Título: Um ano perdido
Autor: Franco, Carlos
Fonte: Correio Braziliense, 16/05/2012, Economia, p. 9

O dólar rompeu ontem a barreira de R$ 2 pela primeira vez em três anos, cotado a R$ 2,0015, enquanto a bolsa de valores brasileira encerrou o pregão com queda de 2,26%, a 56.237 pontos, o menor patamar desde 19 de dezembro.

Com isso, o índice reverteu os ganhos que os investidores em ações acumulavam no ano e, agora, contabilizam perda de 0,9%. "Vimos hoje uma debandada, houve venda generalizada de ações, nitidamente com estrangeiros saindo de bolsa e buscando ativos mais seguros", disse Henrique Kleine, analista-chefe na corretora Magliano.

Desde a década de 1970, quando os países trocaram o lastro de suas moedas do ouro para o dólar, a divisa e os títulos soberanos da dívida norte-americanos são considerados um porto seguro.

Os dois movimentos—a alta do dólar e a queda da bolsa—são reflexos da delicada situação europeia, especialmente a crise política e econômica da Grécia, que coloca em xeque o poder do bloco.

Pela manhã, dados do Produto Interno Bruto (PIB, que é a soma de todas riquezas) dos 17 países que integram a Zona do Euro, divulgados pela Eurostat, revelaram que a região está estagnada economicamente e só não entrou em recessão técnica —quando indicadores negativos se repetem por dois trimestres seguidos — por força do surpreendente crescimento de 0,5% da Alemanha impulsionado pelas exportações de maquinários de precisão e carros de luxo. No último trimestre de 2011, a Alemanha tinha apresentado queda no PIB de 0,3%.

O resultado, embora um pouco melhor do que a expectativa de economistas, que previam um recuo de 0,2% no PIB alemão, contribuiu para o clima de incertezas. "A Alemanha, maior economia da Europa, está guiando o bloco, mas isso não significa que nós teremos uma recuperação forte, a austeridade não irá embora e as economias do sul da Europa estão realmente em dificuldade", disse Mads Koefoed, economista sênior do Saxo Bank. Enquanto a Alemanha cresceu 0,5% no trimestre, a França permaneceu estagnada e a Itália encolheu 0,8%.

Pregões Com o cenário de estagnação nas economias de 17 dos 27 países da União Europeia, e o anúncio de novas eleições na Grécia as principais bolsas europeias fecharam em queda — Londres (-0,51%), Paris (-0,61%),Milão (-2,56%),Madri (-1,60%) e Frankfurt (-0,79%) — e acabaram por influir nos pregões da Ásia, Estados Unidos e Brasil. Em Nova York, o índice Dow Jones registrou retração de 0,5%, o pior resultado desde janeiro.

Os reflexos nos negócios realizados na bolsa brasileira foram imediatos. Já a alta do dólar não trouxe preocupação para a equipe econômica do governo, que considera o patamar de R$ 2 adequado para as exportações brasileiras que vinham perdendo competitividade. O Banco Central (BC) tem evitado intervir e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem dado um recado claro aos interlocutores: "O câmbio é flutuante e esse patamar é bom para as exportações".

A forte turbulência nas bolsas e a aversão a riscos prometem levar investidores a testar o patamar de R$ 2 para a moeda norteamericana, que já acumula uma valorização de 4,93% no mês e de 7,01% no ano. Analistas de mercado não sabem ainda em que patamar o BC irá intervir comprando a moeda norte-americana para evitar as oscilações. Já a estagnação na Europa influi diretamente nas expectativas de recuperação do PIB global como um todo e não se sabe até quando os alemães terão fôlego para sustentar indicadores positivos do bloco. Situação que começa a estimular revisões nas expectativas de crescimento.