O globo, n. 30983, 05/06/2018. País, p. 4

 

Pf investiga reforma na casa de Temer ligada a operador

Aguirre Talento e Bela Megale

06/06/2018

 

 

Planilha em empresa de coronel Lima aponta obra feita em 2000

-BRASÍLIA- A Polícia Federal obteve novas provas que revelaram ligação entre o coronel João Baptista Lima e uma reforma feita na residência do presidente Michel Temer no bairro de Alto de Pinheiros, em São Paulo, entre 1999 e 2000. Com isso, os investigadores passaram a apurar se a operação teve o objetivo de lavar dinheiro ilícito captado pelo coronel em nome de Temer. Lima é amigo do emedebista há mais de 30 anos e apontado como seu principal operador.

A suspeita surgiu depois que os policiais federais apreenderam na sede da Argeplan, uma das empresas do coronel Lima, uma planilha de projetos de arquitetura executados. Na linha 285 do documento, constava “residência Dr. Michel Temer”.

Essa reforma na casa de Temer, porém, não se tornará ponto central do inquérito dos portos, que investiga o presidente pela suspeita de beneficiar empresas do setor portuário em troca de propina. Isso porque o fato ocorreu há quase 20 anos, o que provocaria a prescrição dos possíveis crimes envolvendo a reforma.

A descoberta, contudo, será usada para corroborar as hipóteses de relações ilícitas entre o coronel e o presidente. A revelação dessa nova obra fortaleceu a hipótese investigada pela PF de que as reformas em imóveis eram usadas por Temer e pelo coronel Lima como uma forma de lavar dinheiro — a polícia já aprofunda a investigação em uma obra feita na casa de uma filha do presidente, Maristela.

O material, que está em análise pelos peritos da PF, foi apreendido na Operação Skala, deflagrada em 29 de março e que mirou amigos e empresários ligados a Temer. Na operação, Lima chegou a ser preso mas não prestou depoimento alegando problemas de saúde.

O coronel Lima é apontado como captador de propina em nome do emedebista. O GLOBO revelou em 19 de abril que um dos donos do grupo Libra, Gonçalo Torrealba, apontou o coronel Lima como um captador financeiro de Michel Temer e disse que ele foi pessoalmente à sede da empresa solicitar dinheiro para o emedebista. Em sua delação, os executivos do grupo J&F, controladora da JBS, afirmaram que pagaram R$ 1 milhão de propina a Temer via coronel Lima.

Na semana passada, a PF tomou o depoimento de um engenheiro da Argeplan que revelou ter sido indicado para executar a obra de reforma na casa de Temer, entre os anos 1999 e 2000. O engenheiro havia trabalhado na Argeplan como estagiário até 1994 e tinha uma relação de amizade com Carlos Alberto Costa Filho, que é filho de um dos sócios da Argeplan, Carlos Alberto Costa. Segundo seu depoimento, foi Carlos Filho quem lhe indicou para fazer a reforma na casa de Temer.

O engenheiro afirmou que realizou a substituição de acabamentos e reparos no telhado, em uma obra que durou aproximadamente um ano. Na época, ele não tinha vínculo formal de trabalho com a Argeplan. Em 2012, o engenheiro voltou à empresa para ser coordenador de projetos.

 

NOVOS DOCUMENTOS

Ainda sobre a reforma na casa de Temer, o engenheiro afirmou que entregava os orçamentos dos fornecedores e do seu serviço para o próprio Temer efetuar os pagamentos — mas não deixou claro se houve transferências bancárias e pagamentos diretos feitos por Temer. Ele afirmou que não havia ligação do coronel Lima com a obra, mas os investigadores suspeitam que Lima era responsável por acompanhar o assunto.

Procurada para comentar, a assessoria de Michel Temer afirmou que o emedebista pagou pela reforma e possui todos os comprovantes. Em resposta a perguntas feitas pela PF, Temer afirmou que o coronel Lima lhe ajudou em campanhas eleitorais, mas nunca atuou na captação de recursos financeiros. O coronel Lima e a mulher ainda não prestaram esclarecimentos à PF.

Também nas ações de busca feitas na Operação Skala, a PF encontrou documentos de empresas portuárias na casa de Carlos Alberto Costa, sócio do coronel Lima na Argeplan, como informou ontem o site G1. Foram encontrados uma bolsa com documentos da Rodrimar, uma das empresas que teriam sido beneficiadas por atos do presidente, além de arquivos com dados do Grupo Libra e da Codesp (Companhia de Docas de São Paulo). Estabelecer a ligação do coronel Lima com as empresas portuárias é o pontochave do inquérito que apura se Temer recebeu dinheiro para favorecê-las.