O globo, n. 30959, 12/05/2018. País, p. 4

 

Meirelles vai usar Lula em sua pré-campanha

Robson Bonin

Bruno Góes

Catarina Alencastro

12/05/2018

 

 

De olho no eleitorado do petista, ex-ministro reproduzirá vídeos em que é elogiado pelo ex-presidente

Enquanto aguarda ser anunciado pelo presidente Michel Temer como o pré-candidato formal do PMDB ao Planalto, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles montou um plano para ampliar sua exposição pública. Em um movimento para tentar capturar eleitores órfãos do ex-presidente Lula, preso em Curitiba desde o dia 7 de abril, o exministro de Temer vai levar às redes sociais vídeos em que aparece ao lado do líder petista. As imagens de arquivo remetem ao período em que Meirelles foi presidente do Banco Central na gestão de Lula. Os trechos dos vídeos escolhidos mostram o petista discursando e fazendo rasgados elogios ao peemedebista.

Em 13 de agosto de 2009, por exemplo, durante um evento oficial em Anápolis (GO), Lula creditou a Meirelles o sucesso de seu governo.

— Muitas vezes vocês já ouviram pessoas falando mal do Meirelles porque o juro estava alto. Eu quero dizer ao povo de Anápolis que eu sou agradecido e devo a esse companheiro e à equipe econômica do governo a estabilidade econômica e o respeito que o Brasil tem hoje no mundo — discursou Lula.

A ideia de Meirelles ao propagandear sua boa relação com Lula é tentar neutralizar ataques do PT e conquistar os votos dos eleitores do ex-presidente que ficaram sem candidato desde que ele passou a cumprir pena em Curitiba. Para um dos aliados do ex-ministro, ao mesclar os papeis de presidente do Banco Central de Lula e de ministro da Fazenda de Michel Temer, Meirelles poderá mostrar que não tem lado.

— Os vídeos com Lula anulam a crítica da esquerda, porque o Meirelles vai mostrar que foi fiador e resolveu o drama da crise econômica em 2003. E agora, com Temer, resolveu de novo em outro governo, da mesma forma, uma crise ainda pior. Ou seja, ele não tem grupo politico. Ele resolveu problemas no governo Lula e Temer.

DISCURSO MOLDADO POR PESQUISAS

Além de acenar ao público de esquerda, Meirelles vai intensificar o contato com eleitores das classes mais populares que rejeitariam os projetos encabeçados por políticos tradicionais, como o pré-candidato do PSDB Geraldo Alckmin. Nas conversas com aliados, Meirelles tem dito que as pesquisas eleitorais demonstram o esgotamento dos nomes tradicionais e que esse comportamento dos brasileiros favoreceria seu perfil de estreante em disputas presidenciais.

Para modular o discurso, Meirelles contratou há alguns meses o Instituto Locomotiva, especializado em mapear o comportamento dos setores populares. A partir de pesquisas qualitativas realizadas com grupos de eleitores das classes B, C e D, a equipe da pré-campanha traçou um roteiro. Nos vídeos que estão sendo gravados, o ex-ministro procurará reforçar valores como honestidade, competência, seriedade e experiência. As quatro palavras resumiriam, segundo a pesquisa, o perfil para vencer em outubro. A estratégia será testada na prática nos próximos dias, quando Meirelles participará de uma série de eventos públicos organizados por igrejas evangélicas.

Para chegar até a urna, no entanto, Meirelles terá de vencer um desafio tão complexo quanto a busca diária por votos na rua. Num universo de 20 diretórios do PMDB ouvidos pelo GLOBO, 13 admitem apoiar o nome do ex-ministro na convenção partidária de julho. Segundo as lideranças regionais do partido, se a convenção fosse hoje, os delegados simpáticos a Meirelles estariam no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Roraima, Acre e Rondônia.

O ex-ministro, no entanto, ainda precisará vencer a desconfiança de uma série de caciques do PMDB, que deseja que o partido não tenha candidato à Presidência. Ontem, o GLOBO revelou o conteúdo de uma pesquisa nacional realizada pela cúpula do partido nos 27 diretórios do país sobre uma aliança com o tucano Geraldo Alckmin. Um eventual apoio peemedebista à candidatura do tucano seria hoje rejeitado por 508 votos dos 629 delegados da cúpula peemedebista. A aliança com o PSDB seria rechaçada por 20 das 27 unidades da federação. Apenas cinco diretórios poderiam aprovar a composição de chapa com o PSDB. Pernambuco aparece como território indefinido no mapa peemedebista. Liderado pelo presidente do Congresso, Eunício de Oliveira, o diretório do Ceará deve caminhar nas eleições com o pré-candidato do PDT, Ciro Gomes.

Ontem, o PSDB minimizou a baixa adesão do PMDB a uma aliança com Alckmin. Para os tucanos, ainda é cedo para que as costuras sejam feitas. O partido diz que, quando o programa de governo de Alckmin for lançado, naturalmente haverá um interesses de partidos em apoiar o projeto do PSDB.

— Não estamos buscando nenhum tipo de aliança com o PMDB neste momento. Quando apresentarmos nosso projeto, quem tiver interesse virá conosco — afirma o deputado Ricardo Tripoli (SP), vice-presidente do partido.

No DEM, aliado histórico dos tucanos, oficialmente a ordem é ter “solidariedade” à candidatura do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ). Nos bastidores, porém, o distanciamento entre tucanos e peemedebistas é visto como caminho para o DEM abrira negociações para indicar o vice de Alckmin.

— O ambiente para essas tratativas é fim de junho. Não há uma briga com o PMDB pelo casamento com Alckmin. Nosso partido está solidário ao Rodrigo — diz um parlamentar do DEM.

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Segurança diz ter levado dinheiro até Yunes

12/05/2018

 

 

Funcionário de transportadora lembra do escritório de amigo de Temer.

O segurança Wilson Francisco Alves, ex-funcionário da empresa transportadora de valores Transnacional, disse em depoimento à Polícia Federal (PF) que também participou de entrega de dinheiro no escritório do advogado José Yunes, exassessor especial de Michel Temer e amigo do presidente há cinco décadas. As declarações do segurança foram incluídas no inquérito sobre o repasse de R$ 10 milhões da Odebrecht a políticos do PMDB. O pagamento teria sido acertado numa reunião entre Temer e o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht numa reunião no Palácio do Jaburu, em maio de 2014. A PF apura, ainda, se Yunes atuou como intermediário deste pagamento.

As informações sobre o depoimento do segurança foram divulgadas na noite de ontem pela Globonews. No interrogatório, Alves disse que “efetuou três ou quatro entregas durante uma determinada semana, não se recorda especificamente se em 2013 ou 2014” no escritório de Yunes. Ele se lembrou do local porque o prédio do escritório teria “muro de vidro”.

Alves não foi o primeiro a falar sobre entrega de dinheiro no escritório do ex-assessor do presidente. Em depoimento em 28 de março, Abel Queiroz, outro funcionário da Transnacional disse que entregou dinheiro no escritório do advogado entre 2013 e 2015.

Em outro depoimento, o doleiro Lúcio Bolonha Funaro, afirmou que, no mesmo período, buscou R$ 1 milhão no escritório de Yunes e entregou o dinheiro para o ex-ministro Geddel Vieira Lima, em Salvador. Ele teria intermediado a entrega a pedido do próprio Geddel. O ex-ministro está preso desde setembro do ano passado, quando a Polícia Federal encontrou R$ 51 milhões em espécie num apartamento usado por ele em Salvador. Foi a maior apreensão de dinheiro da Operação Lava-Jato.

Em depoimento à PF, Yunes confirma parte das transações, mas com versão diferente da de Funaro. Ele disse que, a pedido do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, recebeu o doleiro em seu escritório. Durante o encontro, Funaro lhe entregou um envelope lacrado. Ele teria achado se tratar de “documentos”. Sem checar o conteúdo, repassou o envelope à secretária Sheila Siqueira Gomes.

A secretária disse à Polícia Federal que entregou o envelope, com peso de dois a três quilos, a um emissário de Funaro. A versão dela difere, em parte, do relato feito à polícia por Yunes. “Afirma a declarante que, embora não tenha retirado da sacola, lembra-se que as dimensões se aproximavam às de um envelope de papel tipo ofício, pensando aproximadamente de dois a três quilos”.

Interrogado sobre o assunto na mesma data do depoimento da secretária, Yunes disse que se tratava de um envelope lacrado grosso, da espessura de um pouco mais de dois centímetros, “que não era pesado”. Segundo Funaro, o pacote continha R$ 1 milhão. A polícia suspeita que Yunes tenha atuado como intermediário de transações financeiras ilegais. Quando informações sobre o assunto começaram a surgir, Yunes disse ter atuado como “mula” de Padilha.

Parte dos R$ 10 milhões acertados no Jaburu teriam sido destinados à campanha do presidente da Fiesp ao governo de São Paulo, Paulo Skaf, em 2014. Os recursos teriam sido usados para pagar despesas do marqueteiro Duda Mendonça. O marqueteiro fez acordo de delação com a PF, que ainda aguarda homologação pelo Supremo Tribunal Federal.

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Pragmático, Ciro aproveita inação do PT

Maiá Menezes

12/05/2018

 

 

Pedetista tenta alianças que lembram o Lula de 2002, e petistas seguem sem saber como agi.

Há movimentos na política que emulam outros de forma quase perfeita. O de Ciro Gomes após a prisão de Lula e a desistência do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa replica o que o ex-presidente seguiu em sua primeira eleição, em 2002.

Para se tornar viável como candidato ao Palácio do Planalto, Lula costurou alianças com partidos aos quais a esquerda mais estrita dizia ter alergia. Alinhavou a governabilidade ao conversar com os mesmos PP e PR que hoje são cortejados pelo pré-candidato do PDT.

O Ciro que surge da indefinição do PT e da ausência do potencial de força que o nome de Barbosa trazia se assemelha ao pragmático Lula de 16 anos atrás. Costura, inclusive, a possibilidade de abrigar como vice um empresário — Benjamin Steinbruch, recém-filiado ao PP, ou Josué Gomes, filho de José Alencar, vicepresidente nos dois mandatos do petista.

Enquanto o PT lambe as feridas de seu líder e retoma um discurso pré-poder, de radicalismo extremo, o pedetista ocupa papel de articulador.

Tenta seduzir também partidos da esquerda, como o PCdoB, que tem précandidata (Manuela D’Ávila), indicando o rascunho de tentativa de construção de um bloco.

Quanto mais o PT demora a se posicionar, mais as chances de Ciro aglutinar uma centro-esquerda crescem.

Não há espaço vazio na política.