O globo, n. 30970, 23/05/2018. Economia, p. 25
Congresso desiste de votar venda de 6 distribuidoras da Eletrobras
Manoel Ventura
23/05/2018
Sem aprovação de MP, estatal pode arcar com uma conta de R$ 16,6 bi
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou ontem que a medida provisória (MP) que trata da privatização das seis distribuidoras de energia da Eletrobras, localizadas no Norte e Nordeste do país, e de diversas mudanças no setor elétrico não será votada pelo Congresso. A MP 814 foi editada no fim do ano passado, na tentativa acelerar a venda dessas empresas, etapa considerada essencial para a privatização da Eletrobras. Sem ela, a estatal pode ter de arcar com R$ 16,6 bilhões para liquidar essas distribuidoras, segundo cálculos do BNDES. Isso porque, em assembleia, os acionistas da Eletrobras definiram que a empresa ficará à frente da operação dessas distribuidoras até 31 de julho deste ano.
O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, classificou como “dramática” a queda da MP. Ele diz que, além do custo de liquidação, a estatal terá de assumir automaticamente dívidas de R$ 8 bilhões relativas a problemas operacionais dessas empresas deficitárias. Além disso, ele diz que a negociação sobre uma dívida de cerca de R$ 20 bilhões da Eletrobras com a Petrobras referente à compra de combustível para geração de energia também ficará comprometida sem a MP.
— É dramático para o processo. Nós ficamos com os débitos — disse Ferreira ao GLOBO.
Com o pouco tempo para organizar o leilão — cujo edital ainda precisa de aval do Tribunal de Contas da União (TCU) —, o governo já avalia aumentar o prazo para evitar a liquidação das distribuidoras, altamente endividadas e com problemas operacionais.
GOVERNO ENVIARÁ PROJETO
A privatização de todo o grupo Eletrobras é discutida em um projeto de lei, que segue em análise na Câmara. Apesar de a MP 814 não alterar o processo, ela pode inviabilizar a privatização em 2018, uma vez que as distribuidoras pesam no balanço.
Segundo Maia, o governo enviará um projeto de lei sobre o tema da medida provisória, só que a tramitação deve levar mais tempo. Ele disse que a decisão de não votar a MP foi tomada após uma reunião com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE).
— A nossa decisão, por falta de tempo no Senado, é que nós não voltaremos à MP 814, e o governo vai mandar um projeto de lei para tratar das distribuidoras — disse Maia.
A decisão de não votar a MP também foi influenciada pela nova prioridade do governo: a redução dos preços dos combustíveis. A votação da MP poderia se arrastar por dias, enquanto a Câmara precisa aprovar o projeto de lei que trata da reoneração da folha de pagamento das empresas para compensar a perda na arrecadação federal com a redução da Cide sobre o diesel.
O objetivo da medida provisória era viabilizar a privatização das distribuidoras de energia da Eletrobras que operam em Acre, Amazonas, Rondônia, Roraima, Alagoas e Piauí. A estatal decidiu vender essas empresas em 2016. Para conseguir investidores interessados nas concessionárias, a Eletrobras já aceitou assumir dívidas de R$ 11,24 bilhões, no caso da venda.
Por conta das dívidas e da necessidade de altos investimentos, o edital prevê que essas distribuidoras sejam vendidas por R$ 50 mil. Entretanto, os novos concessionários terão de investir R$ 2,4 bilhões.
RELATÓRIO INCLUIU MUDANÇAS
O relatório do deputado Júlio Lopes (PP-RJ) sobre a MP teve tramitação difícil na Câmara até ser aprovado em uma comissão porque chegou a incluir uma série de alterações nas regras do setor elétrico que geraram críticas de parlamentares da oposição e da base aliada, além de entidades da área e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
O texto do deputado permitia, por exemplo, a ampliação da tarifa social (para consumidores de baixa renda) e o aumento da tarifa de Angra 3 e do preço do gás fornecido pela Petrobras para as termelétricas contratadas na época do racionamento, em 2001. Todas medidas que teriam impacto na conta de luz.