O Estado de São Paulo, n. 45549, 03/07/2018. Política, p. A6

 

Toffoli livra Dirceu de tornozeleira

Rafael Moraes Moura

03/07/2018

 

 

Mesmo sem pedido da defesa do petista, ministro do STF cassa decisão do juiz Sérgio Moro que determinava uso de equipamento eletrônic​o

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou ontem de “ofício” – sem ter sido provocado pela defesa – a decisão do juiz federal Sérgio Moro que determinou o uso de tornozeleira eletrônica pelo ex-ministro petista José Dirceu. Moro também havia proibido Dirceu de se comunicar com acusados no caso em que foi condenado na Lava Jato e de deixar o País. A decisão do juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba ocorreu depois de a Segunda Turma do Supremo conceder na terça-feira passada, por 3 votos a 1, habeas corpus para o petista.

Segundo Toffoli, ao impor o uso de tornozeleira a Dirceu, o juiz agiu em “claro descumprimento” de decisão da Segunda Turma. Conforme o regimento do STF, a “demonstração incontroversa do descumprimento de decisão da Corte autoriza o relator do caso a adotar as medidas necessárias à restauração da determinação do tribunal”.

Procurada, a assessoria de Moro informou que não havia sido notificada.

Além de cassar a decisão do juiz, Dias Toffoli arquivou dois outros casos – um inquérito contra o ex-ministro de Cidades e deputado Bruno Araújo (PSDBPE), instaurado com base na delação da Odebrecht, e outro que investigava o deputado Daniel Vilela (MDB-GO), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, e seu pai, o ex-senador Luís Alberto Maguito Vilela, suspeitos de terem recebido doações eleitorais via caixa 2.

Futuro presidente do STF a partir de setembro, Toffoli foi nomeado para o Supremo em outubro de 2009 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também condenado e preso na Lava Jato. Antes foi advogado-geral da União no governo do petista e subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil no primeiro mandato de Lula.

 

Dirceu. O petista estava preso desde 18 de maio, quando o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região determinou o cumprimento da pena de 30 anos por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa na Lava Jato. Na terça-feira, a Segunda Turma analisou um pedido da defesa de Dirceu que alegou que o STF autorizou a prisão após condenação em segundo grau, mas não a tornou obrigatória. Toffoli rejeitou o argumento, porém viu problema na dosimetria da pena e votou por conceder habeas corpus mesmo sem pedido da defesa.

O ministro Edson Fachin pediu vista, mas Toffoli propôs que o colegiado votasse a liminar do habeas corpus, contornando o pedido de mais tempo do colega. Foi acompanhado por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.

Na sexta, Moro determinou o uso da tornozeleira alegando que “a reativação das medidas cautelares se impõe diante da suspensão da execução provisória”. No entanto, para Toffoli, Moro tomou “decisão com extravasamento de suas competências”, “à míngua de qualquer autorização” do Supremo, que assegurou “a liberdade plena” do ex-ministro até a conclusão de julgamento da ação.

 

Arquivamentos. Em outras duas decisões, Toffoli contrariou a Procuradoria-Geral da República e arquivou inquéritos contra o tucano Bruno Araújo e o emedebista Daniel Vilela.

No caso do ex-ministro, o inquérito investigava suspeita de que o tucano teria sido beneficiado por doações eleitorais não contabilizadas no valor de R$ 600 mil, em 2010 e 2012, para atuar por interesses da Odebrecht no Congresso. O dinheiro, segundo delação, saiu do Setor de Operações Estruturadas, como era conhecido o “setor de propinas” da empreiteira, conforme investigações.

Toffoli afirmou que, depois de 15 meses de investigação, não foram colhidas provas suficientes para corroborar as afirmações dos delatores. Em nota, a defesa de Araújo disse que todos os depoimentos confirmaram que o deputado “não esteve envolvido em qualquer ato ilícito, além de nunca ter oferecido qualquer contrapartida à empresa”.

No caso contra Vilela e seu pai, eles eram investigados por suspeita de terem recebido doações eleitorais via caixa 2. A apuração teve início com base em delações da Odebrecht. Em nota, os advogados responsáveis pela defesa afirmaram que “o ministro entendeu que não pode haver inquérito infinito”.

'Descumprimento'

“Casso a decisão do Juízo da 13.ª Vara Federal de Curitiba que, agindo de ofício, impôs (a José Dirceu) medidas cautelares diversas da prisão, em claro descumprimento de decisão desta Suprema Corte.”

Dias Toffoli​, MINISTRO DO SUPREMO