Título: Acordo para Gurgel depor por escrito
Autor: Gama, Júnia; Valadares, João; Mascarenhas, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 10/05/2012, Política, p. 4

OPERAÇÃO MONTE CARLO

Procuradoria-Geral da República e integrantes da CPI do Cachoeira negociam para que a iminente convocação fique limitada a um questionário enviado pelos parlamentares

A Procuradoria-Geral da República (PGR) lançou ontem uma ofensiva para tentar livrar Roberto Gurgel de uma iminente convocação à CPI que investiga as relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com políticos e empresas públicas e privadas. Assessores parlamentares do procurador-geral da República passaram a quarta-feira em telefonemas com deputados e senadores para transmitir dois recados ao Congresso: o primeiro, de que Gurgel está pronto para entrar com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) caso seja convocado pela comissão; o segundo, um apelo para que o procurador-geral possa responder às perguntas da CPI por escrito, evitando o constrangimento de passar por um duro interrogatório.

O pedido dos assessores de Gurgel aos parlamentares é para que aprovem na CPI um requerimento que determine o envio de perguntas por escrito ao procurador-geral, que seriam respondidas por ele, também por escrito, resguardado o sigilo das informações. A manobra é uma tentativa de evitar que Gurgel sofra o desgaste de ser questionado durante horas a fio por petistas ligados aos envolvidos no escândalo do mensalão, que desejam expô-lo a poucos meses do julgamento dos réus no Supremo.

A ação ocorreu um dia após o depoimento do delegado da Polícia Federal Raul Alexandre Marques de Souza à CPI, quando ganhou força entre os integrantes da comissão, inclusive da oposição, o discurso pela convocação de Gurgel. Na CPI, o delegado expôs que, um mês após encaminhar o inquérito da operação Vegas à subprocuradora criminal Cláudia Sampaio, mulher de Roberto Gurgel, ela afirmou que não havia provas contundentes contra os parlamentares citados e que, portanto, nada seria feito sobre o caso em relação às pessoas com foro privilegiado.

Àquela altura, já havia sido constatada a participação do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) e dos deputados federais Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO) e Sandes Júnior (PP-GO) na organização criminosa. O inquérito, então, foi interrompido e engavetado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em setembro de 2009.

Em outra frente, integrantes da CPI se mobilizam para convocar a subprocuradora Claudia Sampaio. O senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP) vai apresentar o requerimento de convocação da mulher de Gurgel, que, segundo o delegado, foi quem informou à Polícia Federal, verbalmente, que a investigação não continha elementos suficientes para gerar denúncia contra Demóstenes.

O senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), até anteontem contrário ao comparecimento de Gurgel, agora considera insustentável a situação dele. Embora ainda não defenda a convocação, o senador paraibano afirma que o procurador-geral terá que prestar esclarecimentos, seja presencialmente ou respondendo a questionamentos por escrito. “A vinda dos dois procuradores responsáveis pelo inquérito, amanhã (hoje), deverá tornar irreversível o movimento da CPI na direção de exigir explicações do Gurgel. Por que não fez denúncia? Se não tinha elementos, por que não arquivou? Por que, mais adiante, ofereceu denúncia usando itens da Vegas? Precisamos ter essas respostas”, justificou.

Depoimentos O relator da CPI do Cachoeira, deputado Odair Cunha (PT-MG), assegurou, por meio da assessoria de imprensa, que os integrantes da comissão vão apreciar e votar, na próxima reunião administrativa, marcada para a quinta-feira que vem, requerimento para quebra do sigilo bancário, fiscal e telefônico de Demóstenes Torres. Na semana passada, a CPI decidiu quebrar os sigilos de Cachoeira. Os dados ainda não chegaram. O pedido abrange movimentações bancárias dos últimos 10 anos.

Hoje, os trabalhos na CPI serão retomados. A partir das 10h30, o delegado da Polícia Federal Matheus Mela Rodrigues, responsável pela Operação Monte Carlo, e os procuradores da República Daniel de Rezende Salgado e Lea Batista de Oliveira serão ouvidos.

"Por que não fez denúncia? Se não tinha elementos, por que não arquivou? Precisamos ter essas respostas" Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), senador

Ataque aos mensaleiros

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, reagiu ontem às críticas que tem recebido de integrantes da CPI do Cachoeira. Segundo ele, as acusações de omissão por não ter pedido em 2009 a abertura de inquérito contra o senador Demóstenes Torres partiram de pessoas que estão com medo do julgamento do mensalão, que pode ser realizado ainda neste semestre.

“O que temos são críticas de pessoas que estão morrendo de medo do julgamento do mensalão. São pessoas que aparentemente estão muito pouco preocupadas com as denúncias (do caso Cachoeira) e muito preocupadas com a opção que o procurador-geral, como titular da ação, tomou em 2009, opção essa altamente bem-sucedida”, destacou Gurgel. No último sábado, o Correio antecipou que o procurador-geral já considerava que o movimento pela convocação dele para depor na CPI do Cachoeira como uma represália feita por políticos que temem o julgamento do mensalão.

O procurador-geral repetiu ontem que se um eventual inquérito tivesse sido aberto contra Demóstenes em 2009, a Operação Monte Carlo não traria “esses fatos que vieram à tona”. Para Gurgel, pessoas com notórias relações com réus do mensalão têm tentado imobilizar seu trabalho. “Acho que senão réus há protetores de réus que estão como mentores disso”, acusou.

Na avaliação do procurador-geral, os vazamentos de dados sigilosos do inquérito que tramita no Supremo são os mais “escandalosos” da história do país. Gurgel já pediu que a Polícia Federal apure a quebra do segredo de Justiça. “É preciso que se pare com essa coisa do país de achar que o sigilo é para inglês ver”, afirmou.

Petistas

O líder do PT no Senado, senador Walter Pinheiro (BA), rebateu a acusação de que um possível depoimento de Gurgel na comissão seria uma maneira de enfraquecê-lo em virtude do julgamento do mensalão. “Não fomos nós que escolhemos que as denúncias contra Cachoeira só viessem agora. Se eu pudesse escolher, queria que viessem antes da eleição de 2010. Se alguém deixou para que essa situação só chegasse agora, não foi a base do governo”, ironizou Pinheiro. Já o senador Humberto Costa (PT-PE) também criticou Gurgel: “Não sei nem o que dizer. É uma colocação extremamente infeliz. Ele fez um juízo desrespeitoso do Congresso e da CPI