O globo, n. 31021, 13/07/2018. País, p. 6

 

Lula consegue a 1ª absolvição na Lava-Jato

Mateus Coutinho

13/07/2018

 

 

Petista era acusado de obstrução da Justiça na compra de silêncio de Cerveró; Esteves também é inocentado

O juiz Ricardo Soares Leite, da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, absolveu ontem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-senador Delcídio Amaral, o pecuarista José Carlos Bumlai, o banqueiro André Esteves e outras três pessoas. Eles eram acusados de obstrução da Justiça envolvendo a suposta tentativa de Delcídio de comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, que acabou assinando um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2015.

É a primeira absolvição do ex-presidente Lula na Lava-Jato, mais de dois anos após a denúncia apresentada contra ele pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Em 2015, Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras, gravou conversas com o então senador na qual teria sido acertado o pagamento de R$ 50 mil mensais com o apoio do banqueiro André Esteves para evitar que Cerveró delatasse. O episódio levou à prisão de Delcídio naquele ano. Ele teve o mandato no Senado cassado e foi solto depois de fechar um acordo de delação.

Com a perda do mandato, o caso foi para a primeira instância, na Justiça Federal em Brasília. A decisão de absolver Lula e Esteves já era esperada, uma vez que a própria Procuradoria da República no DF havia pedido a absolvição dos dois por entender que não há provas de que eles teriam participado da tentativa de comprar o silêncio de Cerveró.

O procurador Ivan Cláudio Marx, porém, pediu a perda dos benefícios do acordo de colaboração e a condenação de Delcídio Amaral, do advogado Edson de Siqueira Ribeiro Filho e dos demais denunciados: Maurício Barros Bumlai, José Costa Barros Bumlai e o ex-chefe de gabinete de Delcídio Diogo Ferreira Rodriguez. No caso de Ferreira, que também fez delação, o MPF defendeu que benefícios decorrentes da colaboração deveriam ser mantidos. Todos os sete denunciados originalmente, porém, foram absolvidos.

Para o procurador, ao contrário do que afirmou Delcídio — tanto na colaboração quanto no depoimento à Justiça —, o silêncio de Cerveró, que à época cumpria prisão preventiva, não foi encomendado ou interessava a Lula, mas sim ao próprio senador.

SEM PROVAS SUFICIENTES

O juiz, no entanto, entendeu que a investigação e a ação penal não reuniram provas suficientes para condenar ninguém.

“A instrução, a meu sentir, não possibilitou a reconstrução da realidade fática, o que impede qualquer decreto condenatório. Há inúmeras possibilidades e circunstâncias do que realmente ocorreu, incluindo a probabilidade real de que os pagamentos foram solicitados por Bernardo e Cerveró de forma premeditada. Há, então, clara a intenção de preparar o flagrante para depois oferecer provas ao Ministério Público. Mesmo assim, a prova fornecida (a gravação obtida) foi deficiente. Não esclarece vários pontos, ensejando dúvidas e omissões”, escreveu o magistrado.

“Assim, o áudio captado não constitui prova válida para ensejar qualquer decreto condenatório. Há suspeitas também de ocultação de fatos por Bernardo e Cerveró. Causa estranheza a afirmação de Delcídio no sentido de se referir a André Esteves como ‘nosso amigo lá, de São Paulo’. O ponto é nebuloso, tendo Bernardo e Nestor não detalhado esta situação. Aliás, negaram qualquer menção a André Esteves anterior, o que contraria o áudio captado”, sustenta o juiz federal na sentença.

O juiz apontou ainda que, ao longo da instrução do processo, foi mencionado que haveria “exagero” nos episódios que foram relatados pelos delatores (Cerveró e seu filho), “tendo outros colaboradores obtido informações passadas por Nestor quando este estava na prisão”.

Em nota, o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, afirmou que a defesa “sempre demonstrou que a acusação se baseou em versão criada por Delcídio Amaral para obter benefícios em acordo firmado com o Ministério Público Federal”.

A defesa de André Esteves, a cargo dos advogados Sepúlveda Pertence, Sonia Ráo e Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, destacou que “já afirmava a absoluta confiança na absolvição” e classificando como “completamente desnecessária e abusiva” a prisão do banqueiro em 2015.

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Políticos têm 40 casos arquivados

Cleide Carvalho

13/07/2018

 

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) já arquivou pelo menos 40 inquéritos e investigações de corrupção, lavagem de dinheiro e caixa 2 que envolviam políticos citados por delações da Lava-Jato ou de executivos da J&F. A maioria não seguiu adiante por falta de provas. Em sete casos, os ministros concluíram que os fatos investigados estavam prescritos devido à idade dos envolvidos. Quando o acusado tem mais de 70 anos, o tempo de prescrição cai pela metade.

A Segunda Turma do STF rejeitou, por exemplo, uma denúncia oferecida contra o senador Romero Jucá por corrupção e lavagem de dinheiro, por falta de elementos concretos que comprovassem que houve negociação para aprovação de MP 627/2013.

Em outra decisão, o ministro Alexandre de Moraes chegou a classificar como “injusto constrangimento” as investigações contra os ex-governadores do Amazonas Eduardo Braga e Omar Aziz. Arnaldo Cumplido, um dos delatores da Odebrecht, havia relatado pagamentos de propina na construção da ponte sobre o Rio Negro.

Todos os envolvidos nas investigações arquivadas sempre negaram as irregularidades.