O globo, n. 30975, 28/05/2018. Economia, p. 17

 

Ainda mais concessões

Manoel Ventura e Cristiane Jungblut

28/05/2018

 

 

Governo congela preço do diesel por 60 dias e promete medidas provisórias para caminhoneiros

No sétimo dia de paralisação dos caminhoneiros, o governo decidiu ceder ainda mais aos pedidos da categoria. Após reunião realizada no Palácio do Planalto com caminhoneiros, o presidente Michel Temer anunciou uma redução no preço do diesel de R$ 0,46 por litro na bomba e que o preço do produto seguirá congelado por 60 dias, o dobro do prazo previsto no acordo anunciado na última quinta-feira, que não surtiu efeito. Numa nova tentativa de encerrar a greve, Temer anunciou que serão editadas três medidas provisórias (MPs), o que garante a entrada em vigor em caráter imediato.

— Nós fizemos nossa parte para perdoar problemas e sofrimentos. As medidas que acabo de anunciar, repito, atendem a praticamente todas as reivindicações que nos foram apresentadas. Por isso eu quero manifestar a minha plena confiança, a confiança do governo num espírito natural de responsabilidade, de solidariedade e de patriotismo de cada um daqueles caminhoneiros que servem ao nosso país — disse Temer.

A nova tentativa visa a evitar que o país inicie uma segunda semana com sinais de desabastecimento e falta de serviços, como transporte público.

 

IMPACTO DE R$ 10 BILHÕES PARA O GOVERNO

Durante o discurso do presidente, houve panelaços e gritos de “Fora, Temer” em vários estados do país.

Para chegar a uma redução de preço de R$ 0,46 por litro, o governo vai reduzir o PIS/Cofins e a Cide. Será criado um crédito extraordinário para criar um desconto de valor equivalente a anular os dois tributos, uma reivindicação dos caminhoneiros. Além disso, a conta inclui ainda o esforço de redução de preço da Petrobras, que será compensada pelo período de 60 dias de congelamento. Depois deste prazo, os reajustes do produto passarão a ser mensais.

Segundo o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, o conjunto de medidas adotadas pelo governo terá impacto de R$ 10 bilhões nos cofres públicos. Como o desconto no preço do diesel será obtido por meio de crédito extraordinário, a despesa não entra nos limites estabelecidos pela regra do teto de gastos (pela qual as despesas federais só podem aumentar até a inflação do ano anterior). Mesmo assim, o governo terá que cortar despesas para conseguir compensar o subsídio, de modo a cumprir a meta fiscal. A fonte dos recursos será detalhada hoje pelo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. Caso o Congresso insista em zerar o PIS/Cofins, o impacto, porém, poderia ser ainda maior.

— Nós cedemos, compreendemos, entendemos o pleito da sociedade — disse Marun.

O pacote tem outras medidas. Uma medida provisória vai determinar a suspensão da cobrança do eixo suspenso para caminhões em todas as rodovias. Atualmente, a regra tem sido aplicada apenas em rodovias federais.

O governo incluiu uma medida para estabelecer uma tabela mínima para o do frete, assunto que vinha sendo debatido no Congresso. Além disso, uma MP vai reservar 30% dos fretes da Conab para caminhoneiros autônomos. A decisão de enviar tudo por MP, que tem força de lei, ocorre porque as lideranças do movimento disseram que só sairão das ruas com medidas no papel. Não haverá reoneração de folha de pagamento no setor de transporte de carga.

Temer confirmou que as medidas do acordo frustrado, anunciado quinta-feira, continuam válidas.

O presidente da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), José da Fonseca Lopes, disse que as medidas anunciadas pelo presidente Michel Temer para acabar com a paralisação atendem às reivindicações da categoria. Ele pediu para os motoristas deixarem os acampamentos e voltarem ao trabalho.

— Foi o melhor para o caminhoneiro. Peço aos motoristas que levantem acampamento e sigam a vida — disse Fonseca, em entrevista na porta do Palácio do Planalto.

O presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Diumar Bueno, afirmou na ontem que os três pontos propostos pelo governo atendem às reivindicações feitas pela categoria, mas disse que não pode garantir que a greve vai terminar:

— (O fim das mobilizações) vai depender da base. Foi a categoria de forma independente que estabeleceu o movimento e tem a competência de avaliar as propostas do governo e entender se é hora de desmobilização ou não — disse, destacando que os caminhoneiros foram avisados por WhatsApp.

Integrantes do governo avaliam que os caminhoneiros que participaram da reunião de ontem vão orientar o fim da greve, especialmente em São Paulo, onde o governador Márcio Franca (PSB) puxou a negociação. São Paulo é o estado que mais perde com a isenção do pedágio para eixo suspenso. Segundo interlocutores do Planalto o fim da greve no estado ajudaria a quebrar o movimento.

O presidente do Congresso, senador Eunício Oliveira (MDB-CE) tem participado das negociações. Ontem, ele fez críticas à política de preços da Petrobras, que repassa ao consumidor as flutuações nas cotações do dólar e do petróleo. A Federação Única dos Petroleiros (FUP) convocou uma paralisação de 72 horas para quarta-feira. Eles também criticam a política adotada pela estatal.

 

IDAS E VINDAS

23 DE MAIO

Petrobras anuncia corte de 10% no preço do diesel e o congelamento do valor do combustível por 15 dias

24 DE MAIO

Governo anuncia acordo com líderes de caminhoneiros, comprometendo-se a congelar o preço do diesel da Petrobras por 30 dias. A União ressarcirá a estatal pela segunda quinzena de congelamento. O impacto dos primeiros 15 dias será arcado pela companhia. Também ficou acordado que os reajustes de preços dos combustíveis serão feitos uma vez por mês e que o governo compensará a Petrobras por eventuais perdas. A Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), que representa 700 mil caminhoneiros, rejeitou o acordo

25 DE MAIO

Apesar do acordo na véspera, muitos grevistas mantêm bloqueios nas estradas. Diante do quadro de desabastecimento, o governo anuncia que mobilizará as Forças Armadas para liberar as rodovias. O Senado adia a votação do projeto que zera o PIS/Cofins sobre o diesel para a semana que vem. O projeto havia sido aprovado na Câmara na véspera

26 DE MAIO

A PF abre 37 inquéritos para investigar apoio de empresários à greve. O governo do estado de São Paulo anuncia o fim da cobrança de pedágio por eixo suspenso nas rodovias paulistas, após reunião com caminhoneiros

ONTEM

Governo anuncia pacote de medidas provisórias para tentar encerrar a paralisação. Será reduzido em R$ 0,46 o preço

do litro do óleo diesel. Entre as medidas está a redução do PIS/Cofins sobre o combustível. Também estão no pacote o fim da cobrança de pedágio sobre o eixo suspenso dos caminhões e a proposta de preço mínimo do frete, além da atualização trimestral da tabela de referência para caminhoneiros autônomos