O globo, n. 30980, 02/06/2018. Economia, p. 21
Marthe Beck
Geralda Doca
Letícia Fernandes
Manoel Ventura
02/06/2018
Ministro de Minas e Energia antes havia cobrado ‘contribuição’ da estatal
As pressões do governo e seus aliados para mudança na política de preços da Petrobras, que resultaram na demissão de Pedro Parente, começaram antes mesmo do protesto dos caminhoneiros. E se acentuaram nos últimos dias, enquanto o governo buscava uma alternativa para acabar com a greve. Mas, antes disso, a cúpula do governo já se manifestava publicamente sobre a necessidade de a Petrobras praticar uma política de preços mais flexível e com “previsibilidade” — para evitar flutuações diárias — não só no diesel, mas também na gasolina.
Em meados de maio, quando chegaram a cinco aumentos seguidos em cerca de uma semana, Brasília intensificou as mensagens de que o modelo se esgotara. Com o avanço do movimento dos caminhoneiros, no dia 29, o próprio Temer indicou que poderia reexaminar a política de preços da estatal. Quando as pressões sobre a Petrobras pareciam ter chegado ao gabinete mais importante da República, o pedido de demissão do presidente da estatal, Pedro Parente, levou o governo a mudar radicalmente de discurso ontem.
‘TEMOS DE ENCONTRAR SOLUÇÃO’
Os ministros mais próximos do presidente, que diziam que os preços dos combustíveis praticados pela estatal estavam “subindo demais”, passaram a defender implacavelmente a política de preços da estatal.
— A política de preços da Petrobras é uma política de governo. Ela não vai ser mexida — disse ontem o ministro de Minas e Energia, Moreira Franco.
No dia 18 de maio, antes da demissão de Parente, o mesmo Moreira parecia menos convicto quanto à importância da política de preços. Na ocasião, Moreira afirmou publicamente que os valores dos combustíveis praticados pela estatal estavam “subindo demais”.
— É uma questão do governo, mas ela (Petrobras), como elemento importante e fornecedora de um bem fundamental, tem que dar a sua experiência, contribuição e avaliação da realidade para que possamos ter uma política de preço que seja justa — afirmou.
Na última terça-feira, em uma sessão na Câmara, Moreira voltou a falar do tema e citou a necessidade de criar um “colchão” para mitigar volatilidade no preço do combustível.
— Temos a necessidade de encontrar uma solução para a prática da Petrobras de buscar no mercado a referência para a composição de seus preços.
Na mesma linha de Moreira, já durante a greve, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmava que o presidente estava “preocupado com o aumento constante dos combustíveis”.
— O presidente da República, ao convocar a reunião, mostrou-se preocupado com o aumento constante dos combustíveis, e ele gostaria de ver isso resolvido de forma mais palatável por parte dos cidadãos, dos caminhoneiros e dos usuários do sistema de abastecimento dos combustíveis. Vamos tentar agora é ver se encontramos um ponto em que possa ter um pouco mais de controle nesse ponto [preços] — disse Padilha.
NO PALÁCIO, CRÍTICAS A PARENTE
O núcleo duro do governo criticava a política de preços da Petrobras, defendida por Pedro Parente, mas jamais imaginaria que o presidente da estatal pudesse se demitir — reforçando as suspeitas de intervenção governamental na estatal. A reação dos mercados e da classe política à saída de Parente irritou profundamente Temer e seus auxiliares.
Passada a surpresa inicial do presidente com o pedido de demissão, não faltaram críticas de interlocutores do Palácio do Planalto ao timing da saída do ex-presidente da estatal.
Auxiliares do presidente reclamaram do que chamaram de “oportunismo” de Parente, que, na avaliação desses auxiliares, “incendiou” o país com a decisão de deixar o governo no momento em que o Brasil deixava para trás a greve dos caminhoneiros, que começou por causa de aumentos no preço dos combustíveis e a discussão sobre a política de preços da Petrobras.
— O governo lamentou a saída do Parente e a forma como ele saiu. A atitude dele fica parecendo oportunismo.
Mas, ao escolher Ivan Monteiro como o novo presidente da Petrobras, o presidente Michel Temer quis dar um sinal ao mercado de que deve manter a atual política de preços da estatal. Monteiro foi recebido por Temer, Moreira e pelo ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, antes do anúncio.
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Oposição e políticos da base aprovam mudança
Eduardo Bresciani
Bruno Góes
Leticia Fernandes
02/06/2018
Presidenciáveis defendem nova política de preços de combustíveis
A saída de Pedro Parente da presidência da Petrobras jogou mais gasolina no debate no meio político sobre a política de preços da companhia. Mesmo integrantes da base aliada do governo Michel Temer se manifestaram a favor de alteração na metodologia que permite reajustes diários dos combustíveis. Presidenciáveis também manifestaram seu posicionamento sobre o tema.
O ex-ministro Ciro Gomes, pré-candidato do PDT, comemorou a saída de Parente e defendeu uma mudança na política de preços da companhia:
— É preciso exigir que a política de preços que ele impôs seja trocada. E ela não pode ser trocada por nada de demagogia. Apenas o seguinte, hoje estão transferindo o preço do barril de petróleo da especulação financeira para dentro do Brasil, quando o custo da Petrobras é muitas vezes menor do que o custo do petróleo lá fora.
Em sua conta no Twitter, Marina Silva, pré-candidata da Rede, afirmou que “faltou sensibilidade” a Parente:
“O ex-presidente da Petrobras pediu demissão, apesar de ter feito uma gestão bem avaliada pelo mercado, mas faltou sensibilidade ao repassar o aumento do preço do combustível direto ao consumidor, neste momento difícil da vida dos brasileiros”.
Geraldo Alckimin, presidente do PSDB e pré-candidato, defendeu que a estatal tenha uma política de preço que proteja os consumidores. “O importante é não desperdiçar o trabalho de recuperação da Petrobras. Precisamos definir uma política de preços que, preservando a empresa, proteja os consumidores”, escreveu o tucano no Twitter.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que a saída de Parente não é suficiente. “Não basta trocar o entreguista Pedro Parente na presidência da Petrobras. Tem de mudar sua política de preços para os combustíveis e a ofensiva privatista na empresa e na entrega do pré-sal. Tem de recuperar a Petrobras para o Brasil e para os brasileiros”, escreveu Gleisi, em suas redes sociais.
Ex-ministro da Fazenda do governo Temer e pré-candidato ao Planalto, Henrique Meirelles disse que Parente deu uma importante contribuição ao país ao resgatar a Petrobras da situação de "quase destruição provocada pelo governo anterior".
— A companhia tinha perdido as condições de assumir o custo de absorver as eventuais diferenças entre um preço mais estável e previsível e o custo de produção que varia com o preço do petróleo. É preciso criar um fundo de estabilização que amorteça eventuais oscilações no preço do petróleo e seja fiscalmente neutro no longo prazo.
A líder do MDB no Senado, Simone Tebet, afirmou que faltou “sensibilidade” a Parente e defendeu que a Petrobras tenha uma política de preços intermediária. “Nem tanto ao mar, nem tanto à terra: nem os preços subsidiados do passado, mas jamais a liberdade total de preço, sem sintonia com os números da economia — inflação e juros baixos, num período de recessão”, afirmou Simone, em nota, na qual também defende um “gestor político” para a empresa.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que é pré-candidato à Presidência da República, foi um dos poucos a lamentar a saída do executivo do comando da empresa. Segundo ele, a Petrobras só mantém a credibilidade se “colocar um quadro com a mesma qualidade de Pedro Parente”.
— (Pedro Parente) tem muita credibilidade e estava fazendo um ótimo trabalho. (A situação é) ruim para o Brasil — disse Maia ao GLOBO.
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), disse que o presidente da estatal precisa reunir visão empresarial, sensibilidade social e responsabilidade política. Após o início da greve dos caminhoneiros, ele criticou reiteradamente a política de preços da estatal.