O globo, n. 31035, 27/07/2018. Economia, p. 18
Nova fase da zelotes mira fruades no Carf
Mateus Coutinho
27/07/2018
Economista Roberto Giannetti, ligado & Alckmin, e Daniel Godinho, ex-secretário de Dilma, são investigados
-BRASÍLIA- A Policia Federal (PF) deflagrou, ontem, a 10ª etapa da Operação Zelotes, para investigar suspeitas de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo conselheiros e ex-conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ), o ex-secretário de Comércio Exterior no governo Dilma Rousseff Daniel Godinho e o empresário e economista Roberto Giannetti da Fonseca, ligado ao PSDB e aos pré-candidatos do partido à Presidência, Geraldo Alckmin, e ao governo de São Paulo, João Doria. No total, foram cumpridos 11 mandados de busca contra sete pessoas físicas e duas jurídicas nos estados do Rio de Janeiro, Pernambuco, São Paulo e Rio Grande do Sul, além do DF.
No caso de Giannetti, quebras de sigilo bancário indicam que sua empresa, a Kaduna Consultoria, teria recebido R$ 8 milhões da Paranapanema, companhia que conseguiu se livrar de débitos tributários no Carf. A Kaduna teria repartido os valores igualmente entre o economista, uma então conselheira do Carf e um advogado que atuou no caso. Com isso, descontados os impostos, cada um teria ficado com R$ 2,2 milhões.
ECONOMISTA SE AFASTA DA CAMPANHA DE DORIA
Horas depois de ter endereços vasculhados por policiais federais, Giannetti pediu afastamento da campanha do PSDB em São Paulo. Ele era o coordenador geral do programa de governo de Doria. De acordo com a campanha do candidato, “o objetivo do afastamento (de Giannetti) é se dedicar à elaboração de sua defesa nas investigações da Operação Zelotes.”
O economista foi um dos cotados para coordenar a área econômica da campanha de Alckmin à presidência, mas o tucano optou por Pérsio Arida.
— Ele não faz parte da nossa equipe e nunca fez parte do governo, mas participou e participa das nossas campanhas (do PSDB) — disse Alckmin, durante entrevista após receber o apoio do centrão.
Mesmo assim, Giannetti está formulando documentos para subsidiar os tucanos.
Existe a suspeita de que Giannetti teria agido em conjunto com o advogado Vladimir Spíndola e a então conselheira do Carf Meigan Sack Rodrigues, estes dois últimos já denunciados em outras etapas da Zelotes, acusados de fraudarem processos no Tribunal da Receita e, no caso de Spíndola, de atuar em esquema de compra de medidas provisórias (MPs). Spíndola, inclusive, foi alvo de buscas nessa nova etapa da operação. Além de centralizar o recebimento e a distribuição dos recursos por meio da Kaduna, os investigadores apuram se o economista teria interferido junto ao governo federal para que a Procuradoria da Fazenda desistisse de cobrar débitos da Paranapanema.
— Não foram encontradas provas de que a empresa do economista teria, de fato, prestado serviços para a Paranapanema — afirmou o procurador da República Frederico de Carvalho Paiva, em entrevista coletiva.
O nome de Giannetti entrou no radar da operação nas investigações internas da divisão de investigação da corregedoria do Ministério da Fazenda e quebras de sigilo de e-mails e telefones autorizadas pela Justiça Federal. Ex-secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior no governo Fernando Henrique Cardoso, Giannetti tem experiência na área de comércio internacional. Sua empresa foi contratada pela Paranapanema, que atua no refino de cobre e na produção de fios, barras e outros produtos a partir do metal, justamente quando ela enfrentava um processo no Carf sobre impostos cobrados na importação de insumos utilizados para produtos a serem exportados.
SUSPEITAS SÃO INFUNDADAS, DIZ GIANNETTI
A Kaduna conseguiu decisão favorável do Carf, publicada em 5 de junho de 2014, e a livrou de pagar cerca de R$ 650 milhões, em valores atualizados, que a Receita vinha cobrando relativamente à importação de insumos. Da decisão ainda cabia recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que representa a União e poderia insistir na cobrança da empresa nas instâncias superiores.
Foi devido a um e-mail do próprio Giannetti para a então gerente jurídica da Paranapanema, no mesmo dia da publicação do acórdão, porém, que os investigadores concluíram que poderia haver articulação ilícita junto ao governo para que não fosse questionada a decisão do Carf. Nele, Giannetti diz:
“Creio que o ministro Mauro Borges e o Secretario Daniel Godinho do Mdic estarão se empenhando sobre este caso paradigmático, de forma a dialogar com a Fazenda e a PGFN sobre a inconveniência de recorrer desta decisão já promulgada”. Ao fim da mensagem ele avisa ainda que informará à empresa “o mais breve possível se soubermos de novidades deste processo”.
Em nota, Giannetti afirmou que “são totalmente infundadas as suspeitas levantadas contra si e sua empresa”. Ele disse estar aberto a prestar qualquer esclarecimento.
A PGFN encaminhou trecho da justificativa do então procurador da Fazenda em 2014 para não recorrer do acórdão do Carf que livrou a Paranapanema de débitos da ordem de R$ 650 milhões: o procurador apontou que não havia nenhum entendimento diferente em outros julgamentos do Carf sobre a política de incentivo à exportação e que, por isso, não caberiam os recursos à decisão.
O criminalista Brian Alves Prado, que defende Spíndola, informou que o advogado prestou os serviços jurídicos e recolheu os tributos devidos e que seu cliente já foi alvo de buscas pelos mesmos motivos na Zelotes no passado.
Em nota, a Paranapanema informou que a companhia e seus administradores ou gestores atuais não foram alvo ou notificados oficialmente. E afirma repudiar “quaisquer atos de ilegalidade”, tendo “rigorosas políticas de controle e conformidade”. Ao “Jornal Nacional”, Godinho afirmou que está tranquilo quanto à legalidade de seus atos e permanece à disposição das autoridades.