O globo, n. 30994, 16/06/2018. País, p. 7
Odebrecht atua para preservar filho em ação sobre sítio
Gustavo Schmitt
16/06/2018
Em depoimento a Sergio Moro, Emílio afirma que era responsável por autorizar obras para Lula
Após um longo período de distanciamento, Emílio Odebrecht, ex-presidente da empreiteira, deu novo sinal de reaproximação com seu filho Marcelo. Em carta ao juiz Sergio Moro, Emílio afirma que autorizou a reforma no Sítio de Atibaia, frequentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sem o conhecimento de Marcelo. A declaração ocorre um ano após Emílio prestar o primeiro depoimento a Moro. Na ocasião, ele não manifestava preocupação de poupar seu primogênito.
O documento foi anexado, na noite de quarta-feira, no processo em que o ex-presidente é acusado de se beneficiar de reformas feitas no sítio, no valor de R$ 1, 05 milhão, por empreiteiras como Odebrecht, OAS e pelo pecuarista José Carlos Bumlai. Lula foi condenado a 12 anos e um mês de prisão no caso do tríplex no Guarujá e cumpre pena desde 7 de abril na sede da Polícia Federal em Curitiba.
Na mensagem, Emílio reitera que a relação com o ex-presidente Lula nunca contou com nenhuma interferência do filho: “As mencionadas benfeitorias no sítio foram realizadas com minha autorização, sem qualquer participação de Marcelo. Após receber, via Alexandrino Alencar (ex-executivo da empreiteira), o pedido a ele realizado por Marisa Letícia, autorizei e determinei a execução das referidas obras com os recursos humanos e financeiros advindos da CNO (Construtora Norberto Odebrecht) em São Paulo e, para tanto, não consultei previamente qualquer outro executivo da Odebrecht, nem mesmo avisei Marcelo sobre o pedido”.
Emílio e Marcelo têm relação conturbada. Eles chegaram a romper relações durante as tratativas de colaboração premiada da empresa. Marcelo teria se sentido injustiçado com o acordo. Recentemente, porém, pai e filho têm feito movimentos de reaproximação. Em abril, eles divulgaram um comunicado conjunto em que prometiam preservar a empresa. Desde que deixou a prisão, em dezembro, Marcelo trava uma guerra nos bastidores contra executivos da cúpula da Odebrecht, que, no seu entendimento, não assumiram sua parcela de responsabilidade nos negócios da empresa.
A carta tem data da última quarta-feira. A declaração foi feita por Emílio poucas semanas após Marcelo atuar nos bastidores com o objetivo de derrubar o executivo Newton Souza, que deveria ocupar a presidência do conselho de administração da empresa. Marcelo inseriu no processo emails que sugerem que Souza sabia das irregularidades na Odebrecht, embora não tenha sido incluído no rol de colaboradores da Lava-Jato. O conselho é a instância de decisão mais importante da empresa.
EXECUTIVOS CORROBORAM
Pelo menos dois ex-executivos da empreiteira reforçaram, em depoimentos, ontem, ao juiz Sergio Moro, que Marcelo Odebrecht não tratava de assuntos relacionados a Lula. Pedro Novis, que antecedeu a Marcelo na presidência da holding, disse que durante todo o tempo em que ficou no cargo esteve uma única vez com o ex- presidente, acompanhando Emílio, e que o mesmo acontecia com Marcelo, que também não se envolvia diretamente na negociação de contratos da Petrobras.
Newton Souza, também arrolado como testemunha de defesa de Marcelo, afirmou que a prerrogativa de conversar com Lula era de Emílio Odebrecht, e que os demais executivos da empresa, incluindo o primogênito, eram incumbidos de falar com outros representantes do governo federal, como ministros e diretores de estatais.
Marcelo é réu na ação do sítio, ao lado do pai e do ex-presidente Lula. Na denúncia, os procuradores da Lava-Jato afirmaram que Marcelo seria “o responsável pela decisão de pagamento de vantagem indevida na forma de uma conta geral de propinas a agentes do Partido dos Trabalhadores, inclusive ao ex-presidente”.
Desde que saiu da prisão, o empresário busca provar que não é o único responsável pelo envolvimento da Odebrecht em esquemas de corrupção. O Ministério Público Federal acusa Lula de ter recebido vantagens indevidas da Odebrecht e da OAS, na forma de obras no sítio de Atibaia, em decorrência de contratos das empreiteiras com a Petrobras.