O globo, n. 30985, 07/06/2018. Rio, p. 9

 

Canteiros sem obras

Luiz Ernesto Magalhães

07/06/2018

 

 

Prefeitura evita retomar projetos paralisados para conter aumento de gastos com custeio e pessoal

Os projetos parados da prefeitura se espalham pelo Rio. Na Avenida Brasil, no lugar de operários, canteiros do BRT viraram abrigos para dependentes de crack. Na Zona Oeste, mil famílias do bairro Vilamar, em Pedra de Guaratiba, aguardam há dois anos a retomada das obras de infraestrutura do Bairro Maravilha, enquanto que, em Campo Grande, nenhum morador sabe quando finalmente contará com os serviços de uma Clínica da Família, cuja construção parou nas fundações na Rua José Francisco de Souza Porto.

Obstáculo. As obras paradas da Transbrasil, que prejudicam o trânsito numa das mais importantes vias da cidade
Reativar todas essas obras se transformou em uma equação de difícil solução. Em muitos casos, faltam recursos. Em outros, há até dinheiro disponível de empréstimos, mas não para manter o serviço após a conclusão do projeto. A prefeitura tem, ao todo, cerca de cem contratos paralisados, que abrangem aproximadamente 300 obras, a maioria desde o segundo semestre de 2016, nos últimos meses da gestão do então prefeito Eduardo Paes. O problema será discutido hoje por técnicos da prefeitura e vereadores numa audiência pública da Comissão de Obras Inacabadas da Câmara Municipal.

A promessa da Secretaria da Casa Civil é que as obras comecem a ser retomadas no segundo semestre, em um cronograma previsto para ser divulgado nos próximos dias. Mas o plano deverá incluir a manutenção da infraestrutura pública existente, e não novos investimentos. Já Eduardo Paes argumentou que considera natural a interrupção de projetos nos últimos meses de uma gestão, “até para facilitar o planejamento do sucessor”:

— Nenhuma obra foi suspensa no fim do ano. Após uma eleição, empreiteiros ficam esperando para saber o que o novo prefeito vai fazer. É natural que, quando um novo governo assume, o prefeito precise de tempo para se organizar. Mas já se passaram 18 meses.

 

ARRECADAÇÃO CRESCEU POUCO

Independentemente dos planos da prefeitura, o presidente da Comissão de Obras Inacabadas, vereador Fernando William (PDT), atribui o cenário atual a uma mistura de problemas de gestão com falta de planejamento.

— A prefeitura depende principalmente de empréstimos para fazer novos investimentos. Tem pouca margem para aplicar recursos próprios em novos projetos. Além disso, esses projetos acabam gerando despesas com pessoal ou custeio. Até o momento, as mudanças nas regras de cobrança do IPTU não surtiram o efeito desejado. A arrecadação só cresceu cerca de 8% em 2018 — disse William.

O risco de alguns projetos se transformarem em elefantes brancos ocorre, por exemplo, no caso do projeto Escolas do Amanhã, lançado por Paes. A proposta era abrir 110 novas escolas em regime de horário integral. Dessas, 90 já foram inauguradas. Mas, caso as obras sejam retomadas nas 20 unidades não entregues, podem faltar recursos para contratar pessoal e mantê-las. Há mais de um ano, a prefeitura está com restrições para gastar com o pagamento de pessoal, porque suas despesas estão acima do chamado limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Com isso, a prioridade do município é direcionar recursos para reformar escolas que se encontram em estado precário. Esse problema do custeio foi discutido em maio, em reuniões entre técnicos da prefeitura e conselheiros do Tribunal de Contas do Município (TCM), que tentaram estabelecer prazos para a retomada dos projetos parados. Um cronograma inicial chegou a ser apresentado, mas o documento não foi entregue oficialmente. Em fevereiro, o TCM determinou que, em lugar de dar início a novos investimentos, a prefeitura deveria concluir as obras paradas, que têm custo estimado em R$ 2 bilhões. A prefeitura entrou com recurso questionando o acórdão, que será julgado na terça-feira.

A questão do custeio também foi abordada pelo secretário municipal de Educação, Cesar Benjamin, ao explicar recentemente a uma moradora de Rio das Pedras, por meio de uma rede social, as razões pelas quais não eram retomadas as obras de três escolas da região. Ele escreveu que a Casa Civil tem sido irredutível, alegando “que novas escolas provocarão novos gastos de custeio”.

A falta de recursos se repete na área da saúde. Ao assumir a prefeitura, Crivella herdou um contrato para finalizar a construção de 54 Clínicas da Família. Dessas, 11 tiveram as obras concluídas, mas apenas quatro foram abertas à população. O problema foi tema de audiência pública na semana passada na Câmara. Para o vereador Paulo Pinheiro (PSOL), da Comissão de Saúde, o descumprimento do cronograma comprometerá as metas da pasta.

— A prefeitura informou que não há recursos nem para abrir as demais unidades prontas, pois elevaria os gastos com custeio — disse Pinheiro.

 

TRANSBRASIL PODE RECOMEÇAR ESTE MÊS

O problema é ainda mais amplo: faltam recursos até para manter o que já existe. Para complicar este cenário, a partir do próximo dia 15, a prefeitura terá que arcar com a manutenção da área do Porto Maravilha devido à falta de liquidez do fundo da Caixa Econômica Federal que mantém a região numa Parceria Público-Privada (PPP).

Em relação aos projetos que contam com empréstimos, existe a promessa de retomada das obras do BRT Transbrasil até o fim deste mês. Com pouca sinalização e parte dos pardais desligados, os acidentes na Avenida Brasil têm se multiplicado. As bases do contrato das obras estão sendo renegociadas com a Caixa Econômica Federal, para a inclusão de dois novos trechos: entre Deodoro e Irajá (uma ligação com o Trevo das Margaridas) e entre o Caju e a Rodoviária.