O globo, n. 31062, 23/08/2018. País, p. 4
FUSÃO POLÍTICA
Jeferson Ribeiro
Marco Grillo
23/08/2018
Eleitores ignoram alianças e escolhem duplas inusitadas
Passada a fase de negociações das alianças políticas para as eleições, quando os partidos se adequam às suas conveniências regionais, as pesquisas mostram que o eleitor pouco se importa com esses arranjos e segue lógica mais pragmática do que ideológica.
Cruzamento de dados do Ibope contratado pela TV Globo e“OEst ado d eS. Paulo”di vulgado na segunda-feira mostra o desalinhamento dos votos para presidente e governador no Rio e São Paulo. Assim, surgem quatro fenômenos improváveis de dobradinhas nas urnas deste ano: “Bolsomário“, “Garolula“, “Luladoria” e “Bolsodoria“.
No Rio, 36% dos eleitores do senador Romário (Podemos) declaram preferência por Jair Bolsonaro (PSL) para presidente, o voto “Bolsomário“, e ignorando que o Podemos lançou Alvaro Dias para o cargo. Já o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, João Doria, pautou sua carreira política para se tornar um ícone antipetista, mas 23% do seu eleitorado não captaram essa mensagem e indicam que votarão no ex-presidente Luiz Inácio Lu lada Silva( PT) para presidente, mesmo preso e duramente criticado pelot uca no:éo voto“Lu lado ria “.
Pouco importou para esse eleitor do tucano se ele já xingou Lula de “sem vergonha”, “mentiroso” e “espelho da vagabundagem”.
Outrac ombi naçãoéo Bolsodoria: o eleitorado do tucano prefere Bolsonaro (28%) a Geraldo Alckmin, que, mesmo sendo o candidato do PSDB à Presidência, tem apenas 20% dos apoiadores do ex-prefeito.
“ELEITOR VOTA EM PESSOAS”
Alckmin vinha resistindo a apoiar mais explicitamente Doria na corrida estadual, por causa de um acordo que tem com o governador Márcio França (PSB), que concorre à reeleição e foi seu vice em São Paulo. Uma pessoa próxima à campanha de Doria, porém, disse ao GLOBO que o ex-governador terá de mudar sua estratégia. Como a pesquisa Datafolha mostrou Doria na liderança com 25%, à frente de Paulo Skaf (MDB),que tem 20%, seria necessário unir o eleitorado tucano, principalmente em função da indefinição de Alckmin na campanha de São Paulo.
No Rio, o aliado oficial de Alckmin é o candidato do DEM, Eduardo Paes, mas seus eleitores se pulverizam entre as candidaturas de quatro postulantes à Presidência da República —apenas 5% deles declararam voto no tucano.
— A estrutura partidária é fraca, e as pessoas votam em pessoas independentemente de partidos e coligações. O eleitor analisa a melhor oferta para presidente, depois a melhor para governador, e assim por diante. Além disso, há muitos partidos, que não conseguem se diferenciar uns dos outros. As siglas mudam de nome, e os candidatos mudam de partido, então, o eleitor vota nas pessoas — analisa a diretoraexecutiva do Ibope, Márcia Cavallari.
Há mais explicações para esse fenômeno. No Rio, o candidato Anthony Garotinho (PRP) não apoia formalmente um candidato à Presidência, mas 46% do seu eleitorado declaram voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nesse caso, segundo a executiva do Ibope, mesmo sem estarem coligados formalmente, os dois atraem um perfil semelhante de eleitores: os menos escolarizados e de menor renda.
A filha do candidato, deputada Clarissa Garotinho (PROS), diz que não há necessidade de ajustar o discursou ou a estratégia da campanha para formar a dobradinha “Garolula“, justamente por essas semelhanças, que também explicariam os 20% do eleitorado do ex-governador que declaram voto em Bolsonaro.
ROMÁRIO E A SALADA MISTA
Se Clarissa não vê vantagem numa estratégia para reforçar o voto “Garolula“, na campanha do senador Romário a proximidade com o eleitor de Bolsonaro é bem-vinda, e a aliança do ex-jogador dá uma ideia da salada mista que é apresentada ao eleitor fluminense.
O vice de Romário, deputado Marcelo Delaroli, é do PR, que formalmente apoia Geraldo Alckmin. A Rede, da candidata Marina Silva, também está na coligação do senador, assim como o PPL, cujo postulante ao Palácio do Planalto é João Goulart Filho.
O candidato à Presidência mais apoiado pelos eleitores de Romário, no entanto, não é nenhum desses quatro: 36% declaram voto em Bolsonaro, índice superior ao de Marina (10%), Alckmin (4%), Goulart (1%) e Alvaro Dias (1%), candidato do Podemos à Presidência, o mesmo partido de Romário.
Apesar de estar no PR, Delaroli, que é ex-policial militar, já declarou apoio a Bolsonaro. Em junho, ele tentou se viabilizar como o candidato ao governo da família Bolsonaro no Rio, mas a parceria não emplacou.
A campanha de Romário não pretende colar a imagem dele à do capitão da reserva do Exército, mas entende que o senador pode se beneficiar do cenário difuso e do eleitorado do Estado do Rio estar “meio perdido”.
O coordenador da campanha de Romário, Marco San, diz que não há estratégia de colar a imagem do senador em Bolsonaro, mas a dobradinha também não é um fato a ser combatido:
—Todo apoio é bem-vindo. Estamos tentando atrair setores, como fizemos com o Miro (Teixeira, da Rede, candidato ao Senado da coligação) e com o Delaroli, que agrega votos no interior, nos meios militares e entre os evangélicos.
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No Rio, candidatos aliados de Alckmin, mas nem tanto
Waleska Borges
Bernardo Mello
23/08/2018
Apesar de elogiar o tucano apoiado por seu partido, Paes evita agendas conjuntas; Indio da Costa tenta carona com Bolsonaro
No Rio, além de Romário (Podemos) e Anthony Garotinho (PRP), outros dois candidatos ao governo do estado também estão descolados da disputa presidencial, cada um com seu motivo particular.
Apesar de seu partido apoiar o presidenciável tucano Geraldo Alckmin, Eduardo Paes (DEM) não tem feito agendas de rua com ele. Na última terça-feira, Alckmin esteve em evento no Rio e não teve a companhia de Paes. Durante agenda ontem em Campos, no Norte Fluminense, o ex-prefeito do Rio reforçou a estratégia de distanciamento da campanha a presidente:
—Estou seguindo uma linha que adotei desde o início da eleição. Eu sou fã do governador Geraldo Alckmin, um sujeito qualificadíssimo, pronto para ser presidente. Mas eu tenho uma aliança ampla. Tem gente que apoia o Meirelles, que vota no Bolsonaro, na Marina.
Alckmin ainda patina nas pesquisas e não chega a 10%. O ex-prefeito do Rio terá o apoio do MDB, que lançou Henrique Meirelles, estacionado entre 1% e 2%.
Candidato do PSD, Indio da Costa esteve na manhã de ontem no Centro de Abastecimento do Estado da Guanabara (Cadeg) e declarou que está indeciso sobre seu voto à Presidência. O partido de Indio apoia Alckmin, mas o candidato disse que seria interessante para o estado ter um presidente do Rio, referindose a Jair Bolsonaro, do PSL:
— Na hora em que eu vi a coligação em torno do Geraldo Alckmin, naquela fotografia, tudo se assemelha muito a um desenho em que eu não acredito mais.
Segundo Indio, Bolsonaro seria uma pessoa que “vê acontecer o problema todo daqui” e que “de fato pode se preocupar em ajudar o governo do Rio”. Ele chamou o ex-capitão de vítima:
—Ele já foi assaltado e mora no Rio. Então, alguém que tenha esse sentimento de fato pode se preocupar em ajudar o governador do Rio a resolver os problemas de segurança. Meu projeto nãoé iguala odele, masap reocupação coma segurança me interessa muito.
O Datafolha divulgou ontem pesquisa para o governo. Paes lidera com 18%, seguido por Romário (Podemos), com 16%; Garotinho (PRP) registra 12%; Indio e Tarcísio Motta (PSOL) estão empatados com 5%. Com dois nomes de forte apelo no campo da esquerda e outros dois à direita no espectro ideológico, a disputa pelas duas vagas que serão renovadas na bancada do Rio no Senado começou com quatro candidatos em empate técnico na liderança. Outra circunstância aumenta a competitividade da eleição: o eleitorado evangélico, fator de peso nas eleições no Rio e que, unido, poderia garantir uma das vagas, deve chegar dividido às urnas, já que são nada menos que quatro candidatos com forte penetração nesse segmento — e nenhum largou entre os primeiros.
O fato de serem dois votos por eleitor, ainda ignorado por boa parte dos fluminense, contribui para a imprevisibilidade, e há estratégias que variam entre colar o nome do candidato a um presidenciável aliado, apostar na máquina partidária e no tempo de TV ou ainda em dobradinha com puxadores de voto para deputado.
O equilíbrio predomina nas primeiras pesquisas: divulgada ontem, a do Datafolha mostra a diferença entre o quarto colocado e os primeiros em apenas um ponto percentual, reforçando o cenário apontado pelo Ibope, em que Flávio Bolsonaro (PSL), Cesar Maia (DEM), Lindbergh Farias (PT) e Chico Alencar (PSOL) também estavam em empate técnico.
— Além de tudo isso, é uma eleição majoritária decidida em turno único. As discussões entre os candidatos pouco devem aparecer para o público, com a atenção atraída pelas campanhas a presidente e governador, o que também complica qualquer previsão — avalia o cientista político Ricardo Ismael, da PUC Rio.
O deputado estadual Flávio Bolsonaro é um caso clássico de candidato que buscará votos na esteira de um presidenciável. Com o mesmo sobrenome e número na urna do pai, ele tentará se aproximar do desempenho de Jair Bolsonaro no Rio. A última pesquisa Ibope mostrou que Jair tem, na disputa presidencial, a preferência de 22% do eleitorado fluminense, número que cresce para 25% no cenário sem Lula. Com pouco tempo de TV e sem aliança formal com um candidato a governador, Flávio repetirá o jeito de fazer campanha do clã, focado nas redes sociais.
É uma estratégia oposta à do vereador e ex-prefeito do Rio Cesar Maia, com quem Bolsonaro disputa votos num eleitorado mais conservador. Junto de Aspásia Camargo (PSDB), também postulante ao Senado, Cesar está na chapa de Eduardo Paes (DEM) ao governo, a coligação com mais tempo de TV, mais siglas aliadas e maior capilaridade nos municípios fluminense.
—O mais importante será a vinculação com o candidato a governador. Tem sido assim tradicionalmente — aposta Cesar.
O petista Lindbergh Farias tem estratégia definida: tentar se beneficiar da popularidade de Lula no estado. Em 3 de abril, quatro dias antes de ser preso, o expresidente estava no Rio, e gravou vídeos de apoio a Lindbergh, que tenta a reeleição ao Senado.
— Minha campanha fez pesquisas que mostram que a maioria da população não sabe que sou o candidato do Lula. É isso que eu vou mostrar. Entre os quatro que estão na frente, pode dar qualquer combinação —diz o senador.
Quarto deputado federal mais votado no estado em 2014, Chico Alencar aposta no protagonismo que o PSOL tem conquistado no campo da esquerda no Rio nos últimos anos. O partido chegou ao segundo turno na disputa para prefeito da capital em 2016, com Marcelo Freixo, que, agora candidato a deputado federal, será cabo eleitoral de destaque na campanha de Chico.
Do total de 15 candidatos, pelo menos quatro têm forte ligação com o eleitorado evangélico. Candidato à reeleição, o senador Eduardo Lopes (PRB) é o nome da Igreja Universal do Reino de Deus. Ele pretende levar o prefeito Marcello Crivella (PRB) a seu palanque.
— Vai participar, fora do horário de trabalho. Não vejo os outros candidatos (evangélicos) como concorrentes, pois podem ter o meu segundo voto e eu posso ter o segundo voto deles.
Lopes se refere a Pastor Everaldo (PSC), liderança da Assembleia de Deus; o deputado federal Arolde de Oliveira (PSD), da mesma igreja e proprietário de uma rádio especializada em música gospel entre as líderes de audiência; e Mattos Nascimento (PRTB), cantor gospel de sucesso que também se lançou ao Senado.
—Vou fazer a defesa da vida, da família. O jogo da eleição está só começando, não há favoritos — acredita Pastor Everaldo, que marcou 8% no Datafolha.
“Eu sou fã do Alckmin, qualificadíssimo, pronto para ser presidente. Mas eu tenho uma aliança ampla. Tem gente que apoia o Meirelles, que vota no Bolsonaro, na Marina”
Eduardo Paes, candidato do DEM ao governo do Rio