Correio braziliense, n. 20209, 19/09/2018. Política, p. 2
A polarização que antecipa as alianças
Leonardo Cavalcanti, Paulo Silva Pinto e Rodolfo Costa
19/09/2018
Possibilidade de Jair Bolsonaro vencer já em 7 de outubro aparece como uma das razões para que a união de siglas comecem a surgir antes do primeiro turno. Tucanos e petistas podem se aproximar, assim como o PSL e o DEM
Os resultados das recentes pesquisas eleitorais elevaram a tensão nos bastidores a ponto de alianças para o segundo turno começarem a ser tratadas, mesmo que de maneira tímida. Com os extremos representados por Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), criam-se cenários de retroalimentação nas duas candidaturas. Como o deputado federal aparece na frente, o crescimento dele leva correligionários a sonharem com a vitória já em 7 de outubro, a partir do enfraquecimento das candidaturas de um terceiro pelotão formado por Henrique Meirelles (MDB), João Amoêdo (Rede) e Alvaro Dias (Podemos).
Ontem, o Ibope divulgou números que corroboram a situação, uma vez que Bolsonaro segue em primeiro, com 29%, mas Haddad subiu 11 pontos percentuais e já aparece em segundo, com 19%. O voto antipetista poderia, então, migrar em peso para o deputado federal. O receio por uma vitória no primeiro turno do candidato do PSL anteciparia, dessa forma, as alianças — inclusive uma inimaginável até quatro anos atrás. Os acordos políticos, até o momento, são negociados por uma frente formada entre petistas e tucanos e, por outra, entre demistas e apoiadores do capitão reformado.
Da parte dos petistas, conforme o Correio apurou, o maior entusiasta da aliança entre PT e PSDB é ex-governador da Bahia Jacques Wagner, candidato ao Senado. Ele é próximo de tucanos baianos e até mesmo de Alckmin, de quem foi colega na Câmara — ambos cumpriram mandatos de deputado federal nos anos 1990. Na quinta-feira passada, Wagner esteve em Brasília para a posse de Antonio Dias Toffoli na Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF). Aproveitou para conversar com pessoas de vários partidos, mas especialmente com integrantes do PSDB.
Wagner já falou publicamente sobre o desejo de acordo entre os dois partidos. Uma possível costura para o segundo turno apareceu pela primeira vez por meio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O tucano disse que não criaria objeção a um eventual apoio de Haddad a Alckmin. “Isso significa que também não haveria objeção ao contrário”, afirmou ele em entrevista ao jornal O Globo, em 20 de agosto.
Segundo Antonio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Análise Parlamentar (Diap), o próprio Haddad — próximo de FHC, entre outros integrantes do PSDB de São Paulo — atua na construção de uma aliança. Ainda que, neste momento, o acordo pareça implausível, Queiroz aposta em uma mudança de comportamento do candidato petista, que o tornará mais palatável para os eleitores de centro direita que têm aversão a Bolsonaro. “Neste momento, o discurso dele é principalmente de esquerda, para levantar o ânimo dos militantes petistas. Mas, no segundo turno, ele passará a ter um discurso mais de centro, ou mesmo de centro direita, se aproximando até mesmo do mercado financeiro”, afirmou.
DEM e o capitão
Dos apoiadores de Bolsonaro, os movimentos se aproximam do DEM e do Novo (Leia mais na matéria abaixo). No caso dos demistas, que assumiram a campanha de Geraldo Alckmin logo depois da desistência do deputado Rodrigo Maia da corrida ao Planalto, a equação é um pouco mais complexa. O interesse do partido é buscar a reeleição na presidência da Câmara, e tal ação poderia ser anulada com uma vitória petista. Por mais difícil que se possa prever a negociação com o Congresso, os primeiros meses de um presidente da República são historicamente mais tranquilos, o que o tornaria fortalecido na primeira composição para a Mesa da Casa.
Assim, a saída para Maia e o DEM estaria no apoio a Bolsonaro — e políticos como Alberto Fraga, candidato ao GDF, desde o início apontam para o posicionamento a favor do militar. Para o presidente nacional do DEM, ACM Neto, entretanto, o momento não é de debandada. “Tudo pode acontecer, mas, em princípio, não há cogitação de mudança de lado antes de ter o quadro do segundo turno formado”, disse um interlocutor.
Sociólogo e especialista em risco político, Thiago de Aragão diz que as alianças são iniciadas pelas personalidades dos partidos, mas não podem ser consideradas um movimento total das legendas. “Há uma ação de grandes figuras, mas que pode ser anulada pelo excesso de municipalização da política brasileira, na qual figuras no estado acabam não recebendo orientação dos partidos.”
Um dos casos mais emblemáticos é o deputado Ciro Nogueira (PP-PI), que, aliado oficial de Alckmin, fez campanha para Lula. “O que provocava as alianças no passado era a afinidade política e ideológica. Hoje, é a repulsa pelo outro ou por cálculos políticos para não perder votos”, diz Aragão. À parte dos acordos até aqui, Ciro Gomes (PDT) desconversou sobre uma declaração de Haddad prevendo uma aliança no segundo turno entre eles, independentemente de quem passar para a próxima fase. “O projeto que eu advogo para o Brasil não é o mesmo do PT. Quero ajudar a população a pôr fim nessa radicalização política que, infelizmente, está levando nossa economia para o brejo.”
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Bolsonaro mira em Amoêdo
Gabriela Vinhal
19/09/2018
Internado desde o último 6 de setembro, após levar uma facada durante um comício em Juiz de Fora (MG), Jair Bolsonaro (PSL) tem se mantido afastado das estratégias de campanha para a candidatura à Presidência da República. Na reta final da disputa, um dos filhos do postulante, Carlos Bolsonaro, é quem participa de reuniões com autoridades e especialistas. Entre as novas medidas a serem adotadas ainda para o primeiro turno, como em uma fase pós-ataque, está a consolidação de uma base de centro direita dentro do PSL.
Com a certeza de que chegará ao segundo turno, o partido do deputado federal mantém conversas avançadas com o também candidato João Amoêdo, do Novo. Como ele não consegue avançar entre o eleitorado, Bolsonaro acredita que poderá fechar um acordo com o Novo para a segunda fase do pleito. Se a aliança for firmada, o empresário ganhará a pasta do Planejamento ou da Transparência em um eventual governo. Segundo uma pessoa de dentro da campanha de Bolsonaro, há a especulação de que o cargo escolhido deverá fazer jus ao discurso do Novo contra a corrupção e os privilégios de servidores.
A especulação dentro do PSL é de que Fernando Haddad (PT) disputará a segunda fase da eleição com o capitão reformado do Exército. Assim, é importante se aproximar de siglas como Novo e Democratas. A conversa com essas legendas de centro ajudaria a tornar a imagem de Bolsonaro mais “branda” com os agentes econômicos e afastaria a alusão ao presidente dos EUA, Donald Trump — a mídia estrangeira o chama de “Trump brasileiro”.
Ressalva
Amoêdo já ressaltou, em uma entrevista ao Correio, que a semelhança das pautas dele e de outros candidatos de centro direita “não ocorre na prática”. Sobre Bolsonaro, especificamente, disse: “Somos diferentes, os planos são outros”. Em nota, a equipe de Amoêdo negou contato do PSL e afirmou que o candidato jamais esteve ou estará com Bolsonaro”. “Amoêdo não ocupará ministério em nenhum governo. Tampouco, chamará Bolsonaro para compor o ministério em eventual gestão”.
Com a previsão de voltar para casa no fim da semana, Bolsonaro se manterá ativo nas redes sociais. Conforme o Correio apurou, um estúdio particular, que estava montado no Rio de Janeiro está em transferência para São Paulo, a fim de ficar perto do candidato, que deverá se manter em repouso. Os filhos de Bolsonaro que buscam uma vaga no Congresso Nacional continuarão fazendo campanha nas ruas, enquanto o vice da chapa, general Mourão, cumprirá agenda com empresários e lideranças locais.
Militar se explica
Em palestra na Associação Comercial de São Paulo, O General Hamilton Mourão tentou se explicar sobre as declarações dadas na segunda-feira, na qual ligou famílias pobres “onde não há pai e avô, mas sim mãe e avó” a uma “fábrica de desajustados”, que fornecem mão de obra ao narcotráfico. “Estou apenas fazendo a constatação de coisas que ocorrem em comunidades carentes, com famílias lideradas por mães e avós, pois o homem ou morreu ou está preso, e a maioria dessas mulheres são trabalhadoras, cozinheiras, faxineiras e não tem com quem deixar seus filhos, porque não têm creche e escola de tempo integral; então, essa criança vira presa fácil do narcotráfico.”