Correio braziliense, n. 20161, 02/08/2018. Política, p. 2

 

Arma-se o jogo do PT

Luiz Carlos Azedo

02/08/2018

 

 

Depois da aliança em torno do tucano Geraldo Alckmin, na qual DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade se juntam ao PSDB, ao PSD, ao PTB e ao PPS, a movimentação mais importante até agora no tabuleiro eleitoral foi feita pelo PT, que conseguiu costurar por baixo uma aliança com o PSB em 11 estados e anular qualquer possibilidade de a legenda fechar com o candidato do PDT, Ciro Gomes, no plano nacional. Hegemonizado pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara, o PSB também abriu mão da candidatura de Márcio França, em Minas Gerais, em troca da retirada do nome de Marília Arraes, candidata petista em Pernambuco. Sem candidato a presidente da República, a legenda optou por liberar seus caciques regionais.

Com isso, a movimentação do PT para viabilizar os candidatos do partido nos estados começa a predominar em relação à manutenção da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso em Curitiba. Tudo indica que a legenda vai mesmo lançá-lo à Presidência na convenção de sábado, em São Paulo, e forçar a barra junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para registrar seu nome, mas está difícil encontrar um aliado coadjuvante para a manobra, até porque a tendência do PT é indicar o “poste” que irá substituí-lo como vice já na convenção. Ontem, Manuela D’Ávila teve o nome confirmado pelo PCdoB, que sonha com a vice na chapa petista tão logo Lula seja substituído. Por ora, não há outros pretendentes.

Marqueteiros fazem as contas da capacidade de transferência de votos de Lula, que lidera as pesquisas de opinião quando seu nome é consultado, com 30% de intenções de votos. Imagina-se que o petista alavancará de 17% a 22% dos votos para o “poste” que vier a apoiar, garantindo-lhe um lugar no segundo turno. O problema é que os mais cotados para substituir Lula, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ex-governador da Bahia Jaques Wagner, largam bem atrás dos demais candidatos, na faixa dos 2% de intenções de voto.

Nos cálculos otimistas dos petistas, o candidato a ser escolhido por Lula estará seguramente no segundo turno. Vem daí a gana dos militantes contra os “coxinhas” e “golpistas”, o “apagão” moral de artistas, intelectuais e sindicalistas em relação ao propinoduto da Petrobras e outros escândalos, a campanha ensandecida de seus advogados e parlamentares contra a Operação Lava-Jato, sem falar nas afrontas da cúpula partidária ao Judiciário. Com a faca nos dentes, a legenda quer revanche. Esqueçam Jair Bolsonaro (PSL), em segundo lugar nas pesquisas e favorito no pleito sem Lula na disputa. O inimigo principal do PT é o tucano Geraldo Alckmin. Caciques do PMDB, como Renan Calheiros e Eunício de Oliveira, que votaram a favor do impeachment, já foram perdoados.

 

Indicação

A narrativa de vitimização do ex-presidente uniu e mobilizou a militância petista, que acredita na rápida transferência de voto para o nome ungido pelo líder. É aí que surgem os problemas. Há três candidatos que disputam o espólio lulista no eleitorado. O primeiro é Ciro Gomes, principalmente no Nordeste, não foi à toa o esforço realizado para impedir sua aliança com o PSB; o segundo, Marina Silva (Rede); e o terceiro, Guilherme Boulos (PSOL). Álvaro Dias (Podemos) atrapalha mais o tucano Geraldo Alckmin, principalmente no Sul do país.

A propósito, fora de São Paulo não será fácil a transferência de votos para Haddad, apesar os modos mais refinados e perfil acadêmico do ex-ministro da Educação de Lula. Teria apoio da militância sindical e nas universidades federais, mas isso não basta para alavancar uma candidatura majoritária nacionalmente. A outra opção é Jaques Wagner, carioca abduzido pela Bahia, que teria mais trânsito no Nordeste e não teria tantas dificuldades no Sudeste. O problema é que a seção paulista do PT não quererá abrir mão das vantagens que a candidatura do ex-prefeito oferece para a sobrevivência de seus parlamentares.

A grande contradição da estratégia petista é a confrontação com o Judiciário, ao radicalizar o discurso contra a Lava-Jato em defesa de Lula. A manutenção de uma candidatura que todos sabem inelegível, aproveitando-se dos prazos do calendário eleitoral e dos ritos de registro de chapas, perturba o processo eleitoral. Quanto mais bem-sucedida a estratégia no plano eleitoral, mais desestabilizadora será institucionalmente, pois coloca em xeque o Supremo Tribunal Federal (STF). Para o PT, a preservação da democracia e suas instituições é uma responsabilidade dos demais atores políticos. Ou seja, a legenda regrediu à época em que se recusou a votar em Tancredo Neves no colégio eleitoral para derrotar Paulo Maluf, não por acaso um aliado do governo Lula e do ex-prefeito Haddad.