O globo, n. 31055, 16/08/2018. País, p. 12
Documentos reforçam suspeita de caixa 2 a Serra
Cleide Carvalho
16/08/2018
Autoridades suíças enviam à PGR comprovantes de transferências de 400 mil euros de empresa usada pela Odebrecht no exterior para conta de offshore panamenha, que tem a filha do senador tucano como procuradora; dados são anexados a inquérito no STF
A Procuradoria-Geral da República (PGR) anexou documentos enviados ao Brasil por autoridades suíças ao inquérito no Supremo Tribunal Federal que investiga supostos pagamentos, via caixa dois, feitos pela Odebrecht para o senador José Serra (PSDB). Segundo as investigações, o dinheiro seria usado em campanhas do tucano. Os documentos mostram que uma empresa já mencionada pela Odebrecht como repassadora de propina fez transferências de 400 mil euros a uma conta na Suíça que tinha como procuradora Verônica Serra, filha do senador tucano.
Em 2017, Luís Eduardo Soares, um dos executivos da Odebrecht, disse, em delação, que a offshore Circle Technical Company era usada pela Odebrecht para repassar propinas referentes às obras da Linha 2 do Metrô, do Rodoanel e da interligação da Rodovia Carvalho Pinto. Nos documentos enviados pela Suíça à PGR, é possível identificar dois depósitos da Circle na conta Firenze 3026, no Arner Bank, na Suíça. Essa conta pertence à offshore Dormunt International, do Panamá, e quando foi aberta tinha Verônica Serra como procuradora para geri-la.
Em nota, José Serra afirmou que rejeita a possibilidade de haver qualquer ilegalidade envolvendo o nome de sua filha e reafirmou que jamais recebeu nenhum tipo de vantagem indevida ao longo de sua vida pública.
O senador disse esperar que o caso seja esclarecido “da melhor forma possível para evitar que prosperem acusações falsas que atinjam a honra de seus familiares”.
A primeira transferência da Circle para a conta Firenze 3026 é de 20 de dezembro de 2006, no valor de 250 mil euros. O segundo depósito foi feito em 19 de fevereiro de 2007, no valor de 150 mil euros. A movimentação dessa conta contou com a consultoria de Illumina Capital, empresa suíça que atua em gestão de patrimônio e consultoria para investidores privados. Na ocasião em que a Illumina foi contratada, a filha de Serra enviou um email para o Arner Bank confirmando a contratação.
Ainda em seu depoimento, Soares disse que foram feitos 32 depósitos em benefício de Serra. Nas planilhas da Odebrecht, esses depósitos aparecem com o codinome “Vizinho”, atribuído a Serra, pelo fato de o senador morar na mesma rua de Pedro Novis, que presidiu a empreiteira.
As autoridades brasileiras já haviam pedido a quebra do sigilo bancário da Circle Technical e de mais duas empresas — as offshores HTW Energy e CDG Energy Trading. Segundo Novis, essas empresas também foram usadas para movimentar recursos indevidos.
Para a campanha de 2006, quando José Serra concorreu ao governo de São Paulo, Novis relatou ter repassado R$ 4,5 milhões entre julho de 2006 e outubro de 2007, 1,6 milhão de euros em valores da época. Em 2008, segundo Novis, Serra fez um novo pedido, de R$ 3 milhões, para ser usado na campanha do PSDB à prefeitura de São Paulo.
Segundo o ex-presidente da Odebrecht, para a campanha de Serra à Presidência da República, em 2010, o então presidente do PSDB, Sérgio Guerra, já falecido, pediu R$ 30 milhões. Novis afirmou ter repassado R$ 23 milhões aos tucanos.