Título: Escolta sob suspeita
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 05/05/2012, PolÍtica, p. 4

Escolta sob suspeita

OPERAÇÃO MONTE CARLO/ Delegado da PF, investigado por envolvimento com o grupo de Cachoeira, responde à sindicância por transporte de ministros do STJ em Goiânia

O delegado da Polícia Federal Deuselino Valadares dos Santos, afastado da função por decisão judicial desde a deflagração da Operação Monte Carlo, é investigado pela própria PF por outros atos suspeitos no exercício da função. Deuselino integrava o grupo criminoso de Carlinhos Cachoeira, facilitava os interesses da quadrilha e era sócio do bicheiro numa empresa de segurança, conforme a denúncia do Ministério Público Federal.

Além dessas acusações, o delegado responde a procedimentos instaurados na PF de Goiás, onde atuava. Um dos processos abertos por uma comissão disciplinar investiga a ordem de Deuselino para que seis policiais federais transportassem ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) convidados para o casamento do filho da ministra Laurita Vaz, que integra o mesmo tribunal. A cerimônia ocorreu em 9 de abril de 2011, em Goiânia, e o transporte dos ministros, por parte dos policiais federais, foi feito entre o aeroporto, o hotel onde se hospedaram e o local do evento.

As investigações da Operação Monte Carlo já haviam detectado em abril do ano passado o envolvimento de Deuselino com o grupo de Cachoeira. No dia do casamento do filho de Laurita Vaz, ele era delegado regional de Combate ao Crime Organizado em Goiás, o número três na hierarquia da Superintendência da PF no estado. De acordo com o superintendente da PF em Goiás, delegado Joaquim Mesquita, Deuselino respondia pela superintendência em 9 de abril de 2011, um sábado — Joaquim estava de férias.

O secretário de Segurança do STJ, José Ximenes de Albuquerque, remeteu um ofício diretamente a Deuselino, três dias antes, pedindo “apoio nos deslocamentos de ministros do STJ que estarão presentes nessa capital nos próximos dias 9 e 10”. O ofício cita a realização de um evento na sede da Associação dos Magistrados de Goiás (Asmego), sem mencionar que se tratava do casamento de um filho da ministra Laurita Vaz. Ao Correio, o STJ confirmou que o pedido foi por apoio para o transporte até o local do casamento.

Diante das suspeitas de ilegalidade no ato de Deuselino, o Sindicato dos Policiais Federais em Goiás acionou o MPF e pediu abertura de procedimento para investigar a diretoria da superintendência da PF no estado. Procuradores da República pediram cópias dos registros no livro de plantão daquele sábado e deram início à apuração, ainda não concluída. Além do MPF, o caso é investigado por uma comissão disciplinar da PF em Goiás. O superintendente Joaquim Mesquita acionou também a Corregedoria-Geral da PF, em Brasília, para investigar se houve irregularidades no emprego de policiais federais para transportar ministros ao casamento do filho da ministra Laurita Vaz.

Comissão disciplinar No despacho do superintendente, ele afirma que, caso confirmadas as acusações feitas pelo sindicato, “certamente terá havido a ocorrência de crime contra a administração pública e até mesmo ato de improbidade administrativa”. Deuselino, ao depor na comissão disciplinar, disse que não procurou saber as razões do pedido do STJ e que apenas cumpriu uma determinação legal. “É atribuição da PF efetuar a segurança de qualquer ministro, tanto do Poder Executivo quanto do Poder Judiciário, sempre que requisitado.”

A portaria que regula essa escolta diz que a determinação de “apoio e segurança pessoal” deve partir do ministro da Justiça. Na resposta enviada ao Correio, o STJ sustenta que apenas solicitou o apoio e que a forma de atuação e o efetivo foram decididos pela PF em Goiás. “Embora se tratasse de um casamento, havia a presença de muitas autoridades do Judiciário, da área criminal, o que justificava o reforço da segurança. É uma rotina pedir apoio”, diz o tribunal, por meio da assessoria de imprensa.

No último dia 11, a ministra do STJ Laurita Vaz se declarou impedida de julgar o habeas corpus impetrado pela defesa jurídica de Carlinhos Cachoeira. Ela alegou que, por ser goiana e por ter mantido contato profissional ou social com autoridades públicas supostamente envolvidas com o bicheiro, estava impossibilitada de apreciar o pedido de soltura. Segundo Laurita Vaz, também por meio da assessoria de imprensa do STJ, é “leviano” associar a cessão de policiais federais no dia do casamento do filho, por determinação de Deuselino, à sua decisão de se declarar impedida para julgar o habeas corpus. A ministra diz que não conhece o delegado da PF e que não houve favorecimento na liberação dos policiais.

6 Quantidade de policiais federais cedidos para fazer o transporte e a escolta de ministros do STJ em Goiânia

Furto em Fortaleza

Nos depoimentos pr estados na comissão disciplinar da PF, Deuselino e José Ximenes , o secretár io do STJ que pediu a cessão dos policiais feder ais , confirmar am que se conhecem. José Ximenes é, originalmente , agente da PF no Ceará. O s dois estreitar am relação na investigação do furto do Banco Central em Fortaleza, segundo Deuselino.

O superintendente da PF em Goiás, Joaquim Mesquita, diz que exonerou Deuselino do cargo de delegado regional de Combate ao Crime Organizado assim que tomou conhecimento da sociedade do subordinado na Ideal Segurança, empresa em sociedade com Cachoeira e com o ex-diretor da Delta Construções Cláudio Abreu. A empresa foi investigada pela PF na Operação Monte Carlo. A exoneração ocorreu em maio de 2011, segundo Joaquim Mesquita, um mês depois da determinação para que policiais federais transportassem ministros do STJ ao casamento do filho da ministra Laurita Vaz. O delegado não dá detalhes sobre as outras investigações internas envolvendo Deuselino. “Diversos fatos são objeto de apuração na superintendência, mas estão sob sigilo.”