Título: Lavagem de dinheiro na Coreia
Autor: Valadares, João
Fonte: Correio Braziliense, 17/05/2012, Política, p. 3

A análise dos 41 volumes de documentos relativos à declaração de Imposto de Renda dos últimos 10 anos do bicheiro Carlinhos Cachoeira, encaminhados pela Receita Federal à CPI, indica que o contraventor tinha uma espécie de "lavanderia" internacional do dinheiro sujo obtido no Brasil. Nas declarações de IR dos exercícios referentes aos anos de 2008, 2009 e 2010, o bicheiro informa que recebeu da empresa BET Capital R$ 11,4 milhões a título de empréstimos. A suspeita é de que os recursos da organização criminosa eram encaminhados para a empresa BET Company, estranhamente com sede na comunista Coreia do Norte, na Ásia, e acionária majoritária da BET Capital.

Carlinhos Cachoeira teria 49% das ações e a BET Company outros 51%. O esquema que começa a ser desvendado aponta que o dinheiro sairia do Brasil e voltava para a BET Capital, que emprestava milhões ao contraventor. Cachoeira declarou ter recebido da empresa R$ 2,8 milhões em 2008; R$ 4,3 milhões em 2009; e novamente R$ 4,3 milhões em 2010. Existem também empréstimos com cifras milionárias no nome da ex-mulher e de um ex-cunhado.

Para integrantes da comissão, há, além da sonegação fiscal, um movimento gigante de evasão de divisas. Hoje, durante reunião administrativa da CPI, alguns parlamentares vão sugerir que a Interpol seja acionada para mapear o caminho internacional do dinheiro da organização criminosa. Informações extraoficiais apontam que existe uma espécie de conta-mãe num paraíso fiscal.

Cartão de crédito O que também chamou a atenção dos parlamentares foi a declaração de rendimentos, incompatíveis com os gastos no cartão de crédito do bicheiro. Em 2008, ele declarou ter recebido R$ 20,4 mil em rendimentos tributáveis e, em 2007, R$ 17,8 mil. No entanto, os gastos no cartão ultrapassam R$ 500 mil. Em 2003 e 2004, o contraventor informou à Receita Federal que não teve rendimentos. Ele costumava guardar dinheiro em casa. Declarou ao Fisco ter, num cofre, a quantia de aproximadamente R$ 1,5 milhão.

Nos depoimentos prestados na CPI pelos delegados da Polícia Federal Matheus Mella Rodrigues e Raul Alexandre Marques de Souza, responsáveis pelas Operações Monte Carlo e Vegas, ficou evidente que existem 13 empresas ligadas ao bicheiro. Uma delas tem sede num paraíso fiscal do Caribe. As empresas JR, Alberto Pantoja e Brava receberam, aproximadamente, R$ 40 milhões em depósitos efetuados pela empreiteira Delta, no foco das denúncias desde o início do escândalo.

Ontem à tarde, os senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e Randolfe Rodrigues (PSol-AP) informaram que vão requerer a quebra de sigilo da empresa BET Capital, hoje pela manhã, durante reunião administrativa da CPI. Os governadores citados nos inquéritos da Polícia Federal permanecem blindados. Não será votado nenhum requerimento de convocação. Na sessão administrativa de hoje, a CPI vai apreciar e votar todos os requerimentos relativos a quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), da empresa Delta e de outros envolvidos no escândalo.

Contra manobras de Demóstenes O senador Humberto Costa (PT-PE), relator do processo aberto no Conselho de Ética para investigar o senador goiano Demóstenes Torres (sem partido), reagiu, na manhã de ontem, após reunião administrativa, a possíveis manobras da defesa para evitar o depoimento. O parlamentar garantiu que, mesmo que o senador investigado não compareça ou fique em silêncio, vai apresentar de qualquer maneira, até o fim de junho, o parecer com o seu posicionamento sobre a cassação do mandato. "No Plenário do Conselho de Ética, quero votar até o fim de junho e, antes de 17 de julho, quero que seja votado pelo plenário do Senado." Carlinhos Cachoeira será ouvido como testemunha de Demóstenes na próxima quarta. "Se ele não comparecer, estará prejudicando a pessoa que o apresentou como testemunha de defesa, no caso, o senador Demóstenes Torres."