Correio braziliense, n. 20133, 06/07/2018. Economia, p. 6

 

Sai acordo Boeing-Embraer

Simone Kafruni

06/07/2018

 

 

CONJUNTURA » Joint venture sob controle da empresa norte-americana vai gerir divisão de jatos comerciais da brasileira. Segmentos militar e de aviação executiva permanecem sob comando da companhia nacional. Negócio, de US$ 4,75 bi, ainda depende de aprovação do governo

O namoro da gigante norte-americana Boeing com a brasileira Embraer virou noivado, com casamento previsto até o fim de 2019. Pouco mais de seis meses após a primeira tentativa de negociação vazar, no fim do ano passado, as duas companhias assinaram ontem um acordo para formar uma joint venture. A transação abrange 100% das operações e serviços de aviação comercial da Embraer em US$ 4,75 bilhões. A Boeing deterá 80% da propriedade da nova empresa, com o pagamento de US$ 3,8 bilhões à Embraer, que terá os 20% restantes.

A conclusão do negócio ainda depende de aprovações regulatórias e dos acionistas, inclusive, do governo brasileiro, que detém, na Embraer, uma golden share (ação especial com direito a veto em determinados assuntos). Em comunicado conjunto, as empresas afirmaram que, “se as aprovações ocorrerem no tempo previsto, a conclusão se dará entre 12 e 18 meses após a execução dos acordos definitivos”. Em teleconferência com analistas, o presidente da Embraer, Paulo César de Souza e Silva, afirmou que a meta é ter os documentos definitivos entre outubro e novembro, “para então submetê-los ao governo do Brasil e, depois, à assembleia geral de acionistas” — portanto, ainda durante a gestão de Michel Temer.

De início, as tratativas entre as duas empresas pegaram o governo de surpresa, pelo temor de a União perder o controle das operações militares da indústria aeroespacial brasileira. O acordo anunciado ontem se limita ao escopo da área de aviação comercial da Embraer. No comunicado, as companhias informaram que vão “criar outra joint venture para promoção e desenvolvimento de novos mercados e aplicações para produtos e serviços de defesa, em especial o avião multimissão KC-390” da Embraer. A unidade absorverá também a divisão de aviação executiva da companhia brasileira.

Estratégia

“A importante parceria está alinhada à estratégia de longo prazo da Boeing de investir em crescimento orgânico e retorno de valor aos acionistas, complementada por acordos estratégicos que aprimoram e aceleram nossos planos de crescimento”, disse Dennis Muilenburg, presidente da companhia norte-americana. A expectativa, segundo ele, é de que a parceria seja contabilizada nos resultados da Boeing no início de 2020 e gere sinergia anual de custos estimada de cerca de US$ 150 milhões nos três primeiros anos.

Silva, da Embraer, ressaltou que a joint venture na aviação comercial será liderada por uma equipe de executivos sediada no Brasil. A Boeing terá o controle operacional e de gestão da nova empresa, que responderá diretamente a Muilenburg. A joint venture foi idealizada para se contrapor à união da europeia Airbus, principal concorrente da Boeing no mercado de aviões com mais de 150 assentos, e a canadense Bombardier, que compete com a Embraer no segmento de médio porte. A joint venture vai oferecer aeronaves de passageiros de 70 a mais de 450 assentos e aviões de carga.

O presidente da Embraer destacou que a outra joint venture, das áreas de defesa e de aviação executiva, vai ser criada com a Boeing, mas a brasileira terá o controle. “Não sabemos ainda o percentual, mas a Embraer será majoritária. A parceria será destinada a explorar oportunidades no setor de defesa, especialmente, a venda do KC-390 por meio da rede da Boeing”, explicou. Segundo ele, a Boeing tem uma área de defesa que representa aproximadamente US$ 28 bilhões das suas receitas, quase um terço do total. “A união dará à Embraer a possibilidade de ter acesso a esses mercados”, disse.

Parceria

Empregos e fábricas devem ser mantidos como estão hoje e a Embraer continuará na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), mas haverá separação dos ativos de aviação comercial. “A Embraer S/A continua uma empresa de capital aberto, igual a hoje, listada nos Estados Unidos e na B3, com os negócios de aviação executiva e de defesa. E terá investimento de 20% na empresa criada com a Boeing (cuja marca ainda não foi definida). Essa terá capital fechado”, explicou Silva.

O professor de Economia do Transporte Aéreo Adalberto Febeliano, avaliou a parceria como extremamente positiva para o país em termos de indústria aeroespacial. “A evolução do mercado mundial mostra que as aeronaves estão ficando cada vez maiores. Para fabricar grandes aviões, se gastam até US$ 3 bilhões só no desenvolvimento. A expertise da Embraer é em jatos menores. Então, a parceria vai perenizar a presença do Brasil nessa indústria”, analisou. “A futura joint venture na área de defesa vai ampliar o mercado para o KC-390, que pode substituir o Hércules, o avião militar de transporte mais comum nesta faixa de volume e peso, que foi projetado na década de 1950”, disse.

O mercado não gostou da necessidade de aprovação final do negócio — que pode ficar a cargo do próximo governo — e da avaliação da Embraer. As ações da companhia caíram 14,29%, a maior queda da B3 no pregão de ontem. Segundo Rafael Camano Passos, analista da Guide Investimentos, o mercado trabalhava com um valor entre US$ 6 bilhões e US$ 10 bilhões para a Embraer. “Com o anúncio de US$ 4,75 bilhões, as ações abriram em queda de 7%. Depois da teleconferência, que confirmou a necessidade de aprovação do governo, caíram mais”, explicou.

Passos assinalou que também houve realização de lucros já que as ações da Embraer se valorizaram desde que a negociação com a Boeing vazou. Conforme a empresa de informações financeiras Economática, a aérea brasileira ganhou US$ 5,113 bilhões em valor de mercado em 2018.

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Privatização avança

06/07/2018

 

 

A Câmara dos Deputados aprovou, na noite de quarta-feira, o Projeto de Lei (PL) nº 10.332/2018, que cria condições para a privatização de seis distribuidoras do Sistema Eletrobras. O texto recebeu 203 votos a favor e 123 contrários. Acordo entre os líderes, no entanto, empurrou para a próxima semana a votação dos destaques ao projeto, que incluem emendas que podem modificar a proposta original. A aprovação é essencial para a realização do leilão das distribuidoras, marcado para 26 de julho.

Embora não trate diretamente da privatização dessas companhias, o PL resolve pendências das distribuidoras controladas pela Eletrobras que enfrentam problemas operacionais e dificuldades financeiras: Amazonas Energia, Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron), Companhia de Eletricidade do Acre (Eletroacre), Companhia Energética de Alagoas (Ceal), Companhia de Energia do Piauí (Cepisa) e Boa Vista Energia, de Roraima. As distribuidoras estão sem contratos de concessão vigentes, e a holding vai assumir as dívidas, para tornar os ativos mais interessantes a possíveis investidores.