O globo, n. 30992, 14/06/2018. País, p. 5

 

PF afirma que Temer avalizou compra de silêncio de Cunha

Daniel Gullino e Bela Megale

14/06/2018

 

 

Relatório sustenta que há indícios suficientes sobre os pagamentos

No relatório final da Operação Cui Bono, que investiga irregularidades na Caixa Econômica Federal, a Polícia Federal (PF) ressaltou o envolvimento do presidente Michel Temer na tentativa de compra de silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e do operador Lúcio Funaro.

A acusação é baseada na delação premiada do empresário Joesley Batista, da J&F, revelada com exclusividade pelo colunista Lauro Jardim, do GLOBO, em maio de 2017. Joesley gravou uma conversa com Temer no Palácio do Jaburu, em que o presidente, ao ouvir que o empresário estava “de bem” com Cunha, responde: “Tem que manter isso aí, viu?”

De acordo com a PF, foram encontrados “indícios suficientes de materialidade e autoria” atribuíveis a Temer. A PF diz que o presidente incentivou Joesley Batista a manter pagamentos a Cunha e Funaro, que estavam presos, para que os dois não fizessem acordos de delação premiada.

Em depoimento, Joesley afirmou que havia repassado R$ 5 milhões para Cunha, depois que ele foi preso, em outubro de 2016, como “saldo de propina”. Já Funaro teria recebido pagamentos menais de R$ 400 mil.

O empresário “asseverou que deu ciência a Michel Temer” sobre os pagamentos, deixando claro que “se destinavam a garantir o silêncio” dos dois, “ao que sua Excelência (Temer) teria recomendado a manutenção de tais repasses”, afirma o relatório.

Após a delação da JBS, Funaro fez um acordo e admitiu que tinha recebido dinheiro para ficar em silêncio.

O caso motivou uma denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Temer, barrada pela Câmara dos Deputados. O processo voltará a tramitar quando terminar o mandato do presidente.

Temer sempre negou as acusações. Um dos advogados do presidente, Eduardo Carnelós, chegou a dizer que ele foi vítima de uma “tentativa de golpe”.

Além da compra de silêncio de Cunha, o relatório também destaca que Temer deixou de comunicar às autoridades competentes a suposta corrupção de juízes e membros do Ministério Público, que foi narrada por Joesley no Jaburu.

O empresário disse que estava “dando uma segurada” em um juiz. Também afirmou que um procurador estava “dando informação” para ele, e que estava tentando substituir outro procurador. Temer não condenou os relatos de crimes e, depois, não mandou investigá-los.

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Geddel e a propina no aniversário da filha

14/06/2018

 

 

Relatório final sobre Operação Cui Bono detalha entrega de valores

A Polícia Federal (PF) comprovou a versão do operador Lúcio Funaro sobre a entrega de propina ao ex-ministro Geddel Vieira Lima no dia da festa de 15 anos da filha dele, em 2014, em Salvador. No seu acordo de delação premiada, Funaro relatou ter entregue R$ 800 mil a Geddel em um hotel, em 22 de março de 2014, dia da festa.

As informações estão no relatório final da Operação Cui Bono, que investiga irregularidades na Caixa Econômica Federal. A PF indiciou 16 pessoas, entre elas Funaro, Geddel, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB) e o empresário Joesley Batista, conforme antecipou o Jornal Nacional na semana passada.

Há o registro de que o avião de Funaro ficou estacionado em Salvador entre 0h15m do dia 22 de março e 15h30m do de 23 de março. Além disso, o Hotel Pestana confirmou que o operador e sua mulher, Raquel Pitta, se hospedaram no local nessa data. Os registros dos telefones dos dois também mostram uma ligação entre eles nas proximidades do hotel, no dia 23 de março.

O relatório da PF diz que a “possível permanência por um período prolongado deve ter se dado em razão da indisponibilidade de Geddel, tendo em vista a hora da chegada e a possível ocupação com a festa de debutante de sua filha”.

O operador disse que o exministro foi ao seu encontro no hotel, e que a entrega do dinheiro ocorreu no carro de Geddel, um Cherokee. A PF confirmou a propriedade do veículo na declaração de bens apresentada pelo emedebista à Justiça Eleitoral naquele mesmo ano, quando ele concorreu ao cargo de senador.

 

PRESIDENCIÁVEIS PRESTIGIARAM

A festa da filha de Geddel reuniu diversos políticos, entre eles os então pré-candidatos à Presidência Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB); o prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), e Eduardo Cunha, então líder do MDB na Câmara e hoje preso.

A entrega de dinheiro no hotel, contudo, foi uma exceção. Funaro relatou outras seis ocasiões — entre janeiro e setembro de 2014 — em que propina era entregue em um hangar no aeroporto de Salvador. O GLOBO entrou em contato com a defesa de Geddel, mas não teve resposta. (Daniel Gullino e Bela Megale)