O globo, n. 30993, 15/06/2018. País, p. 4
MPF apura ligação de Jefferson com fraude
Daniel Biasetto
15/06/2018
Presidente do PTB e Cristiane Brasil são investigados por orientar ONG do Rio a obter registro sindical; Representação da PF, que sustentou ação de busca, afirma que Cristiane Brasil exercia grande influência no Ministério do Trabalho
O Ministério Público Federal (MPF) investiga se o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, e sua filha, a deputada federal Cristiane Brasil (PTBRJ), orientaram uma ONG que prestava serviços à Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) do Rio a fraudar os requisitos necessários para conseguir o registro sindical no Ministério do Trabalho. A apuração começou a partir do depoimento do presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado do Rio (Sindaperj), Wilson Antônio Camilo Ribeiro, que denunciou o caso, em 2017, ao MPF e ao próprio Ministério do Trabalho.
O registro do Sindicato dos Servidores da Secretaria da Justiça (SindSistemaRJ), que é alvo da investigação, foi publicado em fevereiro 2017 no Diário Oficial da União. À época, o Ministério do Trabalho já estava sob comando do PTB, com Ronaldo Nogueira, que assumiu logo que o presidente Michel Temer assumiu a Presidência, em 2016.
A denúncia serviu de base para a Polícia Federal deflagrar a operação Registro Espúrio, na qual Jefferson e Cristiane são investigados por recebimento de propina na concessão de registros sindicais. O caso corre em sigilo na ProcuradoriaGeral da República, em Brasília.
“GRANDE INFLUÊNCIA”, AFIRMA PF
De acordo com a PF, Cristiane Brasil exercia “grande influência” no Ministério do Trabalho, mesmo tendo sido impedida pela Justiça de assumir o comando do órgão. Diz ainda que ela “foi alçada, na prática, a um posto de comando da pasta”. A argumentação foi exposta na representação em que a PF pede medidas cautelares contra ela, na segunda fase da Operação Registro Espúrio.
Em janeiro, Cristiane foi indicada para assumir o Ministério do Trabalho, no lugar de Ronaldo Nogueira. Entretanto, a posse dela foi barrada pela Justiça após ser divulgado que ela já havia sido condenada em um processo trabalhista. Depois de uma batalha judicial, que durou um mês e meio e chegou até o Supremo Tribunal Federal, o PTB desistiu da indicação.
O registro sindical é o primeiro passo para uma entidade obter a Carta Sindical, que lhe permite cobrar mensalidade de seus associados. De acordo com Camilo, o esquema foi articulado ainda quando Jefferson cumpria pena pelo mensalão no Instituto Penal Francisco Spargoli Rocha, em Niterói. Camilo sustenta que, durante o período em que ficou preso na unidade, entre fevereiro de 2014 e maio de 2015, Jefferson chegou a receber visitas dos dirigentes da ONG que virou sindicato: Gutemberg de Oliveira, Marcos Ferreira de Lima e Francisco Rodrigo Rosa. Marcos Ferreira foi candidato a vereador e deputado estadual pelo PTB. Ele, assim como os demais dirigentes da ONG, também são funcionários de carreira da Seap e ocupam cargos de chefia na secretaria.
Ontem, após a publicação do caso no site do GLOBO, o presidente do PTB negou, no Twitter, que tenha recebido dirigentes do sindicato quando preso. “Não recebi ninguém além de advogados, familiares, amigos. Na data citada, Cristiane tinha acabado de assumir o mandato de deputada federal”. Ele completa, em outro post, afirmando que, à época em que estava preso, o ministro do Trabalho era Manoel Dias, do PDT.
A ONG, cuja razão social é Sindicato dos Servidores da Secretaria da Justiça, mas que se denomina Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Rio (SindSistema-RJ), tem sua competência, bem como a prestação de serviços, questionadas no Tribunal de Justiça do Rio pela entidade que representa os servidores penintenciários. De acordo com o processo, que corre na 14ª Vara Cível, a natureza jurídica do Sindsistema é de ONG voltada para ações de defesa de direitos sociais ligadas à cultura e à arte, não tendo, portanto, a natureza jurídica de “entidade sindical”, como deve ficar comprovado para a liberação do registro.
REGISTRO CONCEDIDO APÓS SUSPEITA
Mesmo após a denúncia de fraude ao MPF e ao próprio Ministério do Trabalho, a Secretaria de Relações do Trabalho concedeu o registro ao sindicato, conforme mostra a publicação no Diário Oficial da União do dia 10 de fevereiro de 2017, assinada pelo então secretário Carlos Cavalcante Lacerda, exonerado em abril. Lacerda é filiado ao Solidariedade, partido do deputado Paulinho da Força (SD-SP), também investigado na Registro Espúrio.
O presidente do SindSistema, Gutemberg de Oliveira, negou que tenha visitado Roberto Jefferson, mas disse ter encontrado com Cristiane Brasil em outras oportunidades para discutir temas de interesse da categoria. Ele também confirma que esteve com Carlos Lacerda apenas na cerimônia de entrega da Carta Sindical.
Procurada, a Seap se limitou a dizer que sua relação “não é com nenhuma entidade representativa”, e sim com a categoria. O Ministério do Trabalho afirmou que não vai se pronunciar enquanto perdurar a sindicância sobre o caso. Procurada, Cristiane Brasil não retornou aos contatos da reportagem. Roberto Jefferson foi procurado em seu telefone pessoal e, mais tarde, por meio da assessoria, mas não respondeu aos questionamentos. A assessoria se limitou a dizer que as respostas estavam no Twitter. Na rede social, ele negou ter recebido visitas dos dirigentes do SindSistema-RJ, mas não comentou as suspeitas de envolvimento em irregularidades para a concessão do registro sindical.