O globo, n. 30979, 01/06/2018. País, p. 3
Em busca do voto evangélico
Patrik Camporez e Sérgio Roxo
01/06/2018
Convenção das Assembleias de Deus e Marcha para Jesus reúnem fiéis e pré-candidatos Ao lado de Meirelles e diante de milhares de pastores, Michel Temer comemorou fim da greve dos caminhoneiros e pediu orações; Bolsonaro quer senador evangélico como vice
A três meses do início oficial da campanha eleitoral, dois eventos que reuniram milhares de evangélicos no feriado de Corpus Christi, em São Paulo e em Brasília, abriram espaço para pré-candidatos, que aproveitaram a oportunidade para acenar a essa fatia do eleitorado — os evangélicos representam quase 30% da população brasileira.
Em Brasília, o presidente Michel Temer foi com o pré-candidato do MDB à Presidência, Henrique Meirelles, à assembleia geral da Convenção Nacional das Assembleias de Deus no Brasil, cuja plateia era formada por milhares de pastores da denominação. Em São Paulo, os pré-candidatos à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro, e pelo PRB, Flávio Rocha, estiveram na Marcha para Jesus, organizada pela Igreja Renascer. O evento contou ainda com as presenças do ex-prefeito de São Paulo João Doria (PSDB) e do governador Márcio França (PSB), ambos pré-candidatos ao governo paulista.
Depois de 11 dias de crise por causa da greve dos caminhoneiros e alvo de críticas pela condução das negociações com a categoria, o presidente Michel Temer — acompanhado de Meirelles — comemorou o fim da paralisação, diante de milhares de pastores.
— Me disseram: ‘Olhe, vá lá, no templo da Assembleia de Deus, comemorar a pacificação do país’. Com a graça de Deus, estamos encerrando a greve dos caminhoneiros. Pelo diálogo, que é o que eu prego — disse o presidente.
Temer, que já foi chamado de “bom cabo eleitoral” por Meirelles, aproveitou para propagar as “conquistas de seu governo” e pedir que os pastores levassem sua mensagem às igrejas de todos os rincões do país.
— Nesse momento em que vamos entrar numa disputa eleitoral, peço que avaliem nossos projetos, que são a favor do país. Que os senhores possam levar a todos e todas essas palavras, também de paz e harmonia, pois sei que os senhores têm templos nos lugares mais afastados — disse o presidente, enquanto membros da igreja puxavam aplausos.
O presidente da congregação religiosa, Manoel Ferreira, também pediu que seus pastores levem a palavra de Michel Temer aos fiéis espalhados pelo país, e reforçou: — Acima dele, só Deus e a nação. De olho no eleitorado religioso, o ex-ministro Henrique Meirelles entrou no templo junto com Temer e com o bispo Manoel Ferreira. Mesmo antes da pré-campanha, o ex-ministro da Fazenda já vinha apostando no público religioso como um eleitorado em potencial, participando de cultos de diferentes denominações. Ao falar em igrejas e em rádios de interior, Meirelles chegou a pedir que fiéis “orassem” pela economia do país.
BOLSONARO POSA COM BANDEIRA DE ISRAEL
Em São Paulo, o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) foi à Marcha para Jesus com o senador Magno Malta (PR-ES), a quem chamou de vice dos sonhos, “também por ele ser evangélico”.
A presença de Bolsonaro no palco foi anunciada por Magno Malta. O público se dividiu entre aplausos e algumas vaias. Bolsonaro posou com uma bandeira de Israel e disse apenas uma frase.
— Brasil acima de tudo, e Deus acima de todos — limitou-se a dizer aos fiéis.
Antes, em entrevista, Bolsonaro negou que sua presença na marcha fosse uma tentativa de se aproveitar do evento para conquistar os votos evangélicos. Também falou sobre as negociações para escolher o vice de sua chapa.
— Já mandei cartinha de amor para ele. O vice dos meus sonhos é o Magno Malta. Também por ser evangélico. Não nego isso. Não é para atrair o povo evangélico. Desde que cheguei na Câmara sempre marchei junto com a bancada evangélica.
O pré-candidato do PRB à Presidência, Flávio Rocha, também esteve na marcha, acompanhado do pré-candidato do PSDB ao governo de São Paulo, João Doria. Rocha, evangélico da Igreja Sara Nossa Terra, não falou com a multidão. Já Doria fez um rápido discurso.
— Estou aqui ao lado do Flávio Rocha, do Bruno Covas e de um milhão de pessoas que celebram Jesus. Quem ama sua família está aqui. Glória a Deus, glória ao Brasil e aos brasileiros, glória às pessoas que têm fé no coração — discursou Doria, que é católico.
Os dois se ajoelharam no palco enquanto o apóstolo Estevam Hernandes conduzia uma oração.
Adversário de Doria, o atual governador do estado, Márcio França (PSB), participou da marcha à tarde e ironizou o encontro entre o ex-prefeito e o presidenciável do PRB. França era vice do presidenciável tucano Geraldo Alckmin no governo paulista.
— Nada contra o Flávio Rocha. Acho que ele tem muito a ver com o Doria. São empresários e ricos. É normal que estejam juntos.
Geraldo Alckmin não foi ao evento e viajou para Pindamonhangaba, no interior paulista, para visitar as irmãs. À tarde, ele deixou uma mensagem para os simpatizantes da marcha em uma rede social. “Desde 2009 faz parte do calendário brasileiro e hoje milhões fazem parte deste ato que é uma declaração de fé que reúne todos os cristãos. Aproveito a data para relembrar o maior dos ensinamentos que Jesus Cristo deixou, uma mensagem de tolerância, que é amar ao próximo”, escreveu.
Católico, não é a primeira vez que o tucano deixa de participar do evento gospel. No ano passado, a ausência dele na festa rendeu alfinetadas públicas do apóstolo Estevam Hernandes.
Responsável pela organização da marcha, o líder da Igreja Renascer disse que nenhum presidenciável foi convidado para o evento, apenas autoridades. Sobre Bolsonaro, Estevam Hernandes disse que uma eventual adesão dependerá de ele deixar o tom mais agressivo de seu discurso de lado.
— O Bolsonaro tem, por enquanto, um discurso, mas não sabemos qual é exatamente o plano de governo. A base da evangelho que nós pregamos é de tolerância e de amor ao próximo.