O globo, n. 30989, 11/06/2018. País, p. 3

 

Espólio ainda sem dono

Silvia Amorim

Fernanda Krakovics

Bruno Góes

Mateus Coutinho

11/06/2018

 

 

Sem Lula e Joaquim Barbosa na disputa, brancos e nulos disparam na preferência do eleitorado

O afunilamento de candidaturas para a Presidência não tem se revertido em maior clareza do cenário eleitoral. Nos cenários sem Lula, enquadrado na Ficha Limpa, com o exministro do STF Joaquim Barbosa fora da disputa, aumentou significativamente o número de eleitores que se declaram sem candidato. É o que mostra pesquisa Datafolha divulgada ontem. Os votos brancos, nulos e indecisos bateram em 34%, em “primeiro lugar” na corrida. Em abril, o maior patamar registrado havia sido de 28%.

A desistência de Barbosa era esperada como um fator de mudança. No entanto, as intenções de voto obtidas por ele em abril (8% a 10%) não fortaleceram nenhum concorrente em especial. Lula, embora preso, mantém-se na liderança, com 30%. Sem o petista, o pré-candidato do PSL, Jair Bolsonaro, assume a dianteira, com 19%. Potenciais substitutos de Lula, Fernando Haddad e Jaques Wagner continuam com desempenho pífio — 1%.

Sem Lula, a ex-senadora Marina Silva (Rede) aparece na segunda posição, entre 14% e 15%. Ciro Gomes (PDT) tem de 10% a 11% e aparece empatado tecnicamente com Geraldo Alckmin (PSDB), que marcou 7%. Álvaro Dias tem 4%. No pelotão com intenção de voto entre 1% e 2% estão Manuela D'Ávila (PC DO B) e Rodrigo Maia (DEM). Os demais pré-candidatos tiveram 1% ou menos.

Os cenários pesquisados este mês são diferentes dos que foram considerados em abril. Por isso, os resultados dos dois levantamentos não são perfeitamente comparáveis. A pesquisa, com margem de erro de dois pontos percentuais, foi realizada com 2.824 eleitores de 174 municípios, na quarta e quinta-feira da semana passada.

A sondagem mostrou que a crise dos caminhoneiros não alterou o cenário eleitoral. Diferentemente da avaliação do presidente Michel Temer, que viu sua taxa de rejeição bater novo recorde — 82%. Em abril, ela era 70%.

O QUE DIZEM CAMPANHAS E PRÉ-CANDIDATOS

O deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) divulgou um vídeo ontem, pelo Twitter, em que tenta desacreditar o levantamento do instituto.

— Estou bem pra baixo e no segundo turno perderia para todo mundo. Datafolha: continuas pagando vexame — disse o deputado federal.

Marina aparece na disputa presidencial como a principal favorecida por uma saída de Lula. Ela herdaria, segundo o levantamento, de 17% a 18% dos eleitores do petista. Entretanto, a maior parte deles (38% a 40%), quando Lula é retirado da eleição, migra para o grupo dos sem candidato.

— Temos ainda que buscar formas de dialogar com os cerca de 30% de eleitores que poderiam votar em branco, nulo, em ninguém ou ainda não sabem em quem irão votar. A eleição suplementar esse ano no Tocantins serve de alerta: quase a metade dos eleitores votou nulo, branco ou se absteve. A sociedade está indignada e com toda razão — afirmou Marina, que promete manter o tom “propositivo” da campanha.

Para 32% dos entrevistados, Lula deveria apoiar Ciro se não puder concorrer. Coordenador da campanha do pedetista, o irmão Cid Gomes atribuiu o desempenho de Marina ao recall da eleição passada:

— As pessoas estão muito alheias ainda, não se ligaram nem na Copa quanto mais na eleição. Boa parte da pesquisa agora é lembrança de nomes e a Marina é a única que foi candidata a presidente nas últimas eleições, ficou em terceiro lugar.

O resultado do Datafolha deu combustível para o PT manter a estratégia de insistir no nome de Lula até se esgotarem todos os recursos jurídicos.

Segundo o Datafolha, 30% dos eleitores dizem que votariam com certeza num candidato indicado pelo petista e 17%, talvez. Integrante da Executiva Nacional do PT, o deputado José Guimarães (CE) avalia que Haddad e Wagner crescerão:

— Isso não é real. As pessoas não sabem que eles são candidatos do Lula.

Para a campanha tucana, o aumento de eleitores sem candidatos é natural porque a população não está interessada em fazer o debate neste momento. O processo decisório, dizem articuladores de Alckmin, acontece nas últimas semanas da campanha. O coordenador do programa de governo, Luiz Felipe d'Avila disse que o resultado é “positivo”.

— Mostra que, apesar do mau humor com a política, Alckmin é o candidato mais competitivo no centro. O ponto é como unir o centro, diminuir o número de pré-candidatos e passar a ter mais tempo de TV do que todos os outros — disse d’Avila.

Oscilando entre 0% e 1% das intenções de voto, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB) afirma que o resultado já era esperado.

— São resultados absolutamente naturais. Não há grandes mudanças em relação às pesquisas anteriores. Quem já era conhecido, está pontuando. Isso ocorre porque a legislação para a précampanha é muito restritiva e impõe grande dificuldade para quem não é conhecido.

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Tucanos buscam explicação para o ‘enigma de Alckmin’

Silvia Amorim

11/06/2018

 

 

Colaboradores cruzam pesquisas para entender baixo desempenho em São Paulo

Catalisador da desconfiança em torno da candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB), o fraco desempenho eleitoral em São Paulo, estado que governou por 13 anos, intriga a própria equipe do tucano. Ao cruzar pesquisas, seus colaboradores perceberam o fenômeno: apenas um terço dos eleitores que aprovam sua gestão aponta Alckmin como seu candidato nas eleições deste ano. Eles dizem que o fosso entre a avaliação positiva e a disposição em votar contraria a normalidade.

A desconexão é um enigma para a campanha, que foi investigar pesquisas de eleições anteriores atrás de explicações para o cenário inédito do tucano em seu estado. Sem encontrar respostas seguras, a equipe do tucano se agarra a uma hipótese: a de que muitos eleitores de São Paulo ainda não sabem que ele é candidato.

Alckmin é o político que por mais tempo governou São Paulo. Nas duas últimas eleições (2010 e 2014) venceu no primeiro turno — sendo o mais votado em 644 dos 645 municípios paulistas quatro anos atrás.

Desgaste de imagem do PSDB com a Lava-Jato e cansaço com as administrações no estado também são hipóteses para a discrepância. Alckmin amarga o pior desempenho de um presidenciável do PSDB no estado. Pesquisas Ibope e Datafolha, divulgadas em abril e maio, mostram o tucano com 15% das intenções de voto dos paulistas, num empate técnico com o Jair Bolsonaro (PSL).

Entre os eleitores que aprovam o governo de Geraldo Alckmin em São Paulo, 15% dizem votar em Bolsonaro para presidente. Marina Silva (Rede) abocanha outros 15%. Estes números, especificamente, foram levantados, em abril, pela pesquisa Datafolha. Segundo o instituto, Alckmin deixou o governo paulista com 36% de aprovação. O índice é dos mais baixos obtidos por ele. Em 2006, quando disputou a Presidência, tinha 66%. Naquele ano, ele obteve 54% dos votos válidos em São Paulo no primeiro turno.

Para este ano, sua equipe almeja um patamar menor.

— Vamos chegar aos 30% — diz um dos estrategistas do pré-candidato.

Há uma discussão interna se Alckmin deveria viajar o estado, mas o palanque duplo — de João Doria (PSDB) e Márcio França (PSB) — deixa o presidenciável em situação delicada.

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A ponte entre Ciro e o DEM

Thiago Prado

11/06/2018

 

 

Rodrigo Maia marca encontro com pedetista, e Eduardo Paes passa a ser entusiasta da parceria com o candidato, que também busca os votos da esquerda e o eleitor de Lula

Descartado até o mês passado, o casamento entre DEM e Ciro Gomes já não é mais tratado como impossível no partido. Cresce na sigla a sensação de que a candidatura do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) não vai emplacar — e o resultado da pesquisa Datafolha de ontem reforçou ainda mais a percepção.

Conforme informou o colunista Lauro Jardim, o deputado Rodrigo Maia terá uma conversa em breve com Ciro. Maia pretende desistir no mês que vem da sua candidatura ao Planalto e está monitorando qual a melhor alternativa para se manter no comando da presidência da Câmara em 2019 (este sim, seu principal objetivo).

— Temos que ter a capacidade de dialogar com todos. Porque também se a gente fica dizendo que é centro e quer excluir o Ciro Gomes do diálogo, então a gente não é bem de centro — disse Maia no sábado, em evento no Rio de Janeiro.

O ex-prefeito do Rio, Eduardo Paes, agora principal parceiro de Maia no DEM fluminense, é mais um a simpatizar com o projeto pedetista. Paes tem boas relações com Ciro há tempos e, por pouco, não entrou no PDT, na janela partidária deste ano. O ex-prefeito também lembra da lealdade de Ciro em 2016. Ele anunciou publicamente seu apoio ao deputado Pedro Paulo Carvalho na disputa pela prefeitura do Rio, mesmo com duas adversidades sensíveis na campanha do parlamentar: a acusação (depois arquivada) de agressão à ex-mulher e o seu voto favorável ao impeachment de Dilma Rousseff, chamado de 'golpe' por Ciro até hoje.

O prefeito de Salvador ACM Neto também é mais um a despertar para a hipótese Ciro. Em público, ele vinha defendendo a pré-candidatura de Maia, mas sempre deixava pontes abertas com Alckmin nos bastidores.

AS ARESTAS DO PASSADO

Para a parceria emplacar, frases de Ciro em 2005 terão que ser ignoradas. No auge do escândalo do mensalão, o pedetista chamou ACM Neto de “tampinha” e “anão moral". Não seria, no entanto, a primeira vez que a família Magalhães deletaria da mente os disparos proferidos pela língua do político do Ceará. Em 2002, o senador Antonio Carlos Magalhães apoiou sua candidatura ao Planalto, quando Ciro era filiado ao PPS. E acabou deixando de lado uma frase de 1999: “Tudo o que não presta na história republicana tem o ACM", disse, à época, o então candidato.

Duas figuras de peso no DEM ainda insistem em apoiar Alckmin. O ex-ministro Mendonça Filho, até porque poderia ser uma opção de vice para o Planalto; e o deputado Rodrigo Garcia, interessado em compor a chapa de João Doria em São Paulo. Para o DEM se alinhar ao tucano, são as falas recentes de Rodrigo Maia que atrapalham. “O ciclo do PSDB se esgotou", vem repetindo desde março.