Correio braziliense, n. 20219, 29/09/2018. Política, p. 4
PT encaminha para fiasco no Acre
Paulo Silva Pinto
29/09/2018
No estado comandado há 20 anos pelo partido, Bolsonaro tem sete vezes as intenções de voto de Haddad. Petistas devem ficar fora do Executivo e do Senado. Para o governo local, a presidente da CUT apoia o candidato do PP
O PT corre o risco de sofrer no Acre a derrota mais acachapante nestas eleições em todos os níveis: presidente, governo local e Senado. Há exatos 20 anos, iniciou-se a hegemonia do partido no estado, que deve acabar neste pleito.
O senador petista Jorge Viana dificilmente será reeleito. Conhecido pela capacidade de diálogo com políticos de outras legendas e pela moderação no discurso, ele parece ter perdido ambos os atributos: no primeiro caso, pelo isolamento petista depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff, e, no segundo, exatamente pela dificuldade que a postura de enfrentamento do PT tem implicado na construção de alianças.
Alguns meses atrás, Viana protagonizou dois episódios que demonstram isso. A portas fechadas, em uma reunião partidária, exaltou-se com a presidente nacional da legenda, senadora Gleisi Hoffmann (PR). Ela se mostrava irredutível na determinação de impedir alianças com partidos que votaram a favor do impeachment de Dilma. Percebendo o tamanho da dificuldade que isso iria lhe impor no Acre, ele esmurrou a mesa, se levantou e gritou: “Gleisi, você precisa parar com esse negócio de golpismo. Isso não vai nos levar a lugar nenhum!” Saiu sem ouvir a resposta dela.
O outro episódio em que Viana perdeu a calma foi público. Ele ia do plenário ao seu gabinete quando, em um corredor, bateu o olho num aparelho de tevê e viu a continuação da sessão que acabara de deixar. O senador Petecão (PSD-AC) fazia críticas ácidas ao governo do petista Tião Viana, irmão de Jorge, que voltou imediatamente ao plenário. Mal chegou, abriu o microfone e começou a bater boca com Petecão. O senador Acir Gurgacz (PDT-RO), que presidia a sessão, teve de pedir que Viana parasse de interromper o colega que estava na tribuna.
Há duas décadas, a história do PT no Acre era o oposto do que se vê hoje. Jorge era eleito governador em primeiro turno, com 57% dos votos válidos. Tião ganhava a única vaga de senador em disputa. Naquele ano, o PT conquistou apenas um outro governo estadual, o do Rio Grande do Sul, mas, nesse caso, depois de uma contenda acirrada no segundo turno.
É verdade que o presidente Fernando Henrique Cardoso, reeleito, venceu no estado em 1998, derrotando Luiz Inácio Lula da Silva. Mas não se pode esquecer de que o PSDB, incrivelmente, estava na ampla coligação dos irmãos Viana, com 10 partidos no total. Incluía até mesmo o PSL, que hoje abriga o candidato à Presidência Jair Bolsonaro.
Neste ano, o capitão reformado do Exército vai muito bem no estado. Aliás, em nenhuma outra unidade da Federação tem números tão favoráveis para apresentar, de acordo com os dados mais recentes do Ibope. Dispõe de 53% das intenções de voto. Marina Silva (Rede) vem depois, com 11%. Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT), têm 8%. Fernando Haddad (PT), 7%. Se, na média nacional, Bolsonaro e o ex-prefeito de São Paulo estão empatados, no Acre, o primeiro tem sete vezes o percentual do segundo.
Desencanto
Marina Silva é outro capítulo da transformação da política local. As pesquisas não sugerem que ela tenha qualquer chance de repetir o desempenho de 2014, quando venceu no estado a eleição para presidente. A maior parte dos votos dados a ela foram, no segundo turno, para Aécio Neves (PSDB), que venceu Dilma Rousseff no estado com quase o dobro dos votos. O desencanto dos acrianos com o PT já estava claro ali.
Marina foi eleita senadora pelo PT do Acre em 1994, com apenas 36 anos. Abriu caminho para a chegada do partido ao governo no pleito seguinte. Não foi só uma vitória esplendorosa a de 1998. Ela pavimentou o caminho para a construção de uma hegemonia no estado. Desde 1998, foi governado por petistas: Jorge Viana, Binho Marques e, desde 2011, Tião Viana.
Neste ano, quem busca a vaga pelo PT é Marcus Alexandre, prefeito de Rio Branco entre 2013 e junho deste ano. Ele está em segundo lugar na pesquisa do Ibope, com 38% das intenções de voto. Quem aparece em primeiro é o senador Gladson Cameli (PP), com 47%, sobrinho do ex-governador Orleir Cameli, o último a ocupar o cargo antes da hegemonia petista. Em terceiro, está Coronel Ulysses (PSL), com apenas 6%.
A presidente da sessão acriana da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Rosana Souza do Nascimento, apoia Cameli. Licenciada do cargo, a professora universitária é candidata a deputada federal pelo PPS. No âmbito nacional, a CUT é alinhada com o PT.
Jorge Viana dificilmente será reeleito para o Senado. Está com 35% das intenções de voto. Petecão (PSD) lidera, com 52%. Márcio Bittar (MDB) tem 39%. Há duas vagas neste pleito.
53%
Intenções de voto em Bolsonaro no estado, segundo o Ibope. Marina aparece em seguida, com 11%. Haddad tem 7%
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Descontentamento
29/09/2018
A perda de espaço do PT no Acre é atribuída por políticos e especialistas à chamada “fadiga de material”. Depois de muito tempo no poder, é impossível não sofrer com a frustração dos eleitores pela perda de qualidade dos serviços públicos, ou pela dificuldade de melhorá-los.
Airton Chaves da Rocha, professor de história da Universidade Federal do Acre (Ufac), afirma que o desempenho de Bolsonaro nas pesquisas é resultado de “um descontentamento geral” com a política entre os acrianos. “De dois anos para cá, o governo do estado está praticamente paralisado”, explica.
Uma das maiores queixas da população, afirma Rocha, é com a criminalidade. “Os índices estão muito piores do que a média nacional, como resultado de uma deterioração rápida nos últimos anos”, diz. O narcotráfico aumentou no estado, com a entrada de drogas pelas fronteiras com a Bolívia e, sobretudo, com o Peru. O que piora as coisas para o candidato petista ao governo do estado, Marcus Alexandre, é que o companheiro de chapa é Emylson Farias, ex-secretário estadual de segurança.
Marcus Alexandres também é vulnerável. Ele comandou o Departamento Estadual de Estradas de Rodagem do Acre (Deracre), responsável pela manutenção da BR-364, estrada de 600km que liga a capital, Rio Branco, a Cruzeiro do Sul, no outro extremo do estado. A obra nunca foi concluída, e o asfalto tem manutenção precária, sobretudo nos meses de chuva.
Rocha afirma, porém, que a perspectiva de saída do PT do governo do estado está longe de ser tranquilizadora. “Há temor de que os que estão hoje na oposição, se vencerem, não terão projeto de transição para um novo governo, nem capacidade de construção de algo novo a médio e longo prazos”, destaca. (PSP)
"Há temor de que os que estão hoje na oposição, se vencerem, não terão projeto de transição para um novo governo, nem capacidade de construção de algo novo a médio e longo prazos”
Airton Chaves da Rocha, professor de história da Ufac