O globo, n. 30986, 08/06/2018. País, p. 7

 

As ‘garotas’ do PSC

Gisele Barros

Marcella Ramos

Marlen Couto

08/06/2018

 

 

Ex-presidente da legenda cristã é investigado por usar recursos provenientes do Fundo Partidário para pagar serviços de prostitutas; em áudio, Vitor Nósseis diz que ‘recuperou todas elas para vida’; ao GLOBO, afirma que gravação foi ‘manipulada’

O ex-presidente nacional e fundador do Partido Social Cristão (PSC) Vitor Jorge Abdala Nósseis é alvo de um inquérito, em andamento no Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que apura a destinação de recursos da Fundação Instituto Pedro Aleixo (Fipa), vinculada à sigla até 2017 e financiada pelo Fundo Partidário, para pagar prostitutas. No ano passado, o próprio PSC entregou ao MP e à Polícia Federal uma gravação em que, segundo o partido, o ex-presidente afirma ter usado recursos da entidade para “comer putas”.

O áudio foi obtido pelo GLOBO na prestação de contas do PSC de 2017 enviada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desde 2017, a fundação não tem mais ligações com o PSC, e Nósseis foi expulso no fim de 2017.

“Eu tô vendo uma fofoca. Diz que eu dei dinheiro, né? Eu dei dinheiro da fundação para comer as puta (sic)... Conversa dela. Falei assim: Dei mesmo, e comi. Qual o problema? E agora? Vai fazer o que comigo? Dei, mas elas se formaram. Recuperei elas todas pra vida”, ouve-se na gravação, em que também são citados os nomes de “Samanta” e “Keila”: “Cê (sic) vê, a Samanta é uma mesmo. A Keila é outra. Tem umas três lá na Europa. Já viraram, tudo virou gente. Formaram-se, tem mais de 20”, complementa.

Localizada em Belo Horizonte e criada em 2009, a fundação desenvolve projetos de cunho político, social, educativo e cultural. O MP de Minas investiga se houve repasses de verbas, concessão de bolsas ou outros benefícios a alguma “Samantha” ou “Keila”. Segundo o estatuto do PSC, a Fipa era responsável pela aplicação de 20% dos recursos do fundo partidário destinados à sigla, o que representa cerca de R$ 3 milhões em 2017.

De acordo com despacho do promotor Marcelo Oliveira Costa, da 21ª Promotoria Judicial de Tutela de Fundações, Vitor Nósseis afirmou em depoimento que não se recorda do diálogo e que “não se pode levar em consideração uma conversa informal, descontraída”. Ao GLOBO, sustentou que a gravação é “clandestina e apócrifa”, e que foi manipulada a pedido do pastor Everaldo, atual presidente do PSC, em função de denúncias que apresentou contra ele e a sigla. Já a defesa do partido informa que recebeu o áudio por meio de uma denúncia anônima.

Vitor Nósseis fundou o PSC e foi presidente da sigla entre 1985 e 2015, quando se tornou presidente de honra. Advogado, tentou se eleger para um cargo político apenas uma vez, nas eleições presidenciais de 1994 como vice de Hernani Goulart Fortuna. A chapa ficou em último lugar no pleito eleitoral, com apenas 0,26% dos votos.

Desde 2014, o TSE determina que as prestações de contas dos partidos devem trazer as das fundações mantidas pelas legendas. Já em 2015, o PSC teve problemas na divulgação dos gastos por conta da falta de documentação da Fipa, que não foi enviada no prazo. Em março de 2017, a ministra Rosa Weber, do TSE, atendeu a um pedido do PSC e determinou a suspensão dos repasses à instituição. Em abril deste ano, a legenda enviou uma notificação extrajudicial à fundação. O prazo para o envio da prestação de contas era o dia 30 daquele mês. Como presidente do instituto, Nósseis respondeu que, “diante da manifestação da própria comissão executiva nacional do Partido Social Cristão em extinguir o vínculo jurídico com a Fundação Instituto Pedro Aleixo, não lhe assiste nenhuma titularidade para estabelecer prazos, sejam eles quais forem, até decisão final da Justiça”.

Em 2016, Nósseis enviou petição ao TSE para que fosse feita uma auditoria externa para investigar as contas do PSC. O ex-presidente da sigla solicitou ainda o afastamento de Everaldo e de outros dirigentes, acusando-os de corrupção e mau uso do dinheiro público. Em fevereiro de 2018, o pedido teve parecer favorável do Ministério Público Eleitoral e, em maio, foi encaminhado para a Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (Asepa), em despacho do ministro Luís Roberto Barroso.

Também em maio, o Pastor Everaldo e outros dois membros do partido, Adolfo Lúcio de Oliveira Fernandes e Denise Assumpção Fernandes, decidiram processar o ex-presidente, por crimes de calúnia, injúria e difamação. Nósseis entrou na Justiça contra o PSC pela primeira vez em 29 de setembro de 2015, questionando a convenção do partido, que decidiu pela saída dele da presidência. O processo correu na 25ª Vara Cívil de Brasília até 20 de junho de 2017, quando foi arquivado.

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Nova denúncia contra Cabral cita propina de R$ 23,9 milhões

Juliana Castro

08/06/2018

 

 

Ministério Público diz que dinheiro veio da empreiteira Queiroz Galvão

A mais recente denúncia da força-tarefa da Lava-Jato no Rio revela o pagamento de propina ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB) por mais uma empreiteira: a Queiroz Galvão. De acordo com os procuradores, dois doleiros, Raul e Jorge Davies, ajudaram o emedebista em 33 oportunidades a receber um total de R$ 23,9 milhões em propina da empresa entre abril de 2011 e agosto de 2014, quando Cabral já havia deixado o governo.

O Ministério Público Federal (MPF) afirma que houve o acerto de pagamento ilegal pela Queiroz Galvão pelo menos em relação a três obras custeadas com recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC): urbanização na favela da Rocinha (PAC das Favelas), construção do Arco Metropolitano (Segmento C – Lote 02) e a construção da Linha 4 do Metrô.

Essa foi a 24ª denúncia contra Cabral na Lava-Jato. Além dele, foram denunciados Dario Messer, conhecido como o doleiro dos doleiros e que está foragido, e outras 60 pessoas. Esse é um resultado da Operação Câmbio, Desligo, que desarticulou uma rede de doleiros que movimentaram US$ 1,6 bilhão por meio de mais de 3 mil contas de offshores. Antes da Queiroz Galvão, Cabral já foi acusado de receber de outras empreiteiras como a Carioca Engenharia e a Odebrecht.

A denúncia cita ainda a delação do operador de Cabral Carlos Miranda. Ele disse que, em 2007, no início do governo do emedebista, o então secretário de Governo Wilson Carlos o informou que teria sido feito acordo com Ricardo Galvão para repasse de propina na proporção de 5% dos pagamentos feitos pelo governo do estado à empreiteira. Miranda conta que, inicialmente, o pagamento de propina era feito na forma de mesada no valor de R$ 300 mil, mas que, em razão das dificuldades que a Queiroz Galvão possuía em gerar dinheiro em espécie no Brasil, a empreiteira optou por fazer os pagamentos por meio dos doleiros Raul e Jorge Davies.

SALDO DE R$ 20 MILHÕES

Ainda em sua colaboração, Miranda afirma que o saldo devedor da Queiroz Galvão, ao final do governo Cabral, seria de R$ 20 milhões, de acordo com suas contas. Numa reunião na casa de Cabral, em 2014, após a saída do emedebista do governo, Ricardo Galvão apresentou outras despesas que teria feito para Cabral. O operador conta que, então, o saldo caiu para R$ 14 milhões, e que a empreiteira pagou R$ 4 milhões do doleiro Davies e R$ 6,5 milhões em contribuições de campanha de 2014.

“Que em operação policial em 2014 foi achada uma lista escrita a mão na sede da QUEIROZ em SP; Que, nessa lista, o primeiro nome era ‘SC’ associado a um valor de R$ 9.000.000,00; Que, na época, não vincularam SÉRGIO CABRAL a isso, mas era o que havia sido pedido a QUEIROZ na campanha; Que o colaborador teve conhecimento de tal documento por meio da imprensa”, afirma o documento de delação de Miranda.

No texto encaminhado ao juiz Marcelo Bretas, que decidirá se os denunciados viram réus, os procuradores afirmam que as investigações relacionadas ao crime de corrupção ativa cometidos pelos representantes da empresa Queiroz Galvão permanecem em curso. A denúncia se detém aos recebimentos de propina por Sérgio Cabral por intermédio dos doleiros.

A defesa de Cabral afirmou que a acusação trata de temas que já estão sendo discutidos em juízo. “É a quarta denúncia sobre os mesmos fatos. Sérgio Cabral não conhece e não teve, sequer, contato com as pessoas mencionadas pelo Ministério Público Federal”. A Queiroz Galvão não comentou a denúncia.