O globo, n. 30998, 20/06/2018. País, p. 4​

 

Com jatinhos, partidos usam R$ 4,5 milhões só em um ano

Marlen Couto

20/06/2018

 

 

Prestação ao TSE mostra que quatro siglas usaram mais voos particulares do que de carreira

O frete para transporte contratado por partidos políticos custou pouco mais de R$ 4,5 milhões em 2017, segundo levantamento do Núcleo de Dados do GLOBO no novo Sistema de Prestação de Contas Anuais, divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na semana passada. Das 34 legendas que prestaram contas, 15 tiveram despesas com o serviço no ano passado. Em quatro delas — DEM, PP, PSD e Avante — o desembolsado para fretes foi superior ao total gasto com passagens aéreas no mesmo período.

A contratação de frete de aeronaves é permitida e prevista pela legislação sobre gasto eleitoral, mas a diferença de preços em comparação aos voos comerciais é expressiva. Embora não seja possível saber o trecho contemplado por cada contrato, os dados mostram que o custo médio chegou a R$ 32,6 mil, valor seis vezes superior à média de faturas ou boletos de passagem aérea entregues pelos mesmos 15 partidos ao tribunal.

Não é possível saber, pelos dados divulgados, se todos os serviços foram pagos com recursos oriundos do fundo partidário, ou se foram bancados por outras receitas das siglas.

No ano passado, as legendas que tiveram maior gasto com frete de aeronaves foram o PT, DEM, PSDB e PP. Juntos, os quatro partidos foram responsáveis por 80% do total.

No caso do Democratas, a despesa de pouco mais de R$ 1,1 milhão com aviões particulares representou 70% do seu gasto com transportes em 2017. A prestação de contas do partido mostra que mais de 97% de suas receitas tiveram origem no fundo partidário.

Procurado, o DEM afirmou que parte do incremento dos gastos da legenda com o fretamento de voos em 2017 se deu à época em que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), realizou campanha para disputar o cargo. Maia foi eleito em fevereiro do ano passado, após ocupar um mandato-tampão.

Segundo o partido, a campanha exigiu o “deslocamento ágil do parlamentar a Brasília em situações distintas”. “Tido como uma das principais figuras da direção nacional do partido, Maia obteve o suporte do partido para realizar os compromissos que visavam à conquista do pleito”, complementou a sigla.

As viagens de dirigentes e correligionários corresponderam a 4% do total gasto pelos partidos em 2017. As prestações mostram que, somadas, todas as siglas gastaram R$ 19,4 milhões em despesas com passagens aéreas no mesmo período.

O PSDB argumenta que a contratação de aeronave para deslocamento de dirigentes partidários ocorre de acordo com suas agendas na forma permitida em lei e ressaltou que seu atual presidente nacional, Geraldo Alckmin (SP), sempre que possível, viaja em voos comerciais.

O PT, por sua vez, não respondeu à solicitação de esclarecimentos feita pelo GLOBO.

O percentual de gasto com aluguel de aviões também foi significativo, proporcionalmente, nas contas do Avante, que tem mais de 97% das receitas dependentes do fundo partidário e cujos fretes somaram mais da metade dos R$ 140 mil desembolsados em transportes no ano passado.

O partido diz que os fretamentos ocorrem para realização de deslocamentos para cidades que não possuem voos comerciais disponíveis.

Nos casos do PP e PSD, o aluguel de aeronaves representou quase 30% dos gastos na área. O peso do fundo partidário chega a 95% das receitas da primeira sigla e a 47% das do PSD, segundo a planilha do TSE. Em nota, o diretório nacional do PP ressaltou que foi responsável pelo gasto de apenas R$ 59 mil, pagos com recursos do fundo partidário. Os demais R$ 453,3 mil utilizados em serviços de frete de aeronaves tiveram origem em representações estaduais do partido no Acre, Espírito Santo, Mato Grosso, Roraima e em Santa Catarina, que têm autonomia administrativa e financeira. Procurado, o PSD não se manifestou sobre a alta proporção de gastos com o aluguel.

REPASSES A DIRETÓRIOS

Considerando todas as despesas declaradas ao TSE nas prestações de contas, os gastos dos partidos em 2017 totalizaram R$ 909,7 milhões. O principal gasto das 34 siglas foi com transferências de recursos a diretórios estaduais e municipais, além de candidatos. Os repasses somaram R$ 252 milhões, o equivalente a 26% dos gastos totais.

Em seguida, ficaram as despesas com pessoal, com montante de R$ 133,3 milhões, ou 14% dos gastos declarados, e com serviços técnicos, como consultoria jurídica , de informática e tecnologia que somaram R$ 110,6 milhões, 12% do total.

Na semana passada, um levantamento do GLOBO mostrou que, desde fevereiro de 2015, a Câmara dos Deputados já gastou R$ 9,9 milhões dos cofres públicos com aluguel de jatinhos e helicópteros.

Desde o ano passado, 68 parlamentares usaram dinheiro da verba da cota parlamentar para alugar aeronaves. Desses, dezoito deputados gastaram entre R$ 100 mil e R$ 400 mil com o fretamento. Na atual Legislatura, o campeão absoluto é Átila Lins (PP-AM), que usou R$ 923 mil com o fretamento de aeronaves para se deslocar no Amazonas.