O globo, n. 31036, 28/07/2018. País, p. 4

 

Mulheres se desfiliam da Rede após denunciarem machismo

Dimitrius Dantas

Jeferson Ribeiro

28/07/2018

 

 

Dissidentes da sigla de Marina alegam pressão para favorecer homens

A dificuldade para fechar alianças não é o único problema que a pré-candidata à Presidência Marina Silva tem dentro de seu partido, a Rede Sustentabilidade. Uma reunião do diretório de São Paulo, na madrugada de ontem, terminou com a desfiliação de três mulheres. Por trás da polêmica, há relatos de machismo, falta de incentivo às candidaturas femininas, críticas ao processo de decisão e distribuição de dinheiro, além de indícios de pressão da Executiva Nacional por uma candidatura ao Senado de fora do partido.

Uma das dissidentes é a presidente da Rede em Campinas, Maíra Schiavinato Massei, que tentaria se eleger deputada estadual. Em entrevista ao GLOBO, ela relatou que, em uma reunião recente, o porta-voz da Rede em São Paulo, Nilson Gonçalves, fez um pedido para que mulheres não abandonassem suas candidaturas, pois isso prejudicaria os candidatos homens. Segundo Maíra, Nilson disse que, como há uma cota de candidaturas femininas definida pelo Tribunal Superior Eleitoral, a saída delas reduziria o número de homens que poderiam se candidatar.

Durante a reunião, Maíra confrontou Nilson sobre a declaração, alegando que a considerou machista. Ele respondeu que não era machista porque “tinha mãe e irmã”.

— Toda aquela proposta de colocar pessoas novas na política, incentivar as candidaturas femininas e ser a voz da maioria cai por terra, e o que vemos aqui é um partido imerso nos velhos valores e vícios — disse Maíra.

Outra pessoa que estava na reunião confirmou a discussão e disse que a declaração de Nilson soou infeliz, embora o porta-voz venha buscando apoio às candidaturas femininas. Procurado pelo GLOBO, Nilson reafirmou que defende a participação de mulheres na política:

— É um partido que apoia as mulheres, mas existe uma consequência jurídica. A Rede precisa manter no mínimo os 30% (de candidaturas femininas) — disse Nilson.

— Todas as candidaturas femininas são de mulheres atuantes. Não existe a possibilidade de trazer a mulher como candidatura laranja. (Isso é) Inaceitável até porque nossa liderança é Marina Silva, uma mulher.

Após a reunião, duas outras mulheres deixaram o partido: Simone Dias e Surya Guimaraens.

— Eu me desfiliei porque não acredito mais no processo interno da Rede. Tem um abismo entre discurso e de fato o que se aplica. O que aconteceu foi decepção — afirmou Simone.

Surya queixou-se da falta de apoio que as candidaturas de mulheres vêm recebendo.

— Saio da Rede com esse sentimento de tristeza e de que não consegui cumprir o papel que eu tinha me proposto.

Principal colégio eleitoral do país, o estado de São Paulo é onde a Rede tem mais dificuldades para se firmar. Em setembro do ano passado, a sigla já teve dissidências no estado e no Rio de Janeiro. Além da dificuldade em angariar filiados em São Paulo, o partido não terá um candidato próprio ao governo local e não tem prefeitos para ajudar na campanha.

ATOR É COGITADO PARA VICE

Ontem, em meio às dificuldades da Rede para indicar um candidato a vice de Marina, o ator Marcos Palmeira passou a ser cotado como alternativa para formar a chapa na disputa presidencial. Segundo o porta-voz do partido Pedro Ivo Batista, o nome do artista passou a ser cogitado nos últimos dias, depois que o deputado Miro Teixeira, um dos mais próximos aliados de Marina, decidiu concorrer ao Senado.

— Ele passa a ser uma possibilidade, mas ainda não foi consultado — afirmou Batista.

O artista é filiado à Rede há alguns anos e sempre foi próximo à Marina, porque também milita pelas causas ambientais.

No início da semana, a presidenciável citou que havia boas “pratas da casa” em seu partido para formar a chapa, depois das tentativas frustradas de alianças. Na ocasião, porém, Marina mencionou Miro, o presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, e o economista Ricardo Paes de Barros, um dos idealizadores do programa Bolsa Família. E não fez menção ao ator.

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Rachada, esquerda faz novo esforço por unidade

Fernanda Krakovics

28/07/2018

 

 

Partidos devem se reunir na semana que vem, mas chance de acordo é mínima

Às vésperas do início oficial da campanha eleitoral, a esquerda ainda tenta acertar os ponteiros. As direções de PT, PCdoB e PSB marcaram reunião, na próxima quarta-feira, em Brasília, para discutir possíveis alianças na eleição presidencial. Convidados, PSOL e PDT não confirmaram presença. O grupo tem quatro pré-candidatos ao Palácio do Planalto. O PT e o PDT disputam o apoio do PCdoB e do PSB.

A presidente do PCdoB, deputada Luciana Santos (PE), não descartou ontem a possibilidade de a pré-candidata do partido, Manuela D’Ávila, virar vice na chapa do PT:

— Não posso falar sobre hipótese. Foi feita uma sondagem (pelo PT), e não um convite formal.

O PCdoB vinha condicionando a retirada de Manuela da disputa à unidade da esquerda, o que dificilmente acontecerá.

O encontro, na sede do PSB, está marcado para o mesmo dia da convenção nacional do PCdoB.

— Nessa eleição, as chapas vão ser definidas nos pênaltis, não vai ser nem na prorrogação — disse Luciana Santos, que teve a iniciativa da reunião.

Dirigentes do PDT dizem não ter mais expectativa de conquistar o apoio do PCdoB para a pré-candidatura de Ciro Gomes e apostam no PSB para tentar superar o isolamento político. Depois de negociar com Ciro, o centrão — DEM, PP, PR, PRB e SD — fechou acordo com o pré-candidato do PSDB, Geraldo Alckmin.

O presidente do PDT, Carlos Lupi, disse não saber se irá à reunião por causa de outros compromissos. E descartou a possibilidade de união da esquerda.

— A única cobiça virou o PSB — disse Lupi.

O PSB está dividido entre o apoio a Ciro e a neutralidade.

Diante do impasse, o governador de São Paulo, Márcio França, passou a defender, nos últimos dias, o lançamento de candidatura própria, o que gerou reações internas.

— O PSB precisa se posicionar, mesmo que sua opção não represente 100% do partido. Temos que ter um palanque para defender ideias, para participar do debate nacional. Inventar candidatura de improviso seria uma grande perda de tempo — disse o vice-presidente de Relações Governamentais do PSB, Beto Albuquerque (RS), que defende o apoio a Ciro.

O PSOL, por sua vez, oficializou, em convenção, a pré-candidatura de Guilherme Boulos à Presidência, e o PT pretende registrar o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mesmo com ele preso e atendendo os requisitos da Lei da Ficha Limpa, por ter sido condenado em segunda instância. A estratégia dos petistas é esticar a corda e substituir o expresidente na disputa após a provável impugnação de sua candidatura pelo Tribunal Superior Eleitoral.