Título: Marine Le Pen lava as mãos
Autor: Vicentim, Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 02/05/2012, Mundo, p. 14

A dama da extrema direita francesa subiu ao palanque para enterrar as aspirações de reeleição do presidente Nicolas Sarkozy. No tradicional desfile que a Frente Nacional (FN) realiza no 1º de Maio, Marine Le Pen disse aos correligionários que votará em branco, pois escolher Sarkozy seria uma "nova decepção" e votar no socialista François Hollande representaria uma "falsa esperança". A declaração, feita diante de centenas de simpatizantes reunidos diante da Ópera de Paris, consolida os anseios da FN de tornar-se uma poderosa força de oposição ao provável governo do Partido Socialista (PS). Pesquisas indicam que Hollande derrotará o presidente, neste domingo, por uma diferença de ao menos seis pontos percentuais.

Aglomerados diante de um palanque que evocava a heroína medieval Joana D"Arc, ícone da extrema direita francesa, os partidários da FN ouviram Marine entoar o tradicional discurso nacionalista e anti-imigração. "Cada um fará sua escolha. Eu farei a minha. Vocês são cidadãos livres e devem votar de acordo com sua consciência", recomendou a líder da extrema direita, que saiu do primeiro turno, no domingo retrasado, com 18% dos votos. Um homem de 53 anos ouvido pelo site da emissora France 24 resumiu o sentimento "anti-Sarkozy" que motivou muitos dos eleitores da ultradireita. "Meu sonho é ver a UMP (União por um Movimento Popular, partido do presidente) perder e se desintegrar antes das eleições legislativas", disse o entrevistado, um dos poucos negros presentes no comício.

A líder da FN voltou a enaltecer a votação histórica e a posição determinante que a legenda passou a ocupar no cenário político. "A campanha (do segundo turno) se estrutura em torno das nossas propostas", disse ela, que afirmou ter trazido "verdadeiros temas" ao debate. Os projetos anti-imigração e de intolerância religiosa, duas fortes bandeiras do partido, foram encampados sem maiores reservas por Sarkozy, que, segundo levantamentos eleitorais, precisaria conquistar entre 60% e 70% dos eleitores de Le Pen para reverter a vantagem de Hollande.

O presidente francês voltou a defender maiores restrições à admissão de estrangeiros como residentes. "Resignar-se à abolição das fronteiras é o primeiro ato pelo qual uma nação renuncia ao controle sobre seu futuro", discursou Sarkozy perante milhares de simpatizantes da direita, no dia tradicional dos desfiles das centrais sindicais — em geral alinhadas com a esquerda. "Ele conseguiu mobilizar um grande número de apoiadores. Na batalha de imagens, hoje (ontem) foi um bom dia para Sarkozy", disse ao Correio Bruno Cautrès, do Centro de Pesquisa Política de Paris.

No palanque, o mandatário criticou as propostas e os valores do PS e da esquerda. "Queremos grandes projetos para a França. Não queremos ciúme, igualdade, amargura, ódio, não queremos guerra de classes. Nós não queremos o socialismo." Em boa parte do discurso, Sarkozy abordou a crise financeira e expôs ideias para preservar os empregos dos franceses durante a avalanche econômica que vem soterrando a Europa. "O assunto, certamente, será um dos principais tópicos do debate de amanhã (hoje)", aposta o pesquisador Cautrès. Hollande e Sarkozy se enfrentam à noite, diante das câmeras das principais emissoras do país.

"Traição" O comício da UMP também evidenciou o atrito do presidente com as centrais sindicais, que lideraram um desfile até a emblemática Praça da Bastilha. Hollande decidiu não comparecer, mas cartazes e faixas em apoio ao candidato do PS foram exibidos pelos manifestantes, que também dirigiram ao presidente a palavra de ordem "caia fora". Na segunda-feira, Sarkozy havia acusado os líderes sindicais de "trair a causa do sindicalismo" por "pedirem votos para um candidato". Hollande contra-atacou: "Não posso aceitar que haja na França uma batalha contra o sindicalismo em pleno 1º de Maio".