O globo, n. 30982, 04/06/2016. Editorial, p. 14

 

Modelo da falência

04/06/2018

 

 

A demissão de Pedro Parente da presidência da Petrobras conseguiu unir gente do governo Temer e a oposição, pontos diametralmente opostos no cenário político brasileiro atual. O entendimento entre ambos se dá porque coincidem na visão de que a Petrobras, por ser do Estado — esquecem que há uma miríade de acionistas pessoas físicas e jurídicas, dentro e fora do país —, pode servir de instrumento do governo de turno.

Foi esta visão que praticamente quebrou a empresa, devido à gestão temerária nos governos Lula e Dilma. Além de usada como fonte bilionária de recursos para financiar o projeto de poder lulopetista — e mesmo, via propinas, melhorar o padrão de vida de alguns líderes, como está provado na Justiça —, a estatal também padeceu ao ser, como em tantas outras vezes, instrumento de controle da inflação. Da pior forma possível: via congelamento de seus preços.

Outro uso deletério feito da estatal, numa imitação do que aconteceu na ditadura militar, foi colocá-la como indutora de um programa megalomaníaco de substituição de importações de equipamentos destinados à exploração de petróleo, projeto também usado para arrecadar propinas de empreiteiras.

A empresa chegou ao governo Temer virtualmente quebrada. Se fosse uma companhia privada, teria de pedir recuperação judicial, forma moderna da concordata.

A administração de Pedro Parente foi essencial para a empresa recuperar as finanças, a capacidade de investimento etc. Para isso, executou um programa de venda de ativos que contrariou os nacionalistas de plantão — sempre atentos quando se trata da Petrobras.

Porém, sem que o Tesouro, com déficits anuais superiores a R$ 100 bilhões, possa socorrer a companhia, a alternativa de venda de subsidiárias, em todo ou em parte, é a indicada. E mesmo que as contas públicas estivessem superavitárias não faria sentido o conjunto da sociedade socorrer, com os altos impostos que paga, uma empresa estatal e seus acionistas privados.

Ponto-chave na modernização administrativa da estatal é a política de preços, pela qual a empresa deixa de subsidiar o consumidor. A crise que levou à saída de Pedro Parente foi deflagrada pela greve de caminhoneiros contra o aumento do diesel (e de todos os combustíveis), impulsionado pelo encarecimento do petróleo no mundo e do dólar no Brasil (também no exterior). Foi congelado o diesel por 60 dias, depois de que o preço será remarcado a cada 30, para dar previsibilidade aos usuários. O Tesouro banca o subsídio temporário, e não a estatal. O importante é também aumentar a concorrência no mercado de combustíveis.

Além disso, que a Petrobras não volte a ser usada de forma populista. Pois este é o modelo que destruiu a PDVSA venezuelana, e também o próprio país. Se a Petrobras é patrimônio nacional, mais um motivo para ser protegida do dirigismo e da demagogia.

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Política desastrosa

Paulo Pimenta

04/06/2018

 

 

A greve dos caminhoneiros, o desabastecimento e o caos gerado no país têm no governo Temer e no ex-presidente da Petrobras, Pedro Parente, os únicos responsáveis. A política de preços adotada para os combustíveis é desastrosa, caso contrário, o Brasil não teria mergulhado em uma situação de escassez semelhante à época da Segunda Guerra, quando não havia Petrobras, e o gasogênio foi usado aqui como alternativa.

A raiz do problema é que o governo abriu mão, em benefício do mercado (em especial Wall Street) e das petroleiras estrangeiras, do controle da maior e mais importante empresa nacional, pondo em risco a soberania e a segurança energética do país. Basta lembrar que do Conselho de Administração da Petrobras participam pessoas vindas da concorrência estrangeira e de entidades como Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), que representa interesses de concorrentes diretos da Petrobras.

Os combustíveis impactam diretamente o valor dos transportes públicos e dos fretes, que, por sua vez, se refletem nos preços de alimentos e produtos industrializados. Portanto, a política de preços que oscila conforme o câmbio e fatores externos atende ao mercado e não à população.

O governo é o controlador da empresa e, assim, não existe interferência, mas exercício da prerrogativa do controle de preços. A decisão de Temer de tirar dinheiro do SUS e outras áreas sociais para subsidiar o diesel, mantendo o lucro altíssimo da estatal, é um absurdo. Não é para atender os caminhoneiros, mas sim os fundos americanos, especuladores e acionistas da estatal.

Na raiz do preço do diesel (e da gasolina, do gás, querosene de aviação etc.), está a apropriação da riqueza gerada pelo petróleo. Durante os governos Lula e Dilma, os preços dos combustíveis e do gás de cozinha ficaram estáveis, e a Petrobras manteve seu lucro. Não teve prejuízo, como a mídia propaga; pode ter deixado de ganhar mais, mas atendeu a seus objetivos estratégicos. A Petrobras foi criada para gerir a riqueza do petróleo nacional em nome de todos, não de grupos privados, que devem ter ganhos como acionistas, mas dentro de limites razoáveis. Não podemos aceitar que dolarizem o petróleo brasileiro. O resultado vimos nos últimos dias.

Os preços externos não são formados essencialmente pela lógica de mercado, de acordo com critérios de oferta e demanda. Há fatores diversos, como pressões derivadas de guerra ou intenção bélica, e o jogo geopolítico. A própria subida ou queda do dólar depende de decisões do Tesouro dos EUA. O Brasil não pode ficar à mercê disso, pois é a população que paga a conta, embora seja dona da maior parte da empresa, via União. Atrelar o preço dos combustíveis ao dólar, como quis Pedro Parente, só beneficia acionistas — muitos deles fundos especulativos estrangeiros —, que, ao fim e ao cabo, são minoritários. Esperamos que, com a demissão de Parente, essa política de preços também seja demitida.