do governo de Minas

28/05/2018

 

 

Executivo implica políticos do PT, PSDB e PMDB em proposta de acordo

 O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro detalhou o pagamento de propina a operadores indicados por políticos e caixa dois para campanhas eleitorais em troca da participação da empreiteira em grandes obras, como a hidrelétrica de Belo Monte e a construção da Cidade Administrativa, que virou sede do governo de Minas Gerais. O leilão para a construção da usina ocorreu no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), enquanto o empreendimento em Minas saiu do papel na gestão de Aécio Neves (PSDB), hoje senador.

Na proposta de delação premiada, o executivo afirmou também que houve pagamentos ilícitos relacionados às obras da transposição do Rio São Francisco e da Arena das Dunas, no Rio Grande do Norte, além de empreendimentos da Petrobras nos quais a OAS estava envolvida.

Sobre Aécio, Pinheiro contou que pagou propina para Oswaldo Borges da Costa Filho, apontado como um dos operadores do tucano e tesoureiro informal de suas campanhas entre 2002 e 2014. A OAS construiu, com a Odebrecht e a Queiroz Galvão, o Edifício Gerais, parte da Cidade Administrativa. No consórcio a Odebrecht era a líder, com 60% do montante, enquanto a OAS tinha 25,71%, e a Queiroz Galvão, 14,25%. Como a OAS recebeu cerca de R$ 102 milhões no contrato, a propina paga é estimada em cerca de R$ 3 milhões. Os delatores da área de pagamentos ilícitos da OAS deram detalhes de endereços e datas das entregas de dinheiro vinculadas a Oswaldo Borges.

Pinheiro relatou ainda pagamentos ilegais ao senador José Serra (PSDB-SP). O executivo disse que foram feitos repasses ligados às obras do Rodoanel da Rodovia Carvalho Pinto para abastecer o caixa dois de campanhas do PSDB, entre elas a de 2006, na qual Serra concorreu ao governo de São Paulo.

Outros acusados de receber caixa dois são a ex-presidente Dilma Rousseff, o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), alvo de quatro denúncias e três inquéritos, o governador do Rio, Fernando Pezão (PMDB), e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). O ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), também é acusado de receber recursos ilícitos. Ainda fazem parte do material entregue à ProcuradoriaGeral da República (PGR) as provas apresentadas por Pinheiro e os relatos dele que foram usados na denúncia do caso do tríplex em Guarujá (SP), que levou Lula à prisão.

Pinheiro detalhou ainda esquemas ilegais em pelo menos cinco países da América Latina. As negociatas, segundo ele, vão de pagamento de propina a agentes públicos, como no caso de Equador, Peru e Trinidad e Tobago, a financiamento irregular de campanhas no Chile e na Guatemala. Pinheiro contou também que havia um esquema para gerar dinheiro com o objetivo de cobrir os pagamentos de propina e caixa dois no exterior por meio de um consultor do Uruguai chamado Fernando Belhot.

 

ACUSADOS SE DEFENDEM

A assessoria de imprensa de Dilma afirmou que “Léo Pinheiro mente” e que a campanha da petista jamais se beneficiou de caixa dois proveniente da OAS e de outras empresas. Eugênio Pacelli, advogado do governador Fernando Pimentel, disse que “alguns colaboradores se veem na contingência de criar histórias para persecuções e que este é mais um caso desses”. A assessoria de imprensa de Pezão afirmou que todas as doações para a campanha que o elegeu foram feitas em conformidade com a Justiça Eleitoral.

A defesa de Aloysio Nunes disse que não se pronunciaria sobre “hipóteses”, e a de Serra preferiu não se manifestar. Alberto Toron, advogado de Aécio, enfatizou que a acusação é “falsa”, que as obras da Cidade Administrativa foram auditadas por uma empresa independente e que a investigação conduzida pelo Ministério Público decidiu pelo arquivamento das denúncias. O criminalista Rodrigo Mudrovitsch, que representa Lindbergh, relatou que “desconhece” a afirmação de caixa dois e “nega a sua veracidade”. A defesa de Lula foi procurada, mas não retornou.