Correio braziliense, n. 20182, 23/08/2018. Política, p. 2

 

"Bolsonaro vai atrasar o Brasil"

Alexandre de Paula

23/08/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 - A ex-diretora da Faculdade de Ciências da Saúde da UnB critica presidenciável do PSL e o adversário Alberto Fraga (DEM) por querer armar a sociedade. Para ela, o brasiliense sofre com o descaso em hospitais públicos

Candidata do PSol ao Palácio do Buriti, a professora universitária Fátima Sousa não poupou críticas ao presidenciável Jair Bolsonaro (PSL), em entrevista concedida,ontem,ao programa CB.Poder, parceria do Correio com a TV Brasília. De acordo com Fátima, a eleição de Bolsonaro representaria retrocesso para o país e para a capital.

Ela reprova também a atual gestão da saúde no DF e disse que, se eleita, vai acabar com o Instituto Hospital de Base. Na segurança pública, garantiu que a prevenção será o carro-chefe e afirmou que outros candidatos fazem promessas sem consistência para a área. Confira alguns trechos da entrevista, que faz parte da série que o CB.Poder faz com todos os candidatos ao GDF.

 

Qual o tema mais importante desta campanha?

O tema que mais nos abordam é a questão da saúde pública. Eu me sinto tranquila de discutir e mostrar que erraram pesadamente nessa questão. O jeito que os governos têm implantado a saúde no DF é um fracasso. Por onde estamos caminhando, a saúde é a maior dor dessa população. Por coisas simples. Não entendo como o governo não consegue fazer as cirurgias mais simplificadas. Poderia muito bem fazer mutirão de cirurgias eletivas e zerar as filas. Nosso governo não vai negligenciar essa matéria, até por dever de ofício.

 

A senhora critica o Instituto Hospital de Base. Chegou a dizer que acabaria com esse modelo. O que vai colocar no lugar do IHB?

Esse modelo nada mais é do que o Estado abrir mão da sua responsabilidade, que é inclusive constitucional. Não tem como o governo delegar ao setor privado o seu dever, que é a saúde pública. Nós não vamos abrir de gerir o Hospital de Base. Não só porque é o primeiro hospital da cidade, mas também porque é referência das principais especialidades que nós temos.

 

Quais suas propostas pontuais para a saúde?

A nossa proposta é voltar o Saúde em Casa, implantar agentes comunitários de saúde em todas as regiões. Os agentes de saúde fazem formação das pessoas nas cidades para que elas compreendam e aprendam a cuidar da própria saúde junto com os médicos e profissionais. Eles também geram emprego e renda. Brasília viveu isso quando Maninha foi secretária (de Saúde). Nós vamos garantir que o hospital seja o lugar de receber aquilo que a atenção básica não tem responsabilidade de fazer. Nós vamos equipar os hospitais, qualificar os profissionais e tê-los do nosso lado.

 

Jair Bolsonaro lidera pesquisas no DF, o que mostra um eleitorado mais conservador, de direita. Como a senhora, de esquerda, vai falar para esse eleitor?

Tem uma onda de conservadorismo galopante. Nós achávamos que isso não existia. Parece que eles estavam no armário e foram saindo velozmente. Temos que mostrar que as teses de Bolsonaro são incivilizadas. Não é possível o que ele defende. Por exemplo, armar a sociedade. Quando isso vai resolver os problemas que temos?

 

Nós temos um candidato aqui no DF que defende isso também, que é o Alberto Fraga, não é?

Sim. Mas Fraga é a imagem e semelhança de Bolsonaro. Se a população do DF votar em Fraga, nos outros e até na nossa concorrente mulher, saiba que são de um mundo conservador. Todos eles foram governo. Quem não foi governo fui eu. E eu não defendo as teses do Bolsonaro. Na questão da violência, ele defende bala contra bala, chama todos de bandido. Precisamos de uma sociedade pacífica. Quem votar em Bolsonaro vai atrasar o Brasil e o DF por mais quatro anos.

 

Se a senhora for eleita governadora com Bolsonaro presidente, como vai ser essa relação institucional com pensamentos tão diferentes?

Eu espero que a sociedade brasileira tenha juízo, saiba que é um retrocesso muito grande, que vai agravar os problemas do país e, consequentemente, do DF. Mas, se infelizmente a população errar dessa magnitude, terei uma relação civilizada.

 

Qual o projeto da senhora para segurança pública? Hoje a Polícia Militar e a Polícia Civil têm atritos. Como vai lidar com isso?

Os candidatos que me antecederam aqui fizeram promessas sem consistência. Sou professora e tenho muito cuidado com o que eu estou dizendo. O problema da segurança pública é muito sério, muito complexo. Não dá para chegar e dizer: “Vou integrar, vou fazer isso e aquilo”. Não é assim. Nós vamos cuidar dos servidores da segurança, eles estão em processo de adoecimento muito grave. Isso porque os governos criam desavença entre eles e fazem promessas que não são viáveis para acontecer. A violência, a bala contra a bala, não vai ser o nosso foco.

 

O GDF está com dificuldade de investimentos. Como fazer para pôr em prática o plano de governo sem recursos?

Com inteligência. Temos um capítulo chamado “economia a serviço da sociedade” no nosso plano de governo. Isso significa ter a curto, médio e longo prazos um plano de investimento. Então, nós vamos investir pesadamente na recuperação das escolas, nos hospitais, na atenção básica, no saneamento. Isso vai gerar consumo, emprego e mais tributos. Outra forma inteligente é não devolver os recursos que o GDF tem devolvido por falta de projetos. Também vamos investir em uma tributação progressiva. As pessoas têm que ser solidárias. Quem tem mais, deve colaborar. A classe média não precisa ficar com medo, não são vocês que vão pagar. Então, em síntese, é preciso acabar com o desperdício.

 

Um dos problemas do país é a corrupção, que tirou vários políticos das eleições. Permitir que Lula seja candidato não seria acabar com a Lei da Ficha Limpa? Não seria o mesmo que permitir a candidatura do ex-senador Gim Argello, do ex-governador José Roberto Arruda ou de Eduardo Cunha?

Vamos separar as coisas. Uma é você ser veementemente contra a corrupção. E eu sou. Tanto que vamos criar nas escolas processos educativos para as crianças aprenderem que qualquer hábito de corrupção não vai fazer bem a elas como cidadãs. Dito isso, o processo de Lula tem dúvidas. Juristas (de direita e de esquerda, nacionais e internacionais) dizem que o processo foi mais rápido que os demais. Não é certo colocar Lula na vala comum. Ele precisa estar livre para prestar conta dos erros e acertos do governo dele.