O globo, n. 30973, 26/05/2018. Economia, p. 25
Acordo vai onerar contribuintes e mudar regras de concessões
Bruno Rosa
26/05/2018
Ações prometidas pelo governo afetam ainda os fretes da Petrobras
O acordo firmado entre o governo e nove sindicatos e confederações de trabalhadores do setor de transporte, para tentar uma trégua na greve dos caminhoneiros, prevê medidas que vão onerar os contribuintes e iniciativas que mudam pontos sensíveis da regulação de estradas concedidas à iniciativa privada, alertam especialistas. Alguns tópicos tratam ainda da rotina da Petrobras na contratação de fretes. A principal queixa dos caminhoneiros é o custo do diesel, que subiu 15,45% nos últimos 12 meses, refletindo a alta do dólar e do petróleo. Veja os principais pontos acordados e suas possíveis consequências.
ALÍVIO TRIBUTÁRIO
O governo vai zerar a alíquota da Cide para o diesel em 2018. A Cide responde por cerca de 1% do preço do diesel vendido nas bombas. Com a medida, haverá uma renúncia fiscal de R$ 1 bilhão. O governo negociou com o Congresso a reoneração da folha de pagamento de 28 setores da economia para compensar a renúncia fiscal com a Cide. Mas a reoneração já era prevista antes para equilibrar as contas públicas. O governo prevê que este ano o país terá déficit de R$ 159 bilhões nas contas públicas. E o setor de transporte rodoviário de carga foi excluído do fim do alívio tributário sobre a folha de pagamentos. Os caminhoneiros também exigiam a redução em 50% do ICMS, tributo cobrado pelos governos estaduais. Alguns estados, como o Rio, anunciaram redução na alíquota. Segundo o governador Luiz Fernando Pezão, a alíquota será diminuída de 16% para 12%. Mas especialistas alertam que a medida pode agravar o rombo fiscal dos estados.
PREÇO DO DIESEL
A redução no preço do diesel de 10%, que a Petrobras havia anunciado por 15 dias, será estendida por um prazo adicional de 15 dias. E, a partir de agora, os reajustes dos preços do diesel serão feitos apenas uma vez por mês. O governo vai compensar a Petrobras por eventuais perdas, já que a política de preços da estatal prevê oscilações diárias. Essa compensação será feita com recursos do Orçamento, ou seja, com dinheiro do contribuinte, a um custo de R$ 4,9 bilhões.
PEDÁGIO
O governo federal vai negociar com os estados para não haver cobrança de pedágio sobre o chamado “eixo suspenso em caminhões vazios”. O acordo prevê que, se os governos estaduais não aderirem a essa prática, “a União adotará as medidas judiciais cabíveis”. Em nota divulgada na manhã de ontem, a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), que diz reunir 1 milhão de motoristas, afirmou que a cobrança do pedágio sobre o eixo suspenso ocorre nos estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Mato Grosso, Bahia, Pernambuco e Minas Gerais. Mas há muitas rodovias estaduais privatizadas nesses estados, e os contratos de concessão normalmente preveem que todos os eixos são cobrados no pedágio. Segundo especialistas, se os estados permitirem a isenção da cobrança sobre o eixo suspenso, será preciso repactuar os contratos com as concessionárias, o que deve levar a um aumento da tarifa para todos os usuários.
FRETES DA PETROBRAS
A Petrobras hoje só contrata caminhões com menos de cinco anos de fabricação para trafegar combustíveis. Mas o governo se comprometeu a solicitar à Petrobras que siga uma resolução da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que, na prática, segundo especialistas, libera o uso de caminhões mais antigos. O governo também afirma que vai “buscar junto à Petrobras” liberar o uso pela estatal de transportadores autônomos. Mas, atualmente, o regime de contratação da Petrobras impede o uso de autônomos. As regras da estatal visam a garantir a segurança no transporte de combustíveis.
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Greve coloca em risco mais de 1 bilhão de animais
Victor Calcagno
26/05/2018
Sem ração, aves e suínos devem morrer nos próximos dias
Um bilhão de aves e 20 milhões de suínos podem morrer nos próximos dias devido à falta de ração, em decorrência da greve dos caminhoneiros, informou ontem a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Bloqueios realizados por caminhoneiros que interrompem o transporte de ração e de animais vivos permaneceram ontem, apesar do acordo anunciado pelo governo e a categoria na quinta-feira. Segundo a Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o país deixou de exportar, ao longo dos últimos dias, 25 mil toneladas de carnes suína e de frango, o correspondente a cerca de US$ 60 milhões de dólares.
“A mortandade de animais é iminente, e há risco de canibalização”, alertou o comunicado da ABPA. O número de unidades cuja atividade foi suspensa aumentou de 129 para 152 na quarta. “A situação é caótica. Empresas poderão fechar pelos prejuízos causados pela paralisação”, afirmou a entidade.
Nas granjas, relatos de canibalismo entre aves alertaram para a situação de carência de alimentos na produção. Além disso, os animais, que não seguiam para o abate, acumulavam-se em espaço reduzido. Em nota na quintafeira, a ABPA já havia alertado para o “risco iminente de fome” para suínos e aves, o que poderia culminar em mortandade.
Ao todo, 120 unidades processadoras de carnes já suspenderam as atividades em decorrência dos protestos.