Título: Os investigadores quase anônimos
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 06/05/2012, Política, p. 4

Praticamente incógnitos, os responsáveis pelo Caso Cachoeira falarão em público pela terceira vez sobre o inquérito na CPI

Em 29 de fevereiro deste ano, três pessoas apareceram no auditório do Instituto Nacional de Criminalística (INC) para anunciar a prisão do bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e outras 34 pessoas. Foi a única vez que o trio, responsável pela investigação de um ano, apareceu junto publicamente. Esta semana eles voltam à cena para falar à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira, pressionados por deputados e senadores. No cotidiano, entretando, todos são discretos, trabalham sem alardes, e têm aversão aos holofotes.

A entrevista sobre Cachoeira foi dada pelos procuradores da República Léa Batista de Oliveira e Daniel de Resende Salgado e pelo delegado federal Matheus Mella Rodrigues. Os três conduziram a investigação que alcançou Goiás e o Distrito Federal, onde Cachoeira mantinha seus negócios com caça-níqueis. Léa e Daniel atuam no estado e se juntaram a Rodrigues, que é chefe do Núcleo de Inteligência da Polícia Federal no DF, já que havia agentes públicos da própria PF envolvidos no esquema. Do trio, aproximou-se o delegado Raul Alexandre Marques Sousa, que coordenou as investigações da Operação Vegas — origem dos trabalhos em torno de Carlinhos Cachoeira.

"Como bom chefe de um Núcleo de Inteligência, o delegado Matheus pouco aparece. Ninguém sabe quem é ele", define um de seus colegas da PF. Com oito anos de carreira, o policial de 35 anos que atuou na coordenação da Operação Monte Carlo com o Ministério Público é discreto até mesmo dentro da própria corporação. Poucas pessoas sabem de outros casos em que ele tenha atuado anteriormente, a não ser na repressão a entorpecentes, no Rio de Janeiro. Seu colega Raul Sousa, que chefia o mesmo núcleo em Goiás, age de forma idêntica. O comportamento também é dirigido aos dois procuradores da República, que trabalham em Goiás há mais de cinco anos. Léa foi juíza na Bahia e promotora em Brasília.

Novo estilo O perfil dos investigadores que atuaram na Operação Monte Carlo é o oposto dos procuradores da década passada que atuaram quando Cachoeira apareceu pela primeira vez no cenário nacional, em 2004. José Roberto Santoro já era um subprocurador da República de renome nacional — e teve holofotes intensos. Esteve à frente da apuração dos desvios na Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), que culminou com a prisão do senador Jader Barbalho (PMDB-PA). O outro integrante da apuração, Marcelo Serra Azul, hoje procurador regional da República em Brasília, também se notabilizou dentro do Ministério Público — e frequentou com a mesma intensidade o noticiário. Mesmo assim, o processo contra Waldomiro Diniz ficou emperrado por várias vezes devido à denúncia feita pelo MPF, mas rejeitada pela Justiça.

À época, os procuradores provocaram polêmicas envolvendo Cachoeira. A principal delas foi uma denúncia pela imprensa de um vídeo mostrando uma reunião de Santoro e outros dois procuradores, em fevereiro de 2004, com o empresário de jogos de azar para negociar a entrega da fita original que culminou com a demissão de Diniz da Casa Civil. Até então, o Ministério Público tinha apenas uma cópia do material. Não haveria nada demais se o encontro não tivesse acontecido de madrugada, na sede da própria Procuradoria-Geral da República, em Brasília. O episódio enfraqueceu a investigação, que poderia ter desvendado o esquema Cachoeira há oito anos. Santoro se aposentou e se tornou advogado, enquanto seus colegas, também presentes à reunião, continuam no MPF.

No caso atual, a aparição na CPI do Cachoeira será a terceira desde 29 de fevereiro. Antes disso, somente os dois representantes do Ministério Público voltaram a falar sobre o assunto para descrever, por pouco tempo, o conteúdo da denúncia feita à Justiça, dias depois. Os delegados saíram de cena e só voltarão a mostrar seus rostos na terça-feira, quando Raul irá depor na comissão. No dia seguinte será a vez de seu colega e dos dois procuradores.

Crise inaugural O primeiro tremor enfrentado pelo governo Lula, em 2004, veio com a revelação de um vídeo em que o então assessor da Casa Civil, Waldomiro Diniz, negociava contribuições de campanha com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. À época, a denúncia custou o cargo de Diniz e inseriu o contraventor no noticiário político, assim como os procuradores envolvidos no episódio.