O globo, n. 31051, 12/08/2018. País, p. 9
O vice que parece folclórico, mas é articulador político
Dimitrius Dantas
12/08/2018
Responsável por unir PV e Rede, Eduardo Jorge quer, se eleito, viver viajando pelo Brasil e defender o vegetarianismo
No dia 18 de abril, enquanto o tucano Geraldo Alckmin já tratava como quase certo um apoio do PV à sua candidatura presidencial, o ex-deputado Eduardo Jorge se reuniu com sua amiga Marina Silva, candidata à Presidência pela Rede, em São Paulo. Fizeram uma análise do quadro nacional, falaram sobre desemprego e erros dos governos Dilma Rousseff e Michel Temer. Eduardo e Marina sempre foram próximos; eram da mesma corrente quando estavam no PT e se separaram apenas quando a ex-senadora deixou o PV, em 2012.
A saída foi ruidosa; dividiu o PV emtrês núcleos. Marina e o presidente do partido, José Luiz Penna, ficaram seis anos sem se falar. Por obra de Eduardo Jorge, no entanto, no dia 26 de abril, os dois conversaram por telefone. Dez dias depois, estavam juntos na convenção que confirmou a candidatura de Marina, comapoiodoPV, cenário mais do que distante duas semanas antes. Sentado entre eles estava Eduardo Jorge, que nos últimos meses falara pessoalmente com dirigentes nacionais e que conseguiu construir uma maioria pró-Rede no partido nos dias após a convenção.
— Ele não agiu como um político tradicional fazendo costura, foi uma defesa mais ideológica — explica Eduardo Brandão, presidente do diretório do PV no Distrito Federal e um dos entusiastas do apoio a Marina. Com pecha de folclórico, Eduardo Jorge expôs sua faceta de negociador político, responsável por firmar uma aliança entre dois partidos que não se suportavam, o PV e a Rede. Uma semana após a confirmação da aliança, integrantes dos do islado sindicamo ex-deputado como o principal “catalisador” do acordo, fruto de um trabalho de formiguinha iniciado há mais de um ano, quando começou a defender nas instâncias internas do partido uma reaproximação coma Rede.
DIFERENÇAS DE OPINIÃO
A aliança propriamente dita foi feita às pressas. Eduardo Jorge levou um representante da Rede, o porta-voz Pedro Ivo, à convenção do PV em Brasília com uma oferta surpresa, a vaga de vice na chapa de Marina. No encontro, Eduardo Jorge disse que seu apoio pessoal à Rede era incondicional. Dias depois, os dois partidos resolveram suas diferenças em uma reunião em São Paulo.
O vice agora é considerado um ativo para a imagem de Marina, um toque de bom humor à chapa. A campanha vem tentando deixar a imagem da candidata mais leve. Em agendas, ela espera Eduardo Jorge chegar para ficar ao seu lado durante entrevistas coletivas. No evento GovTech Brasil, na terçafeira, a espera durou um minuto até que ela começasse a responder às perguntas. Na entrevista, Marina respondeu sobre as diferenças de opinião entre ambos em temas como aborto e drogas. O vice ainda defende, de forma enfática, que a estratégia de repressão às drogas não funcionou.
— É algo que tem que ser discutido com muita calma. Eu entendo muito bema preocupação das famílias pobres, de classe média ericas com seus filhos e filhas em contato com essas drogas psicoativas. Não é brincadeira isso. Isso cria escravidão e cria doença — diz Eduardo Jorge.
O tema o prejudicou em 2014, quando foi candidato do PV à Presidência. Quem participou da campanha lamenta que, de seu discurso, tenha viralizado apenas a parte do programa de governo que defende a descriminalização do aborto e das drogas. Para esse grupo, o estilo bicho- grilo ofuscou sua atuação como deputadona questão do Sistema Único de Saúde.
Dias depois do evento com Marina, Eduardo conversou com O GLOBO no Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, região central de São Paulo. Marcou no local porque iria buscar com seu advogado documentos para a candidatura. Após ser avisado de que a reportagem já estava no local, respondeu por WhatsApp:
— Saindo do Metrô. Antes de entrar numa livraria, pediu para falar com uma amiga do Piauí, vendedora de artesanato.
—Estou de olho nesse presépio — disse, apontando para as obras da artesã. — O Piauí tem uma arte muito bonita. Eu preciso ver coma Marina como ela vai fazer para visitar 27 estados em 45 dias. Na minha campanha, eu fui a 23— disse.
Eduardo Jorge afirma que, se eleito, quer ser um vice presidente itinerante. Não vai morar em Brasília, no Palácio do Jaburu; diz que vai viajar pela Amazônia e por outras regiões para informar Marina sobre o país. Como no discurso que fez na convenção que uniu seu p ar tidoà Rede, Eduardo Jorge defende o incentivo à alimentação vegetariana, pelo “abolicionismo animal”. Ele explica a ideia: a defesa é uma questão de saúde pública — diz que o vegetarianismo é mais saudável — e ambiental — acredita que reduz o desmatamento causado pela expansão da pecuária.
Ex- petista, ele trabalhou nas gestões do PSDB em São Paulo. Ri por ser considerado um traidor pela esquerda e um esquerdista pela direita. Era cotado para ser vice de José Serra na campanha à Presidência em 2010, mas foi derrubado por denúncias de corrupção na licença para a construção de um shopping. Ele atribui o afastamento à “selvageria” da política. Contou com orgulho sobre um livro de pássaros.
“De capa dura”, tem ilustrações dos animais, que ele próprio gosta de observar nos parques da cidade ou em viagens. Em uma dessas andanças, encontrou na beira da estrada filhotes de javaporco, um animal híbrido de javali e porco que vem se expandindo no sul do Brasil. A história, diz, teve final triste. [
Ao falar com o dono da propriedade onde estavam os pequenos javaporcos, perguntou a ele o que iria fazer com os animais, que quando crescem costumam causar estragos nas fazendas da região. —Ele ia comer acarne dos javaporcos — lamentou o vegetariano Eduardo Jorge, mas sem segurar o riso.